Cadernos de leituras

A dramaturgia de Domingos de Oliveira, Tom Stoppard e do romeno Matéi Visniec

Bravo!
Revista Bravo!
2 min readMay 21, 2019

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Matéi Visniec (Foto Philippe Andre/Divulgação)

Por Carlos Castelo

Fazia tempo que não lia textos dramáticos. Mas me inscrevi num curso sobre criação de narrativas autobiográficas e acabei voltando a eles. Na aula, o professor pedia que cada aluno contasse uma experiência pessoal e eu falei da minha. Ele disse: “O seu estilo lembra o do Domingos de Oliveira”. Fiquei curioso com aquela observação e fui direto para a leitura de Melhor Teatro de Domingos de Oliveira (Global). Tomei contato com alguns scripts, mas confesso que não me enxerguei na produção do autor — apesar de reconhecer a qualidade do material.

Mas valeu. Acabei retomando o gosto pelas leituras teatrais logo caindo em Rock’n’Roll e Outras Peças, de reencontro com a peça Rosencrantz e Guildenstern Morreram, que adoro. Tom Stoppard pinçou dois personagens mais do que secundários de Hamlet e os transformou em protagonistas: o resultado é de um humor mais do que biscoito fino, diria-se shakespeariano como a antológica cena dos coveiros. Aproveitei o embalo e fui de O Hamlet de Dogg, o Macbeth de Cahoot, do mesmo livro. Ali, Stoppard inventa um improvável idioma para mais uma vez estender as fronteiras das possibilidades dramatúrgicas.

Ao terminar o texto soube, por acaso, da exibição de uma peça em São Paulo de um autor romeno do qual nunca ouvira falar: Matéi Visniec. Logo peguei o volume O Espectador Condenado à Morte (É Realizações Editora) e me identifiquei sobremaneira.

A comédia de humor negro dá um recado claro sobre as “paródias de Justiça” que, na opinião dele, não são exclusividade de nenhuma sociedade.

As provocações de Visniec se equilibram entre o totalitarismo comunista e o totalitarismo do consumo. Há em suas linhas um pouco de Tchecov e outro tanto de Samuel Beckett. Em 1987, o escritor saiu da Romênia e foi viver na França. Contudo, o conceito que tinha de democracia foi frustrado pelo estilo de vida existente ali. Para Visniec, nos países ricos e democráticos existem outras formas de ditadura. Entre elas a TV que, segundo ele, “deveria chegar a uma casa só depois da prosperidade e da água quente”.

A É Realizações traduziu 20 textos teatrais de Matéi Visniec. Mal terminei O Espectador Condenado à Morte e já iniciei a leitura de Os Bolsos Cheios de Pão — peças curtas. Também estou ansioso para pegar o romance do romeno que tem o sugestivo título de O Negociante de Inícios de Romance. Nele, um misterioso indivíduo se diz responsável pela criação da frase de abertura de romances de autores como Camus, Kafka, Melville e Thomas Mann.

Promete.

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