Cirque du Soleil finaliza turnê em São Paulo e prepara retorno ao Brasil

Rafael Ventuna
Revista Bravo!
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7 min readApr 22, 2019

Dirigido pela brasileira Deborah Colker, OVO fica em cartaz até 12 de maio no Ginásio do Ibirapuera

Seres minúsculos se surpreendem com um misterioso OVO. Foto: Cirque du Soleil

A turnê de OVO — espetáculo mais brasileiro do Cirque du Soleil — chega a sua fase final no país. Depois de Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Brasília, o fascinante ecossistema idealizado por Deborah Colker se instala no Ginásio do Ibirapuera até 12 maio.

O show narra uma história bastante simples. Mas, é a partir dela que se criam metáforas profundas sobre viver em comunidade, respeito às diferenças e cuidado com a Natureza.

Em resumo, a rotina do lugar onde habitam seres minúsculos é transformada pela chegada de um estrangeiro que traz consigo um misterioso ovo. A novidade faz surgir sentimentos diversos: de curiosidade à esperança.

Embora grupos de insetos sejam maioria, o mais correto é dizer que OVO representa no palco uma população de artrópodes. Porque há outros seres, como aracnídeos, que circulam por lá. Mencionar que todos eles pertencem à classe insecta, deixaria qualquer biólogo, no mínimo, furioso.

OVO desembarca no Brasil em formato arena. Vídeo: Cirque du Soleil

Ovulação e a origem da vida
Deborah costuma explicar o conceito de seu show incentivando uma reflexão sobre a importância que o ovo tem na manutenção da vida dos seres do planeta Terra.

Quem nasceu primeiro: o ovo ou o inseto?
Deborah – [Gargalhada] Eu não sei.

O ovo guarda o enigma do ciclo da vida. E a gente tem que respeitar isso. Precisamos respeitar também as diferenças da natureza humana e da natureza geográfica. É uma questão de existência e de sobrevivência.

Criamos uma história universal e atemporal que fala a todos os públicos.

The Foreigner (O Estrangeiro) e o ovo. Foto: Cirque du Soleil

Pequena GRANDE lutadora
Reza a lenda que Gilles Ste-Croix, guia artístico do Cirque, foi até Londres fazer o convite à Deborah, que estava na capital britânica para uma temporada com sua companhia de dança em 2006.

O “sim” de Deborah se converteu em momento histórico. O maior circo do mundo passou a ter pela primeira vez uma mulher como diretora de show. Nenhum artista do Brasil havia desempenhado tal função na trupe canadense. A nova criação que estreou em 2009 teve de abordar a sustentabilidade como tema. E demarcou naquele ano as celebrações do 25º aniversário do Cirque.

Como coreógrafa, Deborah costuma percorrer cerca de dois anos com seu processo criativo. Entre os seus grandes desafios estavam o prazo de nove meses e dirigir um elenco com mais de 50 artistas. Foi um período em que era mais fácil encontrá-la em Montreal do que no Rio.

E, lá, na sede da “fábrica”, como ela mesmo define, travou batalhas diárias para defender suas propostas. Que lhe rendeu o apelido de “little fighter”. Essas batalhas iam desde o convencimento para usar uma palavra em português como título a manter com ela sua própria equipe criativa, no caso o cenógrafo Gringo Cardia e o compositor Berna Ceppas.

Conterrâneos: canções cantadas em português por Larissa Finocchiaro e até um solo de pandeiro do músico brasileiro Marquinhos da Luz são show à parte em OVO. Foto: Cirque du Soleil

“Não tivemos de nos esforçar para ser brasileiros. Porque já somos”, argumenta Deborah, que determinou que não trabalharia com bailarinos, mas com acrobatas, porque desejou criar um espetáculo essencialmente circense com sua assinatura coreográfica.

O resultado final é uma sequência de performances acrobáticas, de equilibrismo e contorcionismo, ambientadas por uma trilha sonora que ecoa acordes de samba, forró, bossa nova e até funk, em um cenário que usa uma paleta de cores bem tropical.

O acrobata brasileiro Martin Alvez e Beth Williams no número das Borboletas. Foto: Cirque du Soleil

Após a estreia, Deborah seguiu sua luta. Ela queria que OVO chegasse o quanto antes ao Brasil. Quando conversei com ela em 2015 — seis anos depois da estreia, foi taxativa ao dizer que não tinha absolutamente nenhuma previsão para a vinda do show.

Ela conta que nem mesmo quando esteve em Londres em janeiro de 2018 trabalhando na reestreia no Royal Albert Hall obteve informações. A confirmação chegou somente às vésperas da coletiva de imprensa realizada em novembro do ano passado em São Paulo.

Para entender como a decisão é tomada, falei com Nicolas Chabot, publicista do Cirque que acompanha as turnês de OVO pelo mundo.

