Escada de incêndio

Ivan Nery Cardoso
Revista in-Cômoda
Published in
3 min readMay 2, 2019

Pobre Dantino: rapaz feio, baixinho, com pança e bafo, que, para piorar, era apaixonado por Joana. E quem não era apaixonado por Joana no segundo ano do colegial? Parecia filha do rugido das cachoeiras com o frescor de uma brisa no verão. Seus lábios eram todos sorriso e a pele bronzeada era uma eterna aurora nos campos de lavanda, aos olhos de Dantino.

Joana estava sempre em rodinhas no recreio e no horário de saída das aulas, confabulando com as amigas. As risadinhas e o bom-humor pareciam vir de um poço sem fundo. Enquanto isso, Dantino era uma visão que dava dó. Triste, triste. Chorava suas lamúrias pelos cantos do colégio por achar que o tanto que era feio jamais compensaria o tanto que a amava.

Foi numa terça feira fatídica de agosto que as estrelas se alinharam e a história tomou seu rumo. Dantino, mais uma vez, chorava seu azar escondido nas escadas de incêncio do prédio anexo quando Joana chegou sorrateira, sentou ao seu lado e tascou-lhe um beijo. O primeiro de Dantino: uma sensação que não sabia processar, um arrepio na pele, lábios tremendo de tanto medo. Depois de cinco ou seis linguadas, Joana deixou que o rapazote pusesse a mão sobre seus peitos, e depois de mais duas ou três, que os tocasse por baixo da blusa, sentindo a dureza dos mamilos e colocando os neurônios do garoto em pane.

Pobre Dantino. Tocava aquela pele macia, lambia a língua doce com sabor de bala tutti frutti de sua amada como um cachorro lambe a face de seu dono. Acreditava já estar no paraíso, no êxtase descrito pelos poetas, poderia morrer feliz naquele instante, quando sentiu uma nova surpresa: Joana abriu o zíper de sua calça e pôs para fora seu membro ereto e fedido.

Era essa também sua primeira vez tocado por mãos que não as suas. Seu cérebro juvenil entrou em pane com a novidade das sensações. Tudo parecia um sonho, uma explosão de sensações com a qual não sabia lidar. Em quatro descidas e cinco subidas, Dantino atingiu o nirvana e atirou sua porra em direção aos astros, espalhando gotas espessas ao redor, respingando suas roupas e as mãos de Joana.

Pobre Dantino. Encerrados o orgasmo, a bulinação e o beijo, sua amada limpou as mãos nas paredes da escada e, quieta como veio, foi embora, desaparecendo no andar de baixo. Nem olhou para trás, para ver o sorriso apaixonado e com bafo no seu rosto.

O jovem, tomado de uma súbita vergonha, se cobriu e correu ao banheiro para limpar o excesso de fluidos antes que endurecessem nas roupas. Era o fim do recreio, e Dantino, ainda incrédulo, se prontificou a relatar o ocorrido aos primeiros amigos que encontrou. Reuniu-os em roda, contou do choro na escada, dos lábios macios de Joana, dos peitos firmes de Joana, das mãos de Joana em volta de seu membro, dos jatos massivos de esperma. Chegou até a levá-los à escada de incêndio e apontar as manchas ainda frescas na parede.

Pobre Dantino. Nunca foi alvo de tanto escárnio quanto naquele dia. Nenhum de seus amigos acreditou no relatado. E quem acreditaria? Joana jamais admitiu o fato. Pelo contrário, negou até o fim do terceiro colegial, e, depois de entrar numa faculdade de Letras em outro estado, deixou de pensar sobre a fofoca. O rapazote, entretanto, sem testemunhas ou provas concretas, ficou conhecido nos corredores da escola, daquele dia em diante, como mentiroso e pervertido. Além, claro, de feio, baixinho, com pança e bafo.

Pobre Dantino. Jura que disse a verdade sobre o episódio da escada de incêndio. Jura que beijou Joana, que tocou seus peitos e que foi masturbado por ela. Jura até hoje, sem saber que é o único que ainda se importa com aquela tarde, anos atrás, nas escadas de incêndio. Dizem que, pedindo com jeito, ele te leva lá e mostra o exato degrau em que estavam sentados.

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