AmorTeceADor

Poeta Rafa Ribeiro
Revista in-Cômoda
Published in
3 min readJul 11, 2018
“Close-up of an engaged couple holding hands outdoors. One wears a long-sleeved shirt.” by Paul García on Unsplash

Descalço sobre chão em brasa, a sola queima, tanto quanto o peito espanca o corpo, a dor em mim não chega, é sentido estranho, de ânsia por mais, querer queimar-se por inteiro, ser chama por algo que me chama, sentido que norteia e pulsa forte da cabeça aos pés. A sola, planta base do meu andar, assola o âmago do meu piso, se a busca mostra claramente por onde vai, sentimento que almejo é cada vez mais preciso. Passos marcados em brasa, não dói, porque ainda não há o que procuro, o amor, só ele faz doer, o AmorTeceADor.

Entregue sendo todo, metido por entre selvas escuras que nem sabe onde pisar, no chão é lama, galhos, folhas, poça, buracos sem fim, se iluminado o caminho fosse, jamais entraria, mas ao fim da trilha havia sim uma luz, então só vou. Ainda descalço, em busca de algo que a lembrança vaga intui ser o melhor, com os pés em chagas, sem dor nas veias pulsando, sangue mancha a pele das raízes de árvores e espinhos já não sinto. Sem certeza de nada, apenas o desejo de ter o brilho ao fim da selva escura, uma esperança incerta, uma entrega sem trégua, cansado de andar sozinho, seguindo o meu caminho, busca cara, cara mia, pequeno caro, carinho. E ele segue a tecer, sem saber vou de encontro, deve ser essa a luz que busco, em meio a dor, o AmorTeceADor.

A luz, sabe? Chega nunca e ainda assim a esperança só cresce, no peito há algo que pulsa, uma certeza que ferve dizendo “não pare”. No meio do caminho alguns lagos passam, tão frios que gelam a alma, sento e com calma os pés se lavam, olhar breve no reflexo dali, um sorriso pelo o que vê e vida que segue, busca que não cessa, corre pela promessa da tal luz ser o que sempre sonhou, amor, mesmo que venha esse doído, amar deve de ser o sentimento mais controverso, pois mesmo eu caminhando florestas, campos, espinhos, brasas e tudo, ainda não consigo ler na bula um só verso que justifique todos os ferimentos. Que ao fim possa dividir as aventuras, contar animado cada um desses momentos e enfim ter onde descansar, pode ser sonhar demais, mas queria fosse uma rede pra acabar, deito e feito morto cheio de vida, balanço com os pés pra cima sarando as feridas, mas como haveria rede ao fim dali? Só uma resposta serve, o AmorTece.

E foram horas passadas, talvez dias, sabe-se lá quantos anos até enfim à luz chegar, e sem entender vejo que sempre fora um espelho a brilhar o reflexo de algo maior, me aproximo e sinto aumentar o calor, olho no olho sorrindo em gostar do que vê e tudo se parte, espelho em cacos e o pé descalço se corta. Me vejo em cacos ao fim da caminhada, lamento e alívio por enfim ser chegada e olhares perdidos entendem que o tempo todo tive amor, cuidando, pisando, sentindo e poupando-me da dor, curando pés e tecendo em linhas. No chão, amando cada pedacinho de mim, com a certeza, dessa vez absoluta que apenas o AmorTeceAmor.

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