Lembrei de você

Emmanuel Brandão
Revista in-Cômoda
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3 min readApr 17, 2018

Fui para Fernando de Noronha e lembrei de você. Fui para o Rio de Janeiro e lembrei de você. Fui pra Canoa Quebrada e lembrei de você. Juro que já vi essa frase aplicada em várias cidades diferentes. Às vezes, muda o layout. E só. É como um fast food da lembrancinha: rápido, prático e quebra o galho. A frase pode ser aplicada em camisa, chaveiro, porta-retratos, porta-chaves e por aí vai.

Se for analisar de uma maneira mais crítica, (tem quem faça isso) o presente pelo presente não tem graça. Mas a frase maquia. A mensagem é forte e consegue transformar algo comum em especial passa um sentimento, mostra um carinho. Fica fofinho.

Nas minhas últimas férias, viajei pra Campos do Jordão e vi vários presentes desses por lá. Vale abrir um asterisco aqui para a cidade serrana que, além do clima, tudo é agradável. As comidas são deliciosas, possui completa rede hoteleira e uma cerveja bem convidativa.

Quando fiz inveja aos meus amigos que estava indo para lá, a maioria dos cervejeiros pediram Baden Baden. “Traz a de menta”. “Traz a de chocolate”. O povo finge que esqueceu que cada quilo no avião vale ouro. Se fosse atender todos os pedidos, teria que deixar minha esposa lá. Para não deixar nenhum amigo e nem ela com raiva, não trouxe para nenhum.

Meus amigos do trabalho foram menos espaçosos e pediram chocolate. É complicado enrolar uma turma que vejo e convivo todos os dias. E, convenhamos, trazer uma caixa de chocolate é infinitamente mais fácil do que trazer vários cascos de cervejas. Para garantir que os pedidos deles seriam realizados, resolveram fazer um rodízio de cobranças. Todos os dias recebia uma mensagem lembrando do pedido. Um mandava pelo WhatsApp, o outro mandava pelo Facebook e ainda ligava. Os caras não me deixam em paz.

Como a pressão era grande, a cada loja que entrava de chocolate, lembrava da turma. Para piorar, as coincidências ajudavam. O atendente de uma chocolateria possuía o mesmo nome de um amigo. Encontrava pessoas semelhantes ao meu amigo. Olhava para o chocolate e via as silhuetas do rosto do meu amigo. Percebi que estava pirando quando olhei para o espelho e vi meu amigo no reflexo. A única opção para me livrar de vez dessa assombração era comprando os benditos chocolates. E comprei muitos.

A minha tática funcionou. Depois disso, finalmente aproveitei a viagem sem ouvir as vozes, mensagens e imagens dos meus amigos. Só lembrei deles quando vi a camisa com a frase “Fui Campos do Jordão e lembrei de você.” Na mesma hora debochei da lembrancinha. Óbvio que eles iam preferir o chocolate. Os dias foram passando, minhas férias e dinheiro acabando até que voltou tudo ao normal.

No primeiro dia de trabalho, antes de dar bom dia, meus amigos já estavam cobrando o chocolate. Ainda bem que tinha comprado para a turma. Pena que esqueci no carro e quando voltei, estavam todos derretidos. Virou um “X TUDO” de chocolate. Misturou menta, maracujá, licor, castanha, morango, cupuaçu e outros sabores que nem lembro que escolhi. Resumindo uma porcaria. Tenho certeza que eles iriam preferir mil vezes a camisa.

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Emmanuel Brandão
Revista in-Cômoda

Redator, publicitário, jogador e metido a escritor. Autor do livro de crônicas: Blá Blá Blá.