Sabe quanto dinheiro você perdeu investindo na poupança?

Grande parte do mundo vive um contexto de juros reais negativos, momento cruel que de forma gradual e sutil dizima a poupança do cidadão

Lorenzo Kill
Revista Brado
4 min readNov 27, 2021

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Pior que estava, ficou. O porquinho está ainda mais doente e faminto. Foto: Konstantin Evdokimov/Unsplash

Para saber se você está ganhando ou perdendo poder de compra ao investir na renda fixa é fácil: só precisa entender a definição de “juros reais”. Ela consiste na taxa de juros que o banco remunera pelo dinheiro investido, descontada a inflação do período. No Brasil, a taxa selic é o valor que baseia a remuneração de diversos títulos de renda fixa e o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) é o indicador oficial de inflação. A taxa de juros real é quem ditará o montante do seu lucro ou prejuízo.

A taxa selic é apenas um guia para o rendimento dos investimentos em renda fixa, ou seja, dependendo do risco ou do método de investimento a rentabilidade poderá variar. Essa taxa atualmente remunera o investidor no valor de 7,75% ao ano, enquanto a inflação dos últimos 12 meses está situada em 10,67%. Isso significa que a maioria dos títulos de renda fixa, o que inclui o Tesouro Selic e a poupança, estão em patamares extremamente negativos, levando prejuízo aos investidores.

Por exemplo, o Tesouro Selic rende 100% da Selic, entretanto, nele incide o imposto de renda retido direto da fonte. Já a poupança, está rendendo 70% da Selic. A vantagem competitiva dela é ser isenta de imposto de renda.

A maioria dos investimentos em renda fixa segue um padrão de tributação. Estão sujeitos a uma tabela regressiva de imposto de renda, com alíquotas que diminuem baseadas no prazo do investimento.

A alíquota mais alta é de 22,5%, para investimentos mantidos por até seis meses. Para os que ficam de seis meses a um ano, a alíquota cai para 20% e, se a aplicação for de um a dois anos, para 17,5%. A menor alíquota, de 15%, vale para valores mantidos por dois anos ou mais.

Com esses dados, é possível entender que apesar do imposto de renda, o tesouro selic é mais vantajoso do que a poupança em qualquer um dos cenários tributários.

Abaixo está a simulação de uma aplicação de R$ 100,00 na poupança feita logo no início da pandemia. Nominalmente, os R$ 100,00 se tornaram R$ 103,28 durante o período, entretanto, ao descontarmos a inflação de aproximadamente 12,6%, se chega à conclusão de que os R$ 103,28 equivalem apenas a R$ 91,71 da época. Isso significa uma perda do poder de compra superior a 8%.

Fonte: Banco Central do Brasil, calculadora do cidadão.

O período pandêmico é um espaço amostral atípico quanto aos indicadores econômicos, que podem apresentar distorções extremamente exageradas e que fogem da habitualidade. Por isso, peguemos um período um pouco maior para analisar.

Em outro exemplo, considere a rentabilidade da poupança versus a inflação do começo de 2013 até outubro de 2021 — cenário em que a poupança gerou de remuneração ao investidor o montante de 60,12% contra a perda de 67,07% do poder de compra. Apesar de tanto tempo com o dinheiro aplicado, a poupança conseguiu sustentar um prejuízo.

Fonte: Banco Central do Brasil, calculadora do cidadão.

Ao analisarmos o cenário global, percebe-se que o Brasil não vive um cenário excepcional quanto à política de juros reais negativos. Esse fenômeno se passa na maioria das principais economias do mundo e representa o momento em que o governo quer estimular o consumo e o investimento. Isso porque, com as taxas de juros reduzidas, facilita a tomada de crédito, gerando o desenvolvimento de meios de produção, o que amplifica a demanda por bens e serviços. Além disso, o temor do investidor ao ver o seu poder de compra reduzido pela inflação incentiva o consumo imediato. Todos os fatores acima são catalisadores de uma forte movimentação econômica de curto prazo.

Esse estímulo econômico causado pelos juros baixos somado à injeção de dinheiro na economia são um dos principais causadores do aumento contínuo e generalizado dos preços globais.

O economista Richard Cantillon afirmava que o aumento da oferta de moeda produz uma inflação desigual, que tende a beneficiar os que se encontram mais próximos dessa injeção monetária. A teoria do “Efeito Cantillon” questiona a desigualdade social criada no momento em que um novo dinheiro sem lastro é criado em benefício de instituições melhores posicionadas na estrutura de emissão monetária.

A explicação para esse fenômeno deriva do fato de que os primeiros a receber esse dinheiro poderão utilizá-lo em um mercado que ainda não foi abalado pela nova injeção, pois quando a oferta de moeda aumenta, os preços não a acompanham imediatamente. Em vez disso, aumentam lentamente conforme os mercados reagem ao crescimento da demanda por bens e serviços, em decorrência desse novo “poder de compra” em circulação. Esse processo tende a gerar um equilíbrio entre a recém-criada oferta monetária e os recursos disponíveis para compra, com uma subsequente elevação nos preços.

Assim, os últimos a receberem essa moeda, ou aqueles poupadores que possuem reserva de moeda estatal, poderão observar o seu poder de compra se deteriorando. Isso se torna uma espécie de imposto, pois o governo retira parte do poder de compra de todos na proporção em que coloca mais dinheiro em circulação.

Percebe que ao “investir” na poupança, você está pagando para que os bancos públicos e privados utilizem o seu dinheiro?

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Lorenzo Kill
Revista Brado

Estudante de direito da Universidade Federal do Espírito Santo e de Ciências Econômicas na Universidade Vila Velha - https://www.youtube.com/@LorenzoKill