Em boa companhia

Izabel da Rosa
Revista in-Cômoda
Published in
3 min readAug 24, 2019
Photo by Lesly Juarez on Unsplash

Se estou feliz o rosto no espelho sorri para mim.
A boca insiste num visual imperfeito
porém não vejo incorretos nem dentes nem traços
e me acho bonita vestindo amarelo, com brinco, com óculos
ou de cara lavada e olheiras de quem acabou de acordar.

Se estou feliz bato à porta da minha vizinha
dou um abraço e digo que estou com saudade.
escuto a voz rouca que traz outras gentes,
outros tempos, detalhes sem fim.
Personagens se amam e brigam e fazem as pazes
e conhecem a outros criando outra história dentro da história.
Se emendam os fatos, se repetem, se arrastam.
Eu perco o enredo, mas, ouço com calma esquecendo da hora.

Se estou feliz, trabalho em casa cantando ‘una canzione d’Italia’
falando de sonhos, ternura, e encantos do amor desejado
e gosto da voz que solto em sussurro.
Parece uma obra de contralto experiente
e que eu até poderia aceitar um dueto
com o Andrea Bocelli ou a Laura Pausini.
E ainda, ouso entoar Fito Paez num rock balada
e me sinto a sua musa eterna, sua amada de agora.
Ou canto um tango com outro ‘hermano’ magoado
que perdeu sua querida e por isso não tem
alegria ‘ninguna en su alma herida’.

Se estou feliz cozinho um pouco, um molho picante,
ou tempero suave, manjar que os deuses não vão recusar.
O cheiro invade as minhas narinas
enquanto retém nas cortinas um aroma de manjericão.
O sabor todo novo eu devoro sozinha
ouvindo o ruído de cada mordida.
Vejo na estante o porta retrato
e digo baixinho que a moça da foto faz tantas delícias
pena que ela nem sempre quer cozinhar.

Se estou feliz acho que é rápida a fila do banco,
me distraio com as caras zangadas, cansadas
resmungando coisas que nem tento ouvir.
Imagino o que pensam, o sorriso que têm , o jeito que amam,
o som de suas vozes na conversa em família
e me esqueço do tempo nos trechos de frases
que o momento me traz.

Mas mesmo feliz, o tempo não para.
Converso com o guarda que multou o meu carro
e peço desculpas por ser distraída, por parar tão errado,
por estar apressada e outras tantas razões
que ele nem ouve e que eu repito outra vez
sorrindo pra multa que devo pagar.

Se estou feliz me divirto com a piada, outra vez repetida
que o colega ao lado insiste em contar.
Ela me afasta dos cálculos e perco o rumo do meu raciocínio
Demoro a rever a solução tão buscada.
Mas logo os números me parecem amigos
e é até divertido resolver de uma vez
todas aquelas pendências da semana passada.

Se estou feliz solidão não existe.
Rodeada de gente ou sozinha na sala,
tenho todo o tempo do mundo
e o mundo inteiro sorri pra mim.

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Izabel da Rosa
Revista in-Cômoda

Eu não tenho os pés no chão tenho uma ânsia de asas entregues à correnteza das palavras que me visitam e contam coisas que só sabem os que sentem.