Rua da Ponte
Finalmente desceu do ônibus para seguir o resto do caminho com suas próprias pernas. É inverno no Grande Recife.
— Estou com tantas saudades dele, Eunice… — Disse para a amiga, finalizando a conversa que iniciara no ônibus.
A paisagem que construía a cidade, a chuva, o algodonado de nuvens cheias à espera do momento de molhar, evidentemente não faria uma situação adequada para um encontro. Mas Rachel não segurara o coração, como as pontes que não agarram o rio que por debaixo delas corre, levando as mazelas da cidade.
Ao chegar no tal Café, bateu os sapatos no ar e fechou o guarda-chuva que continuou pingando até sentar-se na mesa próxima à janela. As mãos ainda trêmulas do frio úmido das ruas acompanhavam as batidas do jazz ao fundo. João Donato, creio eu.
— Caramba, como você se molhou. — Disse Conrado, chegando pelas costas de Rachel totalmente seco.
Rachel embeveceu-se. Não imaginava que seu amigo de ensino médio tinha crescido tanto. Os ombros tinham se espraiado. “Deve estar fazendo academia”, pensou admirada.
Sentou-se.
— E aí, Raq, como você tá? O que anda fazendo?
— Ah… não tenho feito muita coisa não, Conradinho…Minha família vai bem. Moramos no mesmo lugar e trabalho perto.
— Olha, vou te falar… Depois que saí daquele colégio, minha vida não para. Mais de trinta reuniões por dia e muitas coisas para administrar, cálculos a fazer. Mas amo o que faço.
A intensidade do falar de Conrado foi tamanha. Rachel lembrou-se do que sentia por ele no colegial. “Eram como iguais”, afirmava ela no seu pensar adolescente. “Tudo em nós era parecido: os filmes, os discos, a farda…”
— Lembra de quando fomos para o baile verde?
— Oh, se lembro daquele baile… Eu e Jorgito fizemos a farra. Nem lembro de quantas garotas tinham em cima de nós. Só lembro do meu pulôver verde, tenho até hoje.
Se não bastasse a chuva torrencial que foi vítima, Rachel sentiu-se como se tivesse tomado uma ducha de água gelada nas costas. Ela era o par de Conrado no baile.
— É… eu também lembro dele. — Disse, forçando saudade.
Nesse instante, Rachel imaginou-se só. Se perguntava o que estava fazendo ali ao passo que se indagava se estava realmente ali.
— Parece que mudamos muito, não acha? — Ele disse, dobrando as mangas da camisa.
— Sim. Você está bem mais bonito, em forma…
— Que nada… mas tenho que admitir: meus dias estão cada vez mais produtivos.
Após terminarem o café, foram à ponte próxima à parada do ônibus.
Rachel já estava atrasada para voltar ao Caixa 08 do Supermercado que trabalhava, e Conrado atendia inúmeras ligações a respeito de uma filial que iria abrir.
Saíram da ponte. Ambos seguiam, em lados opostos.
Guilherme Cabral nasceu em Arcoverde-PE mas mora em Recife-PE. 17 anos, cristão batista. Tem grande paixão pela literatura, sobretudo brasileira, cujos nomes destaca Machado de Assis e Lygia Fagundes Telles. Meu pai (in memorian) era músico (pianista) e minha mãe é professora.