Nu.
nu,
ando no meu sonho
pelas ruas da vida
nu,
caminhando
sem medo
do olhar feio
de gente alheia,
tão nus como eu
nu,
fitando
de frente o ponto
para onde só eu
sei que vou
nu,
sorrindo
na certeza
de que só lá chego
por que vou nu
nu,
pelas pontes
sobre os canais inertes
nu,
sob o vento
ártico que não gela,
porque vou nu
nu,
na inteireza
do que sou,
na mais pura
ausência
de querer
ser algo mais
ou algo menos
que a verdade
que em mim habita
nu,
deixam-me passar
e desvanecem
os olhos hirtos
dos fatos
e das gravatas
nu,
abrem-se faces
abrem-se pasmos
abrem-se todos,
soltos,
porque vou nu
nu,
não me tocam
mas estão mais perto
nu,
aquecem-me mais hoje
do que quando levo a roupa
que eles também vestem
nu,
vou indo pela vida
directo à morte
que me espera:
nu,
com ela me deitarei
feliz,
porque pleno.
J. Fontalba
Abril de 2018