O Amor é uma Droga

Isac Chagas
Revista in-Cômoda
Published in
4 min readMay 27, 2022
Photo by L.O.B Tetteh on Unsplash

“Not another breakup
When I think of you, gotta try to be tough
Now I’m all fucked up
Call it bad luck, why does love suck?”

Love Sux” — Avril Lavigne

Detesto filas. Principalmente filas em um lugar que não conheço, em uma cidade na qual nunca estive antes. Enquanto o segurança discutia com uma garota que tentava entrar na boate sem portar documento algum, eu tentava me distrair, me concentrando em pensar no que esta noite estaria reservando para mim, na esperança de que a fila andasse a passos largos e eu pudesse, finalmente, dançar loucamente ao som deste set tão acirrante e envolvente que era possível escutar do lado externo da casa noturna.

Uma vez que já havia realizado o pagamento da entrada e já estava com a pulseira que me concedia o direito à consumação, no pulso, resolvi adentrar o estabelecimento. Enquanto guardava os meus pertences na chapelaria, percebi que um garoto loiro, mais ou menos do meu tamanho, ao passar por mim, me fitava com um mix de curiosidade e desejo no olhar. Um sorriso retraído tomou conta de sua face conforme ele se afastava, quase que como um convite, na companhia de dois amigos.

“Com certeza devo ter me enganado. Ele devia estar olhando para outra pessoa.” Pensei comigo mesmo, uma vez que não estava acostumado a receber atenção de homens realmente bonitos. Após assentir de que o garoto poderia, de fato, estar flertando com alguém que, com certeza, não era eu, resolvi me dirigir à pista de dança do piso superior. Para minha surpresa, avistei o garoto sorridente outra vez; e diferentemente de quando nos vimos pela primeira vez, no piso inferior, desta vez, o mesmo deixou com que seus amigos seguissem adiante e ele simplesmente ficou parado no meio da pista de dança, à minha espera. O seu sorriso radiante conseguia iluminar o salão com muito mais intensidade do que o globo espelhado no teto. Antes mesmo de acabar a música que estava tocando, eu já estava envolvido nos braços do misterioso rapaz, em um voluptuoso beijo.

Nos beijamos sem saber o nome um do outro e nem mesmo o timbre da voz, pois sequer houve tempo para pudéssemos trocar algumas palavras. A ausência de informações era compensada pela voracidade de nossas línguas e pela intensidade física depositada por ambos na troca de carícias. Tudo estava indo bem, até o momento em que o rapaz parou de me beijar e simplesmente decidiu virar as costas e sair andando com seus amigos, como se eu nem tivesse existido. Me senti frustrado, completamente perturbado. Um lixo.

Precisei de alguns minutos para repensar sobre o que acabara de ocorrer. Quando dei por mim, já estava colocando toda a minha vida em perspectiva: dificilmente eu conseguia a atenção de pessoas que realmente me interessavam e, nas poucas vezes que isso acontecia, rapidamente eu era descartado. Eu não era o suficiente? E se eu fosse mais alto, mais forte, mais magro, mais inclusivo, mais esteticamente apresentável e se até mesmo eu tivesse um órgão sexual maior do que a média nacional? Em outras palavras, e se eu fosse padrão? Eu estaria passando por esta situação? Pior do que não ter a resposta para estes questionamentos, era me deparar com o fato de que eu nunca tive relacionamentos consistentes, pois todos estavam terminantemente fadados ao fracasso, e os motivos era vários: iam desde o famoso ghosting ao famigerado “no momento eu não quero nada sério.”

Eu não conseguia chegar em outra conclusão que não fosse: o amor é uma droga.

Espera… O amor seria mesmo uma droga ou a minha maneira de lidar com os rapazes e de gerir as expectativas que eu criava em relação aos mesmos era que estava um tanto quanto equivocadas? Por um momento, refleti sobre os atributos positivos de cada um dos rapazes que dei o fora por motivos completamente banais, sendo que eram caras que tinham afeição genuína por mim. Por que fiz isso? Qual tipo de pessoa que eu realmente queria para a minha vida? Ainda ponderei que tentar se encaixar é algo completamente deprimente, e que eu sou belo à minha maneira e que, se um dia eu sentir a necessidade de promover mudanças internas e externas, devo fazer isso unica e exclusivamente por mim, e não por terceiros. Minha existência e vitalidade não dependiam de uma eventual troca de saliva.

Com a minha autoestima completamente restaurada, e com a certeza de que a verdadeira droga não era o amor ou a paixão, mas sim, o azar de encontrar pessoas completamente mal resolvidas que, inevitavelmente, mais cedo ou mais tarde, irão projetar todo seu desasseio emocional em você; resolvi pegar mais uma água e dançar na minha própria companhia, sem a necessidade de esperar, inutilmente, que outro sorriso iluminasse a minha noite, que não fosse o meu.

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Isac Chagas
Revista in-Cômoda

Decidi revisitar cada uma das eras da minha vida e irei documentar cada etapa desta minha jornada através dos meus textos. Cê me acompanha nesta aventura? :)