Cadernos de leituras

Edição mais popular de “Dicionário do Diabo”, de Ambrose Bierce, chega à praça

Bravo!
Revista Bravo!
2 min readApr 3, 2018

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Por Carlos Castelo

Ambrose Bierce (1842–1914), autor do célebre Dicionário do Diabo, foi um dos maiores satiristas norte-americanos. Sua produção literária é enorme: material jornalístico, textos humorísticos, ensaios, fábulas e contos. Com um tom sarcástico e um estilo negro polvilhado de humor, deixa entrever em suas histórias tanto o sobrenatural quanto o terror psicológico — ou a afirmação de uma posição pacifista originada pela sua vivência na guerra civil americana.

Em 2017, a editora Carambaia havia lançado um tiragem “de luxe” de seu livro mais famoso com apenas mil exemplares. Capa dura, tradução de Rogério W. Galindo: papa fina que esgotou-se rapidamente. Agora, a editora colocou no mercado uma edição mais simples, sem ser simplória, mas obviamente com o mesmo conteúdo.

O objetivo é ter a qualidade mantida em edições mais econômicas, com o mesmo projeto gráfico apurado. O livro foi padronizado, com ampla distribuição em livrarias e a preços mais acessíveis. Depois de Dicionário do Diabo vêm, na sequência, Salões de Paris, de Marcel Proust, e Dom Casmurro, de Machado de Assis.

O grande diferencial desta edição do Dicionário é que ela traz, traduzidos para o português, os poemas de Bierce que foram omitidas em outros lançamentos. Poemas que, alegaram certos editores, não eram a parte mais interessante da obra.

Bierce, de fato, era um prosador antes de tudo — a poesia ele praticava sempre, mas não com a mesma facilidade da prosa. Os versos do Dicionário são bem-acabados, mas talvez alguém não se empolgue com eles por não serem escritos na intenção de revelar um estado de espírito, um sentimento: não são poemas líricos, e sim descritivos, usados para contar histórias que ilustrem aquilo que o verbete não faria melhor.

Amputar os poemas, assim, foi retirar do leitor a chance de conhecer o projeto inteiro de Bierce, como ele se propôs a escrevê-lo.

Descobri Ambrose Bierce no final dos anos 1990, totalmente por acaso, numa viagem a Argentina. Nem havia tradução em português e o degluti em castelhano mesmo. Lembro-me ainda hoje dos primeiros verbetes que li, na letra P:

POLIDEZ (POLITENESS), s.f. A mais aceitável hipocrisia.

POLIGAMIA (POLYGAMY), s.f. Casa de expiação, ou capela expiatória, mobiliada com vários bancos penitenciais, em oposição à monogamia, que tem apenas um.

Conselho de amigo: compre antes que esgote de novo. O niilismo de Bierce, apelidado de Bitter, ajuda a explicar muito do amargor a que somos submetidos hoje em dia.

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