A cocaína não é a química que você procura
Há tempos que escrevo sobre o ponto de vista de quem possui a Maldição de Aquiles: próximo das drogas e violências, mas protegido das consequências e os impactos diários dela na vida pessoal. Ao menos era o que acreditava até sentir a tristeza inconfundível de quem busca a felicidade em pinos de cocaína.
Esse texto não é de um usuário de pó, branca, raio ou qualquer outro sinônimo do produto obtido das folhas de coca, mas sim, de um amigo e parente que carrega a culpa de ver aquelas cápsulas vazias. E por isso, é importante registrar que a cocaína não é a química que você procura.
Em tempos que a romantização de entorpecentes e substâncias prejudiciais à saúde é um discurso frequente em diversas esferas da sociedade, não consigo deixar de lado a sensação de impotência que sinto quando vejo aquele olhar vidrado e acelerado de familiares e amigos.
Nas palavras deles, a presença das linhas brancas — e que aqui não estamos falando da marca Adidas — traz sensações ótimas como a de prazer, autoconfiança, adrenalina, poder e outras paradas que só quem busca o significado de pertencimento ao local ou grupo social que está inserido compreende.
Para quem atua na área de saúde, cuidados e tratamento de dependentes químicos, como a psicóloga Camila Cabral, de 27 anos, a substância encoraja pensamentos e sensações de grandiosidade, euforia e bem-estar. Aumentando e facilitando a atenção do usuário com os estímulos externos e seus reflexos.
Além destes efeitos que na primeira impressão soam como positivos, a cocaína prejudica a capacidade de raciocinar e tomar decisões, diminui a necessidade de sono e de apetite, possui alto potencial de gerar paranoia, delírios e alucinações nos usuários que já estão em um nível desenvolvido de perda da realidade e potencializa a desconfiança, agressividade e irritabilidade nos mesmos.
Para quem escreve esse texto, é mais do que necessário o debate sério a respeito do uso, dos efeitos e das mudanças que ela traz para o cotidiano do usuário porque vejo personalidades sendo alteradas, rostos adquirindo uma finura parecida com a das carreiras que são inaladas, famílias preenchidas pelo desespero e outras sensações que só quem passa sabe.