Ganham menos e pagam mais: Os desafios de quem sobrevive no Brasil

Maria Tereza Ribeiro
Revista Provisória
5 min readJun 16, 2021

A cada dia que passa e a pandemia da Covid-19 ainda é uma realidade, a vida das famílias brasileiras das classes baixa e média têm ficado mais caras. A alta do desemprego, o aumento da inflação e a dificuldade de recolocação no mercado de trabalho são apenas alguns fatores que têm construído esse duro cenário para milhões de pessoas. O auxílio emergencial, fornecido pelo Governo Federal durante esse período, é pouco frente ao custo elevado de recursos básicos como energia elétrica e água e esgoto, que nos últimos meses sofreram reajustes consideráveis. Sem perspectiva de melhora, ao menos nos próximos meses, a tendência é de agravamento de uma condição que já ultrapassou o limite do aceitável.

Pessoas fazem fila para sacarem o auxílio emergencial nas agências da Caixa — Imagem: Roberto Parizotti/Fotos Públicas

Para exemplificar apenas uma das situações vividas por muitos brasileiros nesta pandemia, uma pessoa que vive sozinha e cumpre os requisitos necessários para receber a ajuda financeira do Governo, recebe, por mês, R$150,00. Na região Centro-Oeste do país, hoje, um botijão de gás de cozinha pode chegar a custar R$125,00, o que representa 83,3% do valor gasto em um único item, e com o pouco que sobra dessa quantia, a pessoa ainda tem que comprar alimento, produtos de higiene básica, pagar contas e cobrir outras despesas. Pode-se dizer que viver no Brasil passou a ser um luxo que, hoje, uma parcela grande da população não consegue ter.

Entre os principais produtos que compõem a cesta básica, atualmente custando um mínimo de 40 reais, o óleo foi um dos que passaram a pesar mais no bolso do consumidor. Em fevereiro do ano passado, uma garrafa de 900ml -soja- era vendida nos supermercados a um preço médio de R$3,80. Quinze meses depois, o mesmo item passou a ser comercializado nas prateleiras dos estabelecimentos pelo valor de R$7,45, representando um aumento de aproximadamente 88% em pouco mais de um ano. De acordo com economistas, a chance de uma redução do preço do óleo nos próximos meses é muito pequena. Com o mercado internacional aquecido, demandando mais do que a produção nacional tem a oferecer, a tendência é que os preços continuem subindo em 2021.

Pagando quase o dobro pelo óleo, comerciantes temem perdem clientes pelo aumento do preço dos produtos — Imagem: Reprodução

Encontrar alternativas nos supermercados para driblar o aumento do custo da alimentação no Brasil se tornou uma prática comum entre milhares de famílias, que lutam diariamente para conseguir o suficiente para passar o mês. Segundo os dados divulgados, em maio, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE, o 1º trimestre de 2021 apresentou a pior taxa de desemprego da série histórica iniciada no ano de 2012: 14,7%. Apesar de estar dentro do previsto por especialistas, a velocidade com que novos patamares estão sendo alcançados é preocupante, uma vez que muitas empresas diminuíram suas equipes na pandemia e não pretendem contratar na volta à normalidade. Com menos oferta no mercado de trabalho, mais difícil será para retomar o crescimento econômico nacional.

Dentro desse contexto, o Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas, FGV Social, realizou um levantamento que apontou a classe dos mais pobres como a mais afetada pelo desemprego durante a pandemia da Covid-19, acarretando em um aumento considerável na desigualdade de renda, que alcançou um valor histórico de 0,674. Esse coeficiente, denominado de Índice de Gini, calcula o grau de concentração de renda em um determinado grupo comparando os 20% mais ricos com os 20% mais pobres. Numericamente, ele varia de zero a um, com o zero representando a igualdade e o um a concentração total. Outro dado que contribui para tal resultado é a queda da renda média do trabalho, que para a fatia dos 50% mais pobres foi de 20,81%.

Com o Mercado de Trabalho reduzido pela pandemia, as pessoas sofrem para conseguirem um emprego — Imagem: Reprodução/Agência Sindical

Com menos dinheiro entrando por mês, menor fica o orçamento dessas famílias para arcar com despesas fixas como energia e água, que sofreram reajustes e tendem a continuar aumentando nos próximos meses por conta da atual crise hídrica que afeta o Brasil. Os reservatórios vazios impedem que haja a produção de eletricidade através das usinas hidrelétricas, cujo custo é inferior ao observado nas termoelétricas. Em razão da ausência de chuvas, que segundo o Governo é a pior estiagem vivida pelo país em 91 anos, e a necessidade de utilização das térmicas, estima-se que a tarifa por 100 Kwh sofra um acréscimo de mais de 20%. Hoje, esse valor é de R$6,24, portanto, caso o aumento se confirme dentro das próximas semanas a tarifa ultrapassará a casa dos R$7,00 na bandeira vermelha 2.

Todos esses pequenos reajustes feitos em diversos setores da economia, quando somados resultam em um custo de vida maior, que, infelizmente, não é acompanhado por um aumento na renda mensal de uma família, que gastará mais para comprar os mesmos produtos. De acordo com dados divulgados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, IPEA, a inflação para aqueles com renda familiar inferior a R$1650,50 saiu de 0,45% para 0,92% em apenas um mês -entre abril e maio deste ano-, enquanto entre os ricos, com renda acima dos R$16.000,00, a taxa variou de 0,23% para 0,49%. Assim, é possível afirmar que as pessoas que ganham menos sentem praticamente o dobro do aumento dos preços de serviços e produtos.

Rua 25 de Março lotada apesar da pandemia da Covid-19 — Imagem: Eduardo Frazão/Exame

Além dos desafios financeiros que os brasileiros das classes mais baixas têm de enfrentar para sobreviverem no país, existe ainda a pandemia da Covid-19, que vem atingindo níveis extremamente preocupantes quando reduzida a essa parcela da população. Sem o privilégio de poder continuar trabalhando em casa e tendo que sair às ruas para conseguir o sustento do mês, a exposição e o risco de contaminação para esse grupo de pessoas cresce, porém pouco se faz para tentar reverter essa situação. O auxílio emergencial, que segundo o Ministro da Economia, Paulo Guedes, será prorrogado até outubro, em nada faz efeito quando a população que o recebe é justamente a mais atingida pelos constantes aumentos nos preços. Uma solução se faz urgente, caso contrário a sobrevivência passará a ser o termo utilizado para definir a vida no Brasil.

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Maria Tereza Ribeiro
Revista Provisória

Estudante de jornalismo apaixonada pelo mundo da comunicação e, pelo esportes e suas histórias!