Uma década. Por que tivemos de esperar tanto?
Chabot – Esta é uma pergunta difícil! Depois de criados em Montreal, os espetáculos do Cirque du Soleil geralmente seguem uma determinada rota que começa pela América do Norte. Com um intervalo de um ou dois anos entre eles.

Era o sonho de muita gente quebrar a regra e vir direto pro Brasil. Mas teria bagunçado a programação de todas as outras turnês. Discutimos sobre esta temporada brasileira por muito tempo. Você pode imaginar o quanto nos empolgamos em saber que finalmente chegaríamos a este lindo país que é o Brasil. A gente se sente em casa aqui.

No caminho para cá, surgiu outro obstáculo. Que foi a adaptação em 2016 do formato tenda para arena. Quando isso acontece no Cirque, uma série de ajustes precisa ser feita, como descreve Chabot.

A contorcionista Aruna nasceu na Mongólia e foi criada no Brasil. Foto: Cirque du Soleil

Como são os esforços para a adaptação de tenda para arena?
Chabot – É um longo processo! Quase tanto esforço quanto criar um novo show. Mais de um ano para concluir. Maior parte deste tempo é gasto reunindo equipes de criação e produção para repensar tudo.

Então, aproximadamente seis meses de trabalho para reconstruir um novo palco e reencenar o show inteiro com os artistas. Trabalhamos por três meses nos enormes estúdios na sede do Cirque em Montreal até irmos para uma arena em Lake Charles, nos Estados Unidos, e terminar a recriação. É importante que a equipe finalize em um ambiente de arena real.

Tem muitas mudanças nesta versão para arena: cenas foram reescritas, o palco está maior, uma parede maior, mudamos dois dos atos e adicionamos projeções.

OVO cresceu e agora é mais dinâmico e colorido do que antes!

A parede, marca registrada de Deborah Colker desde quando lançou a ideia em MIX (1995). Os ensaios técnicos de OVO são coordenados pelo brasileiro Emerson Neves. Foto: Cirque du Soleil

Falando em crescimento, todos os equipamentos viajam em 25 contêineres. Dois deles são exclusivamente para as mais de mil peças de figurino. Cuja produção foi cuidadosamente supervisionada pela figurinista Liz Vandal.

Este enorme carregamento, além de todos os equipamentos de luz, som e cenário, também monta nos bastidores centro de treinamento, camarins, ateliê de costura e a irresistível lojinha apinhada de produtos made by Cirque.

Para eles, números são sempre superlativos. OVO já passou por 137 cidades de 19 países e terá alcançado ao final da turnê brasileira um público de mais de 6 milhões de pessoas, das quais mais de 320 mil nas sessões realizadas no Brasil.

O aporte do patrocínio também precisa acompanhar esta escala. O Bradesco, parceiro de longa data do Cirque, optou pelo patrocínio direto. Ou seja, sem o uso de leis de incentivo, portanto, sem uso da Rouanet.

Outros patrocínios do banco viabilizaram a primeira vinda da trupe em 2006 com Saltimbanco e as turnês de Alegría em 2007/2008, Quidam em 2009/2010 e Varekai em 2011/2012.

Passaram por aqui também as turnês de Corteo em 2013/2014, na ocasião apresentada pela Fast Shop e que deixou a produtora T4F com um prejuízo milionário; e Amaluna, em 2017/2018, apresentada pelo Banco Original e que reacendeu os escândalos sobre uso de Rouanet em temporadas do Cirque.

O Bradesco informou, por meio de sua assessoria, que neste intervalo os investimentos estavam concentrados em eventos esportivos, como as Olimpíadas Rio 2016. E que, com a possibilidade de um novo espetáculo vir ao Brasil, o banco não hesitou em retomar a parceria de sucesso.

A produção é da IMM Esporte e Entretenimento, realizadora de megaeventos como Rock in Rio e São Paulo Fashion Week.

A brasileira Neiva Nascimento é Lady Bug (Joaninha) e integra o elenco de protagonistas. Foto: Cirque du Soleil

Sobre o agendamento do próximo espetáculo do Cirque, Chabot garante que a equipe no Canadá está cuidando disto. “Estive em mais de dez países com o OVO e o público brasileiro está entre os melhores. As reações aqui são as mais loucas. Isso nos encanta!”

Aumentando a pressão para ele dizer o nome do show, o máximo que consegui foi uma resposta, digamos assim, divertida. “Ouvi boatos diferentes. Mas infelizmente não posso compartilhar nada ainda”. E misteriosa. “Mesmo se eu tivesse a informação, eu não iria querer estragar a surpresa!”.

Os fãs brasileiros do Cirque já podem fazer suas apostas. Encerro este texto arriscando meu palpite em Kooza, embora eu faça campanha para que venha KURIOS - Cabinet of Curiosities.

OVO, de Deborah Colker
Cirque du Soleil

Terças a domingos
Até 12 de maio
Ginásio do Ibirapuera
R$ 130 (meia) a R$ 580
140 min (com intervalo)
Livre

Atualizada em 24 de abril de 2019 às 11h20

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