Você sabe o que é fibromialgia?

Mesmo atingindo parte significativa da população, essa doença ainda não possui a atenção que merece

Isabela Siyao Chen
Revista Brado
5 min readMay 30, 2023

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Foto: Klara Kulikova/Unsplash

A pesar de ser a segunda doença reumatológica mais frequente do mundo, a fibromialgia não recebe os holofotes que merece nem mesmo na área da saúde. O manejo dos sintomas dos pacientes é frequentemente dificultado por um diagnóstico que ainda é raramente feito de forma assertiva e muitas vezes ocorre de forma tardia.

A fibromialgia é uma síndrome dolorosa crônica, de característica não inflamatória, de causa desconhecida, que pode se manifestar no sistema osteomuscular, com sintomas também em outros sistemas. No entanto, há discordâncias em relação a essa definição, uma vez que há poucos dados anatômicos nela, e como os sintomas se relacionam com outros transtornos, como a depressão e a síndrome da fadiga crônica, ela é muitas vezes considerada uma síndrome de somatização, na qual há manifestações físicas vindas de diagnósticos do nível psicológico.

De acordo com o Colégio Americano de Reumatologia (2004) e a Sociedade Brasileira de Reumatologia (2019), a condição é caracterizada por dor muscular crônica generalizada ou difusa e deve possuir mais de três meses de duração. Ademais há manifestações de sintomas como fadiga, ansiedade, depressão, distúrbio do sono não reparador, alteração na concentração e de memória.

Quadro clínico da fibromialgia. Infográfico: G1

A dor é de difícil localização, sem especificidade sobre a origem dela (muscular, óssea ou articular) e seu tipo (queimação, pontada, peso, contusão, etc.), sendo comum observar piora do quadro devido ao frio, umidade, mudança climática, tensão emocional ou esforço físico. Contudo, o achado clínico mais importante é a identificação da sensibilidade dolorosa em pontos específicos, chamados de tender points, que não são de conhecimento dos pacientes, em sua maioria. De acordo com os critérios de pesquisa, há 18 desses pontos no corpo, e para a classificação da fibromialgia são necessárias pelo menos 11 respostas dolorosas neles.

Contudo, alguns autores consideram que diversas pessoas com quadros claros de fibromialgia não apresentam dor no corpo nos 11 pontos sensíveis, além do fato dessa dor e sensibilidade ocorrerem com frequência em parcela significativa da população, sendo quase impossível delinear o quadro de um paciente que apresenta apenas o sintoma de outro que apresenta a doença. Dessa maneira, o critério de preferência para diagnóstico da doença é uma pesquisa baseada no relato do paciente, feita em uma folha com um mapa do corpo com 19 áreas e indagação da presença e severidade de sintomas como fadiga, distúrbios do sono, dificuldade de memória, flutuação de peso inexplicável, intolerância ao frio ou calor e alterações de humor.

A queixa de dor é a mais importante, sendo em sua maioria osteomuscular — ou seja, que atinge ossos e músculos -, com amplificação da dor em todo o corpo, de forma que as dores de cabeça crônicas e de garganta, por exemplo, são comuns em indivíduos com a doença, além da maior propensão de pacientes com dor regional crônica terem fibromialgia.

A sensibilidade à dor pode ser medida pelo teste do limiar da dor, que apesar de não ser disponível na prática diária do médico, o profissional pode avaliar através da presença ou não de sensibilidade exacerbada no procedimento de medir pressão e quando se aperta braços e mãos. No mais, os testes laboratoriais não apresentam utilidade para o diagnóstico, somente para exclusão de outras hipóteses, enquanto os testes sorológicos devem ser evitados na ausência de anormalidades colhidas ao exame físico.

Caso necessário, os exames devem se restringir ao hemograma e exames de rotina, dosagem de hormônios da tireoide, velocidade de hemossedimentação e proteína C-reativa, ao pensar em diagnósticos diferenciais cujos sintomas podem confundir o diagnóstico, como no caso de hipotireoidismo, polimialgia reumática, apneia do sono, malformação de Chiari, doença celíaca e hepatite C.

O tratamento medicamentoso da fibromialgia se baseia nos sintomas, enquanto o tratamento não farmacológico tem foco a piora do paciente. Os principais objetivos a serem alcançados pelo tratamento da fibromialgia são a redução da dor, manutenção da amplitude dos movimento e da flexibilidade, melhoria da qualidade de vida e educação do paciente, de maneira a reduzir os fatores que causam ou pioram o prolema. Dessa maneira, o tratamento não medicamentoso é realizado através da educação, terapia cognitivo-comportamental e exercício, tendo fortes evidências de eficácia.

Contudo, há grande dificuldade de adesão. Por isso, é preciso que a conduta inicial seja focada no entendimento do paciente em relação ao tratamento, apresentando a natureza benigna da condição, identificando os fatores que pioram a dor, compreendendo que o tratamento é realizado de forma multidisciplinar e que é de extrema importância a sua participação nele.

Já os exercícios físicos incluem atividades aeróbicas, de fortalecimento muscular e alongamento, sendo recomendado um acompanhamento com educador físico, sendo a adesão importante para alcançar o condicionamento cardiovascular promovido pelo exercício aeróbico que induz melhora na dor e na qualidade do sono.

Ademais, a terapia cognitiva comportamental é importante para alterar os hábitos do paciente, dando novas perspectivas e modos de lidar com a doença, reduzindo os pensamentos catastróficos e reforçando um comportamento adaptativo. Além disso, há evidência de eficácia em tratamentos alternativos e terapias complementares que podem ajudar no aumento da ativação dos mecanismos analgésicos endógenos do sistema nervoso central, como o agulhamento de pontos-gatilho dolorosos, massoterapia, quiropraxia, taichi, ioga e acupuntura.

Foto: Katherine Hanlon/Unsplash

A fibromialgia traz ao portador uma realidade cheia de preconceitos e complicações emocionais. Fatores externos que provocam a sensação de estresse ao corpo pioram o quadro devido ao aumento da adrenalina, que pode provocar dor nos músculos e articulações característicos da doença. Assim, a doença é capaz de prender o paciente em um ciclo no qual ele se sente frustrado com o estado de dor que o afeta constantemente, gerando um estresse que piora o seu estado.

Por isso, devemos chamar atenção para essa doença e dar voz àqueles que vivem com essa condição. Aos profissionais da saúde, é preciso compreender as nuances do problema, do físico ao psicológico, sabendo das implicações na saúde mental do paciente. Por isso, convido os leitores a conhecerem o relato em livro de uma capixaba, Graziely Martins, que relata a sua experiência e dá voz a outras pessoas que sofrem com a doença em “Fibromialgia: uma jornada empírica”. Clique aqui para saber mais.

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Isabela Siyao Chen
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(爱)| Amarela | Paulista | Acadêmica de Medicina | Ambientalista | Voluntária | Colunista da Revista Brado | Um Mistério em Várias Línguas |