Eu tentei

Poeta Rafa Ribeiro
Revista in-Cômoda
Published in
2 min readApr 6, 2020

Eu tentei

Tentei limpar a casa de tudo que foi jeito, mudar os móveis de lugar pra que fosse pra mim um novo canto, chamar de sala o que era só quarto, cozinhar lá fora pra criar outros sabores, eu parei de olhar pro teto, eu tentei buscar sentido pra cada canto, pintei todas as paredes inventando novas cores. Me vi preso na lembrança ao redesenhar meu cômodo preferido, me apeguei ao que eu via estampado sem me dar conta que eu já tinha ido. Sem perceber que a tentativa de não ver, já era ver demais. Sem me lembrar que quando eu disse que não quero, é porque já quis mais de uma vez.

Eu juro que tentei.

Da poesia escrita na mesa não ficou nada, e o silêncio maldito estampado na hora do café me grita aos ouvidos os versos que achei que já tinha esquecido, mas não deixo quieto, eu falo mais alto, insisto escrever do meu jeito, cansei de tentar ser folha em branco, isso não sou. Caderno velho, capa amassada, partes rasgadas e outras tantas intactas, é ali que vou me escrever.

Minha caneta se recusa a escrever “CAPÍTULO 1” outra vez, a história que for contada daqui precisa saber que seguimos do 3, ou quem sabe do 5, 6, sei lá. Mas é importante dizer que mesmo que essas linhas se acabem, ainda teremos as mesmas paredes, ainda me resta o papel toalha na mesa, ainda tenho a própria mesa e escrever poesia em cima dela não é sobre apagar o passado, mas sim construir um presente e se depois disso tudo o final não for tão contente, eu posso tentar outra vez.

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