Você sabe o que é reforma agrária?

Embora o tema seja amplamente discutido há décadas, poucas pessoas realmente sabem o que ele realmente significa

Rodolfo Nascimento
Revista Brado
4 min readAug 20, 2020

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A reforma agrária é uma medida constitucional que busca maior destaque a agricultura familiar. Foto: Reprodução/MST

É quase impossível pensar no desenvolvimento econômico e na produtividade no Brasil sem levar em conta a agricultura, parte importante desse processo. No entanto, sabe-se que há no Brasil uma imensa concentração de terra, que traz consigo diversos problemas sociais e ambientais.

A extensão territorial brasileira está entre as maiores do planeta, possibilitando que o país seja uma das principais potências do agronegócio. Como toda questão que envolve interesses financeiros, propostas de alterações legislativas geram debates calorosos e polêmicas sobre sua aplicabilidade. Dentre essas propostas, a reforma agrária há muito tempo é discutida — na política, essa campanha já foi motivo de eleição e queda de presidentes.

A reforma agrária, no entanto, para além das disputas pelo poder, é uma garantia prevista na Constituição Federal, a fim de combater as desigualdades marcantes de nosso país e de preservar o interesse social.

De acordo com o Estatuto da Terra, a reforma agrária é o conjunto de medidas que promovem a melhor distribuição da terra, para garantir a justiça social e ao aumento de produtividade. Ela visa um sistema de relação entre o ser humano, a propriedade e a forma como é utilizada. Logo, com a aplicação das políticas de distribuição das terras, é possível uma gradual extinção do latifúndio.

Esse latifúndio tem se consolidado e a concentração de terras tem crescido no país. De acordo com uma pesquisa realizada pelo Censo Agropecuário do IBGE, propriedades rurais de até 50 hectares (aproximadamente 70 campos de futebol) representam 81,3% de todos os estabelecimentos agropecuários. Entretanto, boa parte dessa área é improdutiva, onde a especulação imobiliária garante aumento do valor do hectare e essas terras permanecem paradas, deixando de cumprir o papel legal de função social da propriedade.

Imagem: Chargista/Floreal

O que a reforma agrária faz é desapropriar o imóvel rural que não cumpre essa função social já citada. Dessa forma, propriedades que não aproveitam os recursos naturais e do solo adequadamente; que promovem degradação ambiental; que pratiquem inobservância do bem estar dos proprietários; ou exploração dos trabalhadores e suas relações de trabalho.

Um imóvel passa por indicadores de eficiência da exploração e de utilização da terra antes de um processo de desapropriação. O proprietário é notificado quando observado que sua localidade não cumpre os princípios da função social. É necessário que o imóvel seja declarado como de interesse social para fins de reforma agrária.

É importante ressaltar, entretanto, que não é qualquer tipo de terra que está sujeita a esse processo, que não tem qualquer relação com são afetadas pela reforma agrária, e o processo não tem relação com ocupações violentas que desrespeitem os princípios da legalidade. A reforma visa a garantia de utilização adequada da terra e de preservação ambiental.

Além disso, quando se conclui o processo que leva à desapropriação, o antigo proprietário é respaldado por uma indenização prévia, paga em títulos da dívida agrária, pela transferência de sua terra, em que se preserva o valor real acrescido de juros acumulados.

Essas terras, então, são distribuídas a agricultores que comprovem insuficiência de sustento, para a prática da agricultura familiar. Ainda podem compor em exploração educativa em pesquisa técnica ou colônias-escolas, bem como o destino a reflorestamento e conservação.

Segundo a ONU, a agricultura familiar é parte fundamental para o desenvolvimento sustentável, visto que, ao contrário dos latifundiários, os pequenos agricultores são o pilar dos sistemas de agricultura e alimentação, e preservam recursos naturais e a biodiversidade.

Foto: Reprodução/SINDILIMPBA

De acordo com Arpad Spalding, consultor de agricultura familiar da Prefeitura de São Paulo “na agricultura familiar, o local de trabalho é a mesma propriedade onde o produtor mora e, por isso, ele tem muito mais cuidado com a terra, pois depende dela por muito tempo”.

A maior parte dos alimentos que abastecem a população brasileira vem dessas pequenas propriedades, e uma melhor distribuição de terras garante estabilidade ao sistema de produção e aos seus agricultores para que continuem produzindo.

Segundo o Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária (INCRA), a implementação das práticas de democratização na estrutura agrária favorecem a produção de alimentos básicos, contribuem com a redução da migração campo-cidade, além de diversificar o comércio e serviço no meio rural.

Nesse sentido, uma análise mais realista da reforma agrária, tendo conhecimento real de sua aplicabilidade se faz necessária para garantir maior desenvolvimento econômico e social. Um termo que muitas vezes é tido como negativo ou extremista, na realidade é uma garantia constitucional, que deve ser implementada de maneira eficiente e planejada. Para que isso ocorra, o debate deve ser amplo, e não se limitar a polêmicas e falta de conhecimento.

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Rodolfo Nascimento
Revista Brado

Capixaba. Estudante de Direito. Diretor de Pesquisa da Associação Atitude Ubuntu. Editor e Colunista da Revista Brado.