editorial do fim do mundo: Maquiavel — novembro-dezembro/2016

Retomando o governo Temer; Renato Rovai e a esquerda hoje; Ascensão e falácias do fascismo; Crise da esquerda e alternativas.

Monica Marques
revista Maquiavel
4 min readDec 13, 2016

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O banquete da hiprocrisia — “Uma grande questão social: saber se a parede de vidro protegerá sempre o festim dos animais maravilhosos e se a gente obscura que olha avidamente de dentro da noite não virá colhê-los em seu aquário e devorá-los.” Marcel Proust — À sombra das moças em flor — Via André Paes Leme / Foto: Iberê Carvalho

Esta edição é sem dúvida uma expressão do momento político atual, marcado pela crise da esquerda, pela ascensão de grupos de extrema-direita e pela confusão institucional generalizada em Brasília. As perspectivas desse contexto são vistas por vários ângulos — não só pelo que pode se desenvolver a partir dele, como a partir do que ele se origina e da necessidade de combater o que de pernicioso é produzido por alguns setores.

A uma velocidade espantosa, os direitos de milhares de brasileiros são postos em liquidação. Numa daquelas tradicionais palhaçadas, que fazem qualquer um corar de vergonha, hoje (13/12), em votação no senado, foi aprovada a PEC 55 — a PEC do Teto de Gastos ou a PEC do Fim do Mundo. Passando por cima do projeto eleito pelos brasileiros e das pesquisas que indicavam pelo menos 60% de rejeição à PEC (datafolha e senado), e que segundo a ONU irá condenar toda uma geração sem a continuidade das políticas sociais, o governo de Temer triunfa ao mesmo tempo em que seu nome é citado 42 vezes na delação da Odebrecht. Num texto cínico, provavelmente pago, a Folha diz que a PEC 55 sozinha não tira o Brasil da recessão, a menos, é claro, que seja conjugada a um desmonte da previdência. O empresariado conclama a revisão das leis trabalhistas, pois a CLT brasileira é "inviável". O que mais levarão de nós? Deixaremos?

Um panorama desse cenário aparece em “O Fim do Ilusionismo”, de Nikolas Spagnol, que apresenta um resumo crítico dos primeiros seis meses do governo Temer e retoma suas medidas mais polêmicas, incluindo a PEC 55 e a reforma da previdência. Ele explica e questiona a eficiência dessas medidas e se de fato são os gastos primários (educação, saúde e previdência) que precisam ser revistos.

Também no sentido de uma avaliação conjuntural está “Quais são as possibilidades do fascismo no Brasil Hoje?”, de Rafael Viana. Frente aos discursos que falam de recrudescência das forças de extrema-direita no mundo, o texto especula sobre suas condições de enraizamento no país. O autor delimita as características do fascismo, ultrapassando a utilização panfletária do termo. Toda direita é fascista? Há riscos reais para Brasil? Quantos requisitos já cumprimos? Apenas adianto que algumas semelhanças são assustadoras.

Uma revista de política também deve combater a desinformação. É o que faz Gilberto Miranda Junior em “Socialismo, Nazismo, Direita, Esquerda”, artigo que desmistifica as artimanhas de certa direita que tenta pôr o nazismo na conta da esquerda. Ele não precisa ir longe, basta trazer o próprio discurso de seus representantes. No caso, as falas de um dos maiores “liberais”: Ludwig von Mises. Quem de fato flerta com o fascismo?

Já a situação atual da esquerda transparece em três matérias. Na série Esquerda Hoje, eu e Duanne Ribeiro falamos com Renato Rovai, do portal Forúm. O jornalista comentou os impasses que paralisaram a esquerda e quais os caminhos possíveis para os grupos que se enquadram nessa categoria, além de criticar o discurso anticorrupção.

Lilian Koritiak traduz “A Esquerda da América Está Em Crise?”, de Jared Abott, que traz um diagnóstico da esquerda na América Latina, a partir de visão de fora, discutindo as suas limitações, falhas e desafios. O que é preciso mudar?

Concluindo esse bloco, na série Devires o movimento Política Econômica da Maioria — Poema) se apresenta e fala sobre a situação político-econômica atual e suas origens para além da superfície. Não adianta combater os efeitos se não eliminamos a causa. Há outras saídas para crise econômica que não seja a austeridade?

A Maquiavel se propõe a ser uma revista plural, que traga diversas perspectivas políticas (desde que coerentes, é claro), a fim de proporcionar um debate amplo sobre política, como escreveu o Duanne no último editorial. No entanto, o último e único direitista da revista, o João, viu-se obrigado a se tornar de esquerda, visto que não poderia mais se identificar com a direita depois que esta tomou a feição que tomou. Isso está documentado no primeiro podcast da revista. Nele, conversamos sobre a eleição de Donald Trump, os percalços da esquerda no Brasil e ainda arriscamos alguma futurologia quanto ao Brasil. Participam do podcast eu, Duanne, João, Nikolas e Gilberto.

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Monica Marques é poeta e formada em filosofia pela Universidade de São Paulo (USP). Estuda filosofia contemporânea. Tem poemas publicados em revistas literárias. Escreve em instanteinacabado.wordpress.com e facebook.com/instanteinacabado. É parte da comissão editorial da Maquiavel.

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