A eternidade é pouco

A minha fé reside nesse momento de amor que é a nossa existência — e tenho para mim que não é dessa vida a nossa conexão.

Guilherme Aniceto
Revista Subjetiva

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eu e Fábio. ❤

Às vezes, penso que você fica em estado de transe, absorto e com os ouvidos bloqueados. Eu fico observando o seu modo de agir, diante de coisas às quais você se foca no dia-a-dia, como quando você fatia cenouras, trabalha a madeira ou edita as suas fotografias. Você parece um pianista tocando sua obra-prima, mesmo na monotonia da cozinha ou no árduo trabalho de esmerilhar imagens e móveis.

Eu acho engraçado que nesses momentos nós não conversamos, porque temos o diálogo como pilar do nosso convívio. Você está tão focado e eu não quero atrapalhar. Eu fico só olhando você fazer essas coisas. Sou seu espectador, com o queixo caído e as caraminholas rolando na cabeça: O que será que ele está pensando agora? Como ele consegue ficar tão focado a ponto de desligar-se? Será que está mesmo desligado?

Eu nunca lhe falei nada disso. Não poderia falar. São coisas minhas e sua cabeça parece funcionar de forma diferente, e essa é uma das muita razões pelas quais eu amo você com todo o meu coração. Eu não poderia amar tanto a uma pessoa que seja monótona e displicentemente morna.

Você é quentura, do princípio ao fim. Confesso que eu tenho muito medo de queimar as minhas mãos ao tocar a sua nuca, ou ao envolver seus dedos com os meus. Um medo é sempre algo irracional. Racionalmente, se eu fosse pensar em tudo que eu fizesse em relação a você, provavelmente eu não lhe amaria tanto. Felizmente, não me importa a racionalidade das coisas quando trata-se de amor. Amor é todo emoção em mim.

E você… bem, você é um turbilhão. Você conhece tudo de mim e, mesmo nós dois estando juntos há tanto tempo, eu conheço bem pouco de você. As coisas vão se revelando aos poucos, à medida em que você se deixa conhecer. Acredito que todo esse seu mistério nunca terá fim. E agradeço por isso. Eu sou curioso por natureza, e essa minha curiosidade é um elemento essencial do meu interesse pelas coisas e pelas pessoas.

Tenho curiosidade por você. Você me instiga. Você parece fluido como a água na peneira. Eu fico debaixo, tentando colher algumas gotas pelas fendas. É difícil ter alguma certeza sobre as suas preferências e gostos. Juro para você que eu tento ser a melhor companhia, que eu procuro sempre vislumbrar alguma forma de surpreender você, mas ainda lhe tenho imprevisível.

Sabe, pensando bem, talvez seja esse contraste o que nos faça tão sintonizados. Eu, translúcido. Você, misterioso. Eu, introvertido porém transparente. Você, extrovertido porém incógnito. Parece-me uma combinação perfeita para uma explosão de descobertas e contradições que, invariavelmente, levam a um nível superior de intimidade.

Sigo tentando decifrar você, e observando, enquanto você vai me devorando involuntariamente, com as descobertas que me fazem conectar-me ao seu mundo de modo inquebrável. A eternidade é pouco. Já não me importa se existem o “reino dos céus” ou o “mármore do inferno”. Eu quero o mistério de algo que eu não sei o nome ainda, e acho que ser humano algum conhece porque não viveu para registrar. A minha fé reside nesse momento de amor que é a nossa existência — e tenho para mim que não é dessa vida a nossa conexão.

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Guilherme Aniceto
Revista Subjetiva

Escritor. LGBTQIAP+ (ele/dele). Poeta no portal Fazia Poesia. Contato pelo instagram @guilhermeaniceto ou pelo e-mail: guilhermefaniceto@gmail.com