Easy(2016)

Um novo olhar sobre os Millennials

Joel Schutz
Revista Ponga
7 min readSep 29, 2016

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Title Card de Easy(2016)

Nesses últimos meses a Netflix lançou algumas séries e especiais que ninguém esperava mas que acabaram surpreendendo. A mais nova queridinha do público foi a Stranger Things, mas Easy veio pra novamente nos impressionar. Ela chega sem quase nenhuma divulgação, eu mesmo só fui assistir porque o Netflix a indicou baseada no meu histórico. Easy é uma série em 8 episódios, cada um com sua própria história, envolvendo diversos personagens em Chicago. Não é muito mais que isso, mas não me entenda mal, é uma ótima série.

Uma produção Netflix

Fã ou não do programa de Originals da Netflix, acho que todos vamos concordar que a forma como ela produz seus filmes, séries e especiais é bem diferente das outras redes de televisão. Podemos inclusive perceber um certo modelo de construções dessas obras: Artistas talentosos e pouco famosos em histórias que podem ser pretensiosas, bem escolhidas ou totalmente inimagináveis.

Easy não foge desse modelo, traz um elenco de atores não tão famosos, mas que surpreendem com um boa atuação. Os próprios personagens impressionam, nenhum deles consegue ser encaixado em nossos clássicos esteriótipos. As histórias raramente seguem um caminho previsível, canto tudo parece ir bem, algo de muito errado acontece, quando tudo parece que vai dar errado, tudo se resolve. Não há grandes espaços para um determinismo em Easy. A própria ligação entre os personagens tem um objetivo muito diferente de “Magnólia” ou “Sense8”, onde há uma ligação mística que vai além dos personagens. Aqui o que liga as pessoas é a própria cidade, os personagens não dividem uma ligação do destinos, mas sentimentos, medos e ressalvas sobre a vida. Estão todos no mesmo barco da vida, totalmente a deriva, buscando entender como lidar com as ondas que os empurram hora para um lado, hora para o outro.

Easy(2016) de Joe Swanberg

Inspirado em fatos reais

Embora a história seja ficcional, escrita pelo próprio Joe Swanberg, mas a série inteira é marcada por um senso de realidade. Todas as cenas soam como um contexto cotidiano, uma história que poderia acontecer na vida de qualquer um de nós ou nossos conhecidos.

Isso é mais que um roteiro bem pensado, mas também um bom trabalho de improviso dos atores. Nesse processo a personalidade e imagem dos personagem é construída ali, no entrosamento dos atores e como eles se encontram ali.

Veja por exemplo o episódio 6, onde Orlando Bloom e Malin Åkerman são um casal com um bebe que buscam uma mulher para um menage, a atriz escalada para interpretar essa mulher é a fofíssima da Kate Micucci. Bloom e Åkerman são o típico “casal magia”, lindos, bem empregados, apaixonados e perfeitos, no mínimo essa é a impressão que seus personagens passam e os atores combinam muito bem. Já Kate a personagem de Kate é muito diferente deles, ela é mais jovem, solteira, com um trabalho menos estável, casa alugada e não muito sexual. Essa personagem não só combina muito bem com ela, mas parece ter sido montado por ela mesma, visto que além de demonstrar esses esteriótipos também os critica. Ela se mostra insegura, mas também não reprime essa sua sexualidade.

Easy(2016) de Joe Swanberg

Esse improviso também é bastante útil em uma série em que o sexo é muito presente. As cenas rolam com mais naturalidade, os atores constroem ao longo das gravações essa relação entre os personagens e o sexo surge como mais uma cena improvisada, que uma cena dramatica do filme.

Sexo implícito está por fora

Tivemos uma certa polémica há alguns anos atrás quando Lars Von Trier começou a ser distribuído internacionalmente quanto as suas cenas de sexo. Sempre expondo bastante do corpo e no caso do Ninfomaníaca, colocou o sexo como pivô da narrativa de uma forma que grande público não estava acostumado.

Easy traz o sexo como ponto central de vários episódios e é tudo bastante explicito, mas em uma concepção diferente de sexo. O sexo entendido como contato genital não é mostrado, porém nenhuma cena de sexo se resume a isso em Easy. A representação do ato sexual, a experimentação, a experiência, tudo isso é mostrado e nos põem em uma perspectiva bastante diferente na hora olhar essas cenas. Até mesmo pela diversidade entre elas, há sexo entre um jovem casal de lésbicas, entre um casal mais velho, com dois filhos e um casal de pais de primeira viajem que decidem experimentar algo novo na relação. Fica claro que para seus produtores, sexo vai muito além da definição biológica da coisa.

