Só não quero meu filho poeta

Poeta Rafa Ribeiro
Revista in-Cômoda
Published in
2 min readMay 16, 2019

Se meu filho escrever poesia, espero que saiba que isso não vem de graça, que mesmo que seja pra fazer alguém sorrir, talvez sua escrita venha repleta de choro. Mesmo quando escreva carta de amor, cada linha carrega um tanto de dor e não importa o quanto pratique, vai sempre encarar a folha de papel como se fosse a primeira vez.

Ela te olha nos olhos, intimida, desafia a dar o primeiro passo, mas também é ela quem desliza fácil sua caneta, quem empurra uma palavra atrás da outra depois da ladeira que solta na sua mente, é ali que vai achar se encontrar, e dessa vez eu digo achar, porque na verdade nunca acha nada. Ela te vicia, te faz buscar de novo a mesma sensação no dia seguinte, ela te espia, te planta sementes que fazem brotar o tempo todo, essa é a poesia.

Se ele decidir ser poeta , com certeza não vai ser pelo pai, não desejo isso ao meu pior inimigo, que no caso sou eu mesmo, não vou ser empurrão pro meu filho, espero que saiba ler e escrever, mas sem precisar colocar em código verso. Que seja lá quem ler, não pense que está sofrendo por dentro, que não fiquem preocupados demais, ou suspirando achando ser a paixão de alguém que só queria falar sobre o amor, que ele saiba ser direto quando preciso, que jogue na meia-esquerda e seja camisa 10 do nosso tricolor, assim acho que não vai sobrar muito tempo pra pensar em poesia.

Meu filho eu quero forte, quero que seja exemplo por ser decidido, não sei direito a quem vai puxar, mas que seja isso, somente isso. Que seja o espelho da mãe.

Eu só espero que respire um pouco da poesia me lendo depois que eu for embora desse lugar, não quero discurso bonito, não quero nenhum verso de improviso, eu quero meu filho sorrindo mesmo no meu velório. Eu quero uma roda de samba, ele batendo o pandeiro, eu quero pensar no meu filho, mesmo ainda não tendo.

Só não quero meu filho poeta, isso eu não quero mesmo.

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