A Beleza como mera Subjetividade
Ou paradoxo entre a percepção e a ilusão
Marina era uma pessoa e, como qualquer outra pessoa, tinha as suas próprias inseguranças.
Hoje também seria apenas mais um dia, não fosse pelo fato de que ela tinha sido rejeitada.
Jazia ali, sozinha em um canto do parque, sentada e em prantos. Mordia os lábios para fazer menos barulho, enquanto soluçava e encharcava as mangas da sua blusa.
“Você é feia”.
Nunca mais iria se esquecer daquelas palavras, ou era o que pensava enquanto se dilacerava internamente.
Durante boa parte das nossas vidas, somos apenas normais.
Eu não me lembro de nenhuma pessoa feia quando era criança. Claro, a gente sempre acaba gostando de alguém e, por algum motivo, essa pessoa se torna mais bela.
Entretanto, as outras crianças são apenas… Crianças. São amigos e amigas, pessoas como nós, mas que não são nós mesmos. Algumas mais legais e outras um pouco chatas, claro, mas a beleza nem é um critério tão importante assim.
Marina chorava tanto que mal percebia que outra pessoa já estava ao seu lado e tomou um susto ao ser tocada no ombro.
Ela olhou para cima e viu que era um homem, mas que havia algo estranho em seus olhos. Demorou para entender que era cego.
De alguma forma, sentiu que podia se abrir e explicar a causa da sua tristeza.
Contou do João Pedro, da sua declaração e da sua rejeição. Contou que era feia enquanto misturava cada duas palavras com um soluço.
E então o homem começou a rir. Não de escárnio, mas com um riso que passava certo carinho, até que começou a falar.
“Olhe mocinha, você não é feia. Na verdade você é linda e pode até parecer estranho ouvir isso de um cego, mas quando você não enxerga, um outro mundo se abre. Já pensou nisso? O que é ser bonito? Eu nasci assim, cego, e nunca entendi o que as pessoas queriam dizer.
Eu aprecio a voz das pessoas e o toque delas. Aprecio o carinho e as palavras que trocamos. Aprecio as atitudes e a convivência. Afinal, quem é mais cego? As pessoas se prendem em cada coisa engraçada.
Qual a diferença de uma pessoa magra e gorda? Qual a diferença da marca de um carro? Qual a diferença da roupa que você usa?
Um sentido a mais e vocês vivem um mundo de ilusões, porque pra mim nada disso existe. Nada disso importa.
O mundo todo é relativo e subjetivo. Depende do que você quer, do que você almeja e do que você valoriza.
E é você quem controla isso, porque não depende do que está lá fora.
Depende do que está aí dentro.”
Com isso, se levantou e foi embora, enquanto Marina ficou ainda sentada por um bom tempo.
Já não estava mais soluçando, mas ficou de olhos fechados por um tempo.
Se sentia feliz, não porque era bonita ou feia, mas porque simplesmente era Marina.