Easy(2016) de Joe Swanberg

Joe Swanberg já criou outras histórias nesse estilo, “Autoerotic” de 2011 é um filme que traz uma proposta parecido com Easy, mas com outra execução e outra história. Mas esse é só um exemplo.

Uma série para todos

Em entrevista Swanberg define sua série como algo para todos, e de fato a representatividade nesse filme é ampla. Personagens diversos, em narrativas diversas, de lugares diversos. Há uma presença grande de personagens envolvidos na industria cultura, mas não apenas. Um jovem casal latino de classe média alta, um autor decadente em um relacionamento aberto, dois irmãos apaixonados por cerveja caseira. Todos esses personagens, de vidas e trajetórias diferentes conseguem alcançar praticamente qualquer público, de identificação mesmo e quebrando esteriótipos.

Conservadores repetem a exaustão que o mundo está muito chato e que é muito difícil fazer algo que seja inclusivo, porque blá, blá, blá. Easy, como outras obras que vemos sendo produzidas de 2010 pra cá(majoritariamente) provam que é sim possível fazer um trabalho inclusivo, respeito a diversidade, que quebre esteriótipos, mas que é divertido, interessante e nem um pouco chato. As séries da Netflix costumam ter essa pegada e vão cada vez mais a fundo.

Easy(2016) de Joe Swanberg

Quem assistiu a temporada inteira percebeu que a ligação entre os personagens ainda é muito sutil nos últimos episódios, alguns ainda continuam soltos. Mas vale lembrar que teremos mais temporadas e esses laços serão mais evidenciados e as histórias ainda mais expandidas. Isso abre espaço para ainda mais diversidade. Como uma série muito atual, que tem uma visão bastante honesta sobre o mundo ao redor.

Somos todos geração y

Eu gosto de classificar o nosso tempo presente como um momento de desconstrução de uma sociedade que não nos pertence. Sociedade essa que é praticamente a mesma desde o XIX. Na grande mídia e cenarios intelectuais esse paradigma é colocado como uma ideologia de uma geração, a tal geração y, ou millennials, como se os mais velhos pensassem de outra forma ou vivessem por outra lógica. Easy nos mostra que isso é pura besteira, todos vivem o momento histórico juntos, não porque você é jovem que vai se apegar fortemente ao seu celular e selfies, nem que vai ter grandes dificuldades em entender relacionamentos abertos por ser mais velho. Todos vivem juntos esse momento de repensar a sociedade.

Easy(2016) de Joe Swanberg

Nesse movimento, trabalhos como Easy, Love e Master of None tem um papel importante de expor essas questão do nosso tempo presente. Se não ficamos acreditando na velha história de “no meu tempo era melhor”, que a própria Time Magazine caiu recentemente. É muito fácil negar a mudança do mundo, mas estamos há quase 100 anos sem uma grande mudança na sociedade e negar que o momento de remodelar a sociedade chegou é se fechar numa bolha. Espero ver cada vez mais trabalhos como estes nos mais diversos formatos da arte.

Concluindo, Easy é uma série bastante simples, sem grandes pretensões ou alegorias, mas que é muito honesto. É uma série que lança um olhar sobre o nosso tempo presente que é muito necessários de ser evidenciado. Joe Swanberg produz essa série com um grande atenção aos detalhes, negando uma narração padrão, ele se dá ao luxo de diversificar narrativas, personagens, atores, contextos e experiências. Aviso a quem se animou a assistir, não criem grandes expectativas, meu elogio a série é está muito mais no que ela representa do que nas histórias contadas ali. Isso não é necessariamente ruim, devemos lembrar que mais temporadas virão, tudo será mais trabalhados. Olhar toda a série como apenas esses 8 episódios que se assistem em um sábado é perder muito da riqueza da série, tente perceber o quanto essa série se difere do que normalmente assiste na televisão e o quanto ela é parecida com a sua vida e dos que estão ao seu redor.

Se não ver similaridades entre a série e sua vida, acho que está na hora de estourar essa bolha que você vive.

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Joel Schutz
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Desenvolvedor Python; Metido a entendedor; Cronista mal-informado e cozinheiro nas horas vagas.