Sambando em chamas
Um dia, desatei meu afeto em versos de poesia
O meu penar, embebido de ilusões,
Em tom menor vertia as canções
De um desvairado que corria pela rua, sem saber o que fazia
Com o peito sambando em chamas
Cantei Cartola pra não sucumbir
Sem afago, cigarro ou esperança
Guardei rascunho no bolso e me perdi
Como tu em outras tramas
Nas entrelinhas do não dito
O escrito sumiu num grito
Fugiu intrincado como valsa cigana
Na campana de uma viela
Beco, aresta ou favela
Não se sabe
Fez morada nas ladeiras ou num suspiro que arde quando a saudade inflama
Foi encontrado amassado,
sujo, torto, amarelado
Tal qual o gosto da madrugada que passara
Amparado pela alvorada, um bêbado achou os versos
Lembrou de seus afetos
Mas riu com desdém e fez piada, sem saber do que falava
Jogou as palavras ao mar como se fosse um arpão
Inquieto, louco e controverso, o verso se rebelou
A liberdade, então, aspirou
Feito preto no grilhão
Meu verso fugiu de mim por ser de todos
Dos fracos, pueris
Dos quentes e dos frios
Dos bohemios, dos vadios
Pra não dizer dos tolos
Feito andaluz, dispara feito bala
Invade o sótão e a sala
Alicia a malícia e descompassa o coração
A dona Razão se viu encantada
Pela fé embalsamada
E o ateu, nem percebeu, mas perdeu-se em oração
Os que pensam que são fortes
Na verdade só têm sorte
Pois o sol na calçada afia a sua tez
E aquele que com ele não tem se deparado
Aguarda, alegre e enganado
Feito rebanho no pasto
Chegar a sua vez
15.06.2023
#Poesia Brasileira #Poetas da Bohemia