Com carinho e não com balas

Tiago da Silva
Revista in-Cômoda
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1 min readApr 9, 2018

Ia puxar o gatilho

desejando que a bala

tivesse o poder

de desfazer tudo.

Implorando para que ela

mandasse pelos ares

todas as lembranças.

Toda a dor

que lembrar trazia.

Todos os cheiros.

Todas as cores.

Dos olhos, do vestido.

Todas as frases.

Todo o futuro imaginado.

Todos os sons.

A voz. A risada. O choro.

Os poros. As lágrimas.

O gosto.

O toque. As formas, as medidas, as proporções.

Tão adequadas, tão justas, tão certas.

Todas as imagens que não saiam da sua cabeça.

E que o atormentavam à noite.

Se, literalmente, perder a cabeça

fosse o preço,

ele pagaria de boa vontade.

Mas depois lembrou que todas esses pedacinhos de memórias

e sonhos abortados

e coisas que quase foram

compunham quem ele era, afinal

e mereciam ser tratadas com carinho

e amor

e saudade

(boa)

e não com balas.

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Tiago da Silva
Revista in-Cômoda

Às vezes me surpreendo com o que escrevo, porque não sabia que pensava assim.