Como ganhar o jogo das redes sociais: um mini manual para criadores de conteúdo

Por Diego Perez

ano II: ensaio
ano II: ensaio

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Você está de bobeira um dia, na sua sala ou no vaso, quiçá entre aulas ou numa folga do trabalho, e, pra espairecer, resolve puxar o celular e apenas ser levado pela corrente algorítmica que o tiktok te oferece. Pode ser uma dancinha, um vídeo bem executado de maquiagem, um meme remixado ad nauseam ou uma montagem mais elaborada, com 27 fotos e uma música sincrônica: independente do que seja, por um milissegundo você também imagina se ver ali, reproduzindo algo ou fazendo o seu próprio conteúdo…

Fim de intervalo. De volta ao trabalho.

Mas aquela coceirinha atrás da sua orelha continua fermentando durante as video-chamadas, os prazos de entrega, a janta, o banho e o sono. Até o momento em que, numa quarta-feira qualquer, você decide se aventurar como produtor de conteúdo a sua própria maneira: pensa num nome inteligente pro seu podcast, um reels engraçado, uma ótima piada pro twitter que você posta “só pra ver o que acontece”.

A reação da sua bolha, durante o dia, é igual ou um pouco menor do que normalmente você costuma receber. O mesmo número de likes, alguns poucos comentários. A sua reação a reação deles é dúbia: você se sente bem em não ter sua ideia rejeitada, ridicularizada, e alguma confiança no fato de que o que saiu da sua cabeça, de algum modo, tenha ressonado naquelas pessoas; por outro lado, a falta de uma recepção mais explosiva (que você mentia pra si mesmo não esperar) se torna uma interrogação. Será que foi o áudio? A minha câmera não pegou direito? Precisava ter trabalho mais a ideia? Faltou técnica?

Você vê um tutorial, compra um curso, um microfone melhor, pratica 3 ou 4 vezes antes de soltar a versão final do seu segundo post. O engajamento melhora, as pessoas começam a entender (é o que você imagina) a sua proposta, e, durante as próximas semanas, é possível que você tenha aquela uma publicação que escapa completamente das suas expectativas.

E esse ciclo teoria/prática/reação morna mas positiva vai se estabelecendo por alguns meses ou um ano, quando, por fim, você chega num patamar imutável: pra cada 1000 seguidores, 100 likes; pra cada 5 novos seguidores, 3 ou 4 já não interagem de forma alguma; as reproduções ou leituras são sempre 30 ou 40 por cento a baixo do que você gostaria.

Apesar de se esforçar pra criar um conteúdo de qualidade, você não consegue os publis que pensou que teria com os seus k de seguidores, não tem recebidos chegando na porta, não monetiza quanto gostaria.

Os caminhos que você pode seguir, a partir daqui, se multiplicam:

Você desencana disso, prioriza os boletos e problemas de relacionamento. Em um ano, quiçá, nas rodas de amigos, você faz piada de quando tentou virar youtuber e realmente acreditou que a coisa decolaria quando pegou aquele tanto de views no seu video mais despretensioso.

Você desiste do projeto mas não de você. Entende que o seu perfil de arte é um nicho e chegou no ápice do engajamento. Então decide abrir um segundo projeto ou até mesmo começar do zero. Seu primeiro post pega números melhores do que o seu primeiro post anterior e o sentimento de “agora vai” brota do seu coração.

Você começa a se sabotar de propósito. Deixa de seguir o seu cronograma, “será que alguém realmente se importa se eu não postar hoje?”, pensa com ressentimento. Ressentimento, de fato, é tudo o que parece ter a sua frente: as pessoas que começaram junto com você moram na capital, sempre tiveram mais conexões, mais privilégios. É óbvio que eles estão conseguindo emplacar. Nesse ponto você já não responde mais os emails, xinga as pessoas que “pedem colab ou divulgação” no inbox sem mesmo ser inscrito e a sua página nerd vai simplesmente definhando.

Mas você não é como esses por ai,

você não desiste.

E, num ímpeto corajoso, parte pro tudo ou nada.

Compra uma câmera profissional, vai no evento de games em outro estado, se inscreve no curso com aquele escritor famoso, paga pelos impulsionamentos do Facebook, sai completamente da sua bolha criativa e começa a fazer o vídeos no IGTV porque, por algum motivo, é o que a plataforma e o algoritmo agora decidiu priorizar. Cria perfis em todas as redes sociais possíveis e tenta manter todas ativas nem que seja com alguma regularidade.

O seu dia fica completamente cheio de micro atualizações. Seu chefe reclama, seu namorado reclama, seu psicólogo contra indica, seu ansiolítico aumenta e sua conta bancária diminui. Porém, os números do seu projeto principal melhoram.

Aquele desenhista verificado dá like no seu post, você ganha mais algumas dezenas de apoiadores no seu catarse flex e as pessoas finalmente começam a ativar o sininho. Seja monetariamente ou por engajamento, o seu Spotfy começa a se pagar.

Até

que,

alguns meses depois,

você chega num patamar imutável:

pra cada 1000 seguidores, 100 likes; pra cada 5 novos seguidores, 3 ou 4 já não interagem de forma alguma; as reproduções ou leituras são sempre 30 ou 40 por cento a baixo do que você gostaria.

Como? Por quê? Eu realmente deixei um emprego com férias e décimo terceiro pra ganhar 20% a menos do salário que eu tinha pra isso?! PRA ISSO!!!

Você está com boletos atrasados, problemas no relacionamento, burnout, insônia, ansiedade, depressão. Decide sair. Pelo bem da sua saúde, pelo bem do seu futuro.

Chegou a hora de voltar a vida normal: seca as lágrimas, limpa a casa, distribui currículos, aceita a proposta daquela empresa que te procurou há uns meses atrás.

É domingo, amanhã você pega o serviço às 9 e decide se despedir dos seus seguidores. Faz uns stories sem maquiagem, explica a situação, desabafa sobre tudo o que passou nos últimos meses. Sua consciência está limpa, fez o melhor que pode, deu tudo o que tinha pra dar e, mesmo que não tenha acontecido como você gostaria, se orgulha do pouco que conquistou. Finalmente, você desativa as notificações, toma o rivotril e vai dormir.

Quando a manhã vira, você toma seu café, bate ponto e, na hora do almoço, abre o Instagram no automático. A curiosidade do porquê tem tantas notificações é assustadora e então você procura ver o número de “vistos”…

Diego Perez é doutorando em Letras Neolatinas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, editor-chefe da revista ano II: ensaio, curador da MAGzine e autor dos zines “Viçosa” (2020) e “Ideiafixa” (2021). Também pode ser encontrado em seu Instagram.

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