Naufrágio

Transpiração
Revista in-Cômoda
Published in
2 min readAug 6, 2018

Tento em vão abrir os olhos aqui embaixo nessa escuridão sem fazer com que eles ardam. Entrou água em mim quando tentei respirar e o gosto de sal agora não sai do meu corpo.
Lembro da minha avó na cozinha curando um machucado meu que resultou em hematoma com salmoura, e enquanto vou me compreendendo no tempo, a ouço dizer: salmoura, salmoura.
Sou puro sal.
Estou no mar. Caindo.
A correnteza está forte.
O que aconteceu? O que está acontecendo? Que dia é hoje?
Jogo meus braços para cima enquanto bato meus pés, mas não o suficiente para me mover.
Sinto de memória o cheiro de cloro dos vestiários de natação, quase me acalmo mas tô sem ar, em um lugar no qual que meu corpo pesa e nada tem controle.
Não era eu quem desejava nadar no mar?
Continuo afundando.
Minha surrada calça jeans pesa sobre minha coxa e gruda, deveria ter usado saias hoje.
O sal, a água sob mim, pesam.
Minha cabeça sai da água, respiro .Meu corpo já se acostumou a essa briga com a água marinha, ele é quase todo água, mas respira para fora.
Afora a tempestade, avisto a praia.
Toca um reggae ao longe ou estou delirando, como se fosse possível ter febre em alto mar, mesmo sem sol?
Estou só, inundada, salgada e sigo resistindo.
O que acontece com os mapas que traçamos um dia?

Maria Fernanda.
foto: Hengki Koentjoro
http://www.hengki-koentjoro.com/, sequência wave

--

--