junho, oito

carolina emmanuelli
Revista in-Cômoda
Published in
2 min readJan 19, 2022

Comprei lençóis novos. São melhores. Comecei a sair mais. Respirar melhor, soltar mais o ar, e consequentemente, eu mesma. Também tenho me exercitado e nunca estive tão bem. Minha melhor forma, alto desempenho. Hoje consigo correr. Cantar mais afinada. Estudar. Trabalhar. Focar. Cultivar meus amigos e temperos. Temperos e amigos. Nunca tive tanto amigo. Tanta companhia. A maternidade também mudou. Me hidrato mais. Sei mais. E não sei nada. Nunca fui tão desapegada e leve.

Contigo eu não fazia questão de lençol, nós dois parecendo barco à beira mar, sem parar, sempre acabava sem lençol. E eu não saía, tava sempre na tua volta, vivendo tua vida, esquecendo que tinha a minha própria, que devíamos ter as nossas juntas e separadas. Contigo, me faltava o ar, era de suspirar, era de sufocar; lembro de ti me ensinando a respirar pelo diafragma, lembro de mim dizendo que nunca ia conseguir. Olha só quanta coisa eu adquiri. Tudo isso sem ti.

Tu me fazia suar no mar de lençóis, me fazia subir e descer ladeira pra te ver. Se eu soubesse o que aconteceria, eu ainda não correria de ti. Eu me estreparia, descia rolando a ladeira, ralava o joelho junto com o cotovelo. E tu, subiria a montanha? Pagaria pra ver?

Tu cantava também; a música que me fez, hoje canto só. Será que um dia eu vou te ouvir tocar de novo? Espero que sim, espero que não.

Sigo uma rotina, engano o planeta, quando a noite vem, ela me percebe e sabe que tudo é vendaval dentro de mim. Tormenta. Tormento. Diário. Sabe que preciso inalar e exalar quinze mil vezes porque lembrei de ti. De novo. E de novo. E de novo. Que tu é meu ataque de pânico. Minha loucura. Contradição. Que nunca vai passar. (Será?)

Minha comida tá tão boa, e sim, eu faria sem cebola (ou ao menos picaria em pedacinhos minúsculos). Ontem lembrei da saudade que sinto de deitar sentados na cama, dividindo os lanches e assistindo qualquer coisa que tu queira. De apreciar o fato de tu nunca dormir durante os filmes. A saudade da tua disposição em levantar pra apagar a luz. De dividir o cigarro no escuro e só conseguir ver a brasa e teus dentes à luz da lua.

Queria ter cultivado teus amigos também, poderiam ter sido meus. E os meus teus. Tu ia achar engraçado. Ia dividir o kit. Ia jogar mais com ele. Almoçar com ela. Ia participar como eu participei.

Queria não ter sido tão desapegada. Queria não ter pensado por um minuto sequer que deveria mudar por ti, ao invés de por mim. Devia ter dado mais de mim a mim, e não a vocês.

Num universo paralelo, tudo tudo tudo que penso acontece.

Nunca estive tão bem. Nunca estive tão mal.

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