Capa da Revista Placar de abril de 1970.

CBF: desvio e superfaturamento desde 1970

Revista Fora da Área
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5 min readJun 18, 2015

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Baú da bola: A nova série de publicações da Revista Fora da Área busca revisitar alguns temas polêmicos no mundo do futebol, abordados durante décadas por jornais, revistas, rádio e televisão. Será feito um panorama das situações que mudaram no esporte e as que continuam iguais. Neste texto, um assunto que voltou à pauta em 2015: o desvio de dinheiro na CBF.

Desvio, superfaturamento, verba pública, luxo. Confederação Brasileira de Futebol, João Havelange, José Maria Marin, Ricardo Teixeira. Todas essas palavras da primeira frase, em alguma vez na história da imprensa brasileira, já foram relacionadas com a segunda. Sempre com razão.

Neste ano de 2015, onde os escândalos de corrupção na FIFA foram finalmente investigados a ponto de levar boa parte do alto escalão da entidade para a prisão, os nomes dos ex-presidentes da CBF novamente estão escritos em nuvens que pairam sob o céu carregado da propina. Tempo nublado que prevê chuva de dólares.

‘Eu vejo o futuro repetir o passado’

Em abril de 2013, o jornal “Folha de S. Paulo” divulgou dados da compra do imóvel da nova sede da CBF, localizada na Barra da Tijuca, bairro rico da Zona Oeste do Rio de Janeiro. O local — cuja compra foi anunciada em junho de 2012 e confirmada em agosto — , custou R$ 70 milhões de reais, conforme anunciou na época o então presidente José Maria Marin. O edifício, aliás, levava seu nome na fachada até mês passado.

O prédio tem oito salas comerciais e pouco mais de 6 mil metros quadrados. A BT Construtora, empreiteira responsável pela obra, negociou cinco dessas salas para intermediários por R$ 12 milhões e repassou R$ 43 milhões À CBF. As outras três salas custaram R$ 8 milhões à Aprazível Empreendimentos; a empresa vendeu os cômodos para CBF por R$ 15 milhões .

Isso quer dizer que se a CBF não tivesse usado intermediários, teria gastado R$ 39 milhões para adquirir sua nova sede; com eles, subiu para R$ 70 milhões. Tanto a CBF quanto as empresas envolvidas no negócio afirmaram que não houve irregularidades durante a compra.

Isto não é de hoje, como nos mostra um trecho da matéria da Revista Placar abaixo, datada de 03 de abril de 1970.

“Está tudo confuso. Não sei de mais nada.” (Tesoureiro da CBD)

‘O nôvo e elegante prédio da CBD na Rua da Alfândega, 70, no Rio de Janeiro (“Edifíco João Havelange”), foi reformado e decorado com uma parte do dinheiro arrecadado para as despesas da Seleção Brasileira na Copa. A prova dêsse desvio de verbas está na página 22 do Boletim número 2 da CBD, de novembro de 1969, itens 11 e 12, aprovados na reunião de diretoria realizada no dia 14 de outubro de 1969.

Item 11 — “Autorizar a despesa limite — da verba de até NCr$ 400 000,00 de instalação definitiva da CBD, sendo que essa despesa inicial correrá a contar das seguintes arrecadações: 1) NCr$ 50 000,00 — provenientes da assinatura do contrato com a Shell; 2) NCr$ 70 000,00 — da receita do banquete realizado no Hotel Hlória pelo Comitê Nacional Pró-Selecionado Brasileiro.”

Item 12 — “Resolver que as obras de instalação sejam realizadas pelo sistema de administração, ficando encarregada a firma Construtora Mamede Ltda., percebendo pelos seus serviços a taxa de administração até o limite de taxa de 18% e mais os encargos sociais.”

O item 11 deixou claro: inicialmente seriam gastos NCr$ 120 000,00 para a construção do edifício. Mas as despesas poderiam chegar até NCr$ 400 000,00. E o item 12 fêz uma grande revelação: a Construtora Mamede Ltda. pertece ao cunhado de João Havelange.

O fato de a CBD confessar publicamente o desvio de verba leva a crer que o sr. João Havelange deve ser uma honrado e ingênuo presidente e que a Construtora Mamede Ltda. é uma firma honesta e digna. Mas não deixa dúvida quanto a um ponto: o torcedor brasileiro foi enganado, assim como foram enganados o cantor Wilson Simonal e Pelé (responsáveis pelo anúncio da Sell pedindo ao público para ajudar a Seleção).

Era impossível prever que o dinheiro serviria para construir e decorar os modernos gabinetes dos dirigentes do nosso confuso futebol.

Tão confuso como simples é o plano para conseguir, segundo o cálculo inicial da CBD, os NCr$ 4 498 738,00 necessários para o Brasil disputar o Mundial.’

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