A trajetória de um anti-herói do cotidiano em “Raul”, De Maio

Lucas Machado
Revista Subjetiva
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4 min readMay 11, 2018

Rafa é um jovem como a maioria de nós, possui muitos sonhos, ambições, desejos e projetos para um futuro tranquilo e calmo à beira da praia. Porém, existem alguns fatores que impede ele e toda a “maioria” de alcançar esses objetivos, são esses fatores: a falta de dignidade humana; a pobreza e a miséria em larga escala; o não investimento em direitos básicos garantidos — na teoria — pela lei; dentre muitos outros que fazem parte do cotidiano de um jovem de periferia no Brasil.

“Umas das minhas primeiras imagens de lá com oito anos de idade é de uma pessoa morta porque jogaram um botijão da janela, um botijão”

A infância cruel vivida pelo nosso protagonista, convivendo com a violência e, ao mesmo tempo, a distância dos desejos de consumo estimulados pela mídia, fez com que Rafa recorresse ao crime para conseguir realizar todos esses muitos sonhos que todo jovem possui. Começou com pequenos furtos, assaltou a mão armada, roubou carros e chegou ao “ápice” de sua carreira como criminoso: o chamado “Raul”, que, na linguagem comum, seria basicamente indivíduos que praticam o golpe do cartão de crédito ou débito, ludibriando pessoas nas filas dos bancos, via falso telemarketing, dentre outros meios.

Imagem: Divulgação/Editora Elefante

Ao viver nesse meio, Rafa foi conhecendo cada vez mais criminosos, começando pelo seu amigo Deda e terminando com grandes chefes de facções pelas prisões a qual o mesmo passou muitas vezes durante sua trajetória. Porém, o que ele não esperava era que seu sonho de infância, muito impulsionado por astros do rap americano como Mr Hammer e 2PAC, se tornaria realidade. O nosso jovem protagonista conseguiu, mesmo que por um momento, se afastar da vida criminosa e conseguiu juntar bastante dinheiro fazendo shows, gravando clipes e com as suas visualizações no YouTube. Mas, como tudo na vida, essa felicidade dura muito pouco e Rafa precisa voltar ao mundo do crime pela última vez, porém, àquilo que ele não esperava aconteceu e mudou para sempre sua vida.

“Você quer viver pouco como rei ou muito como Zé?”

Imagem: Divulgação/Editora Elefante

A reportagem quadrinhos do autor Alexandre De Maio conta a história de um dos maiores golpistas no que diz respeito a cartão de crédito/débito é traduzida belas obras de arte em preto e branco que te prendem do início ao fim.

Eu devo confessar que esta foi a primeira vez que tive contato com esse tipo de estilo — a reportagem em quadrinhos — , porém, posso dizer que agrada e muito, não é à toa que li em apenas 2 horas (a história possui pouco mais de 150 páginas). As artes do autor são bem expressivas e conseguem transmitir bem o feeling da cena que se passa. O protagonista vive a clássica jornada do (anti)herói, porém, não por vias que poderiam ser consideradas, pelo senso comum, como “do bem”, afinal, ele vive o mundo do crime de segunda a sexta, com horário marcado e viajando todo o Brasil aplicando golpes em civis.

Imagem: Divulgação/Editora Elefante

Entretanto, devo admitir que gostaria de mais detalhes sobre a vida do protagonista, a sensação que tive é que muitas cenas foram “cortadas” e muitas cordas ficaram soltas, sem grandes detalhes. Esses detalhes não dizem respeito aos personagens “secundários”, porque por mais que eles tenham muita influência na vida de Rafa, eles se enquadram bem na etimologia da palavra “secundário”, ou seja, detalhes sobre eles realmente não fariam tanta diferença assim na história. Em relação a cronologia, com o tempo você pega o jeito, mas no começo o “vai e vem” pode confundir um pouco, mas vá fundo que você pega o jeito rapidinho.

Alexandre De Maio é um incrível jornalista e quadrinista, e consegue cumprir o seu principal papel: contar uma boa história. A Editora Elefante acerta ao trazer uma reportagem em quadrinhos que trabalha a realidade brasileira como ela é e consegue traduzi-la em artes incríveis, fazendo com que o leitor, próximo ou não dessa realidade, possa se conectar com o protagonista, entender as suas motivações e o caminho escolhido por ele, concordando ou não com esse caminho.

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Lucas Machado
Revista Subjetiva

Cientista social, professor de Sociologia e criador da Revista Subjetiva