A triste história da cidadezinha do Noroeste
A peste chegou à cidade em 14 de março.
Veja, não é como se não houvesse outras pestes na cidadezinha que discuto aqui, sempre houve outros males que muito adormece que muito se faz presente em coração e mentes, mas este se trata de um mal físico, patológico. Algo capaz de derrubar as estruturas feias da cidade e dessa naçãozinha esquecida por Deus. No começo não sabíamos quem era o paciente zero e creio que nesta altura do campeonato não faz a menor diferença, passamos dos apontares de dedos e das bravatas entre quem foi o cavalo de Tróia, sabemos que foi a classe de cima, o que importa é que a infecção é de um para três e levamos uma semana para decretar uma “quarentena”.
Quarentena é uma boa piada, mas levamos ela a sério no melhor que pudemos não só na cidade insignificante no Noroeste, mas no estado inteiro. Nosso governador, que pela primeira vez parecia fazer o mínimo, prontificava a dizer que seria realizado essa tal “quarentena”. O único problema, até onde todos constataram (creio que por celulares?) é que essa coisa de distanciamento social? Não funcionou muito bem. 44% de adesão. Menos da metade. Melhor do que nada. Março transcorria como uma alucinação febril e abril é somente um ponto em branco na memória, mas o índice soava promissor, eram 159 infectados para 9 óbitos quando chegamos em cinco de maio.
Mas enquanto em abril alguns de nós, os ajuizados ou os egoístas com amor a própria vida trabalhavam, algumas classes de sangue mais nobresco entre nós decidira que era hora de resgatar seus “CNPJs da UTI”.
Desde abril havia uma força crescente desta distinta classe para uma flexibilização da quarentena, encontrando resistência do governo estadual que estendera a quarentena na forma mais “firme” desde março e alcançaria maio desta forma, não obstante, aquele que senta na cadeira presidencial optará pelo clamor desta classe e por outros interesses que lhe diziam mais próximo ao ir em oposição as medidas. Se fosse para aplicar a sordidez dessa figura do macro em micro, diria que cabe perfeitamente na fraqueza do nosso ilustríssimo perfeito e no representante da distinta classe, Herr Kaiser.
Kaiser, substantivo masculino, designação alemã de imperador, derivada do latim Caesar (césar) através do grego e do gótico. Fem: kaiserina.
vide: Otto Von Bismarck.
vide: Império Germânico.
vide: Primeiro Genocídio do Século 20.
Herr Kaiser, com seu cabelo escovado para trás, terno alinhado e sorriso sem lábio ia a público proclamar que “não é com quarentena que se contém a pandemia”, afinal, os estabelecimentos haviam “regras sanitárias que eram respeitadas pela grande maioria dos empresários, com distanciamento e uso de máscaras, controle rigoroso”. O mantra, repetido uníssono ao governo do miliciano era, “saúde e economia precisam estar em equilíbrio, em todos os momentos”.
Como não acreditar?
Nosso prefeito, a mistura do velho e do desgastado, ouvindo seu povo, afrouxou a crescente e naquele ponto decrépita quarentena no mais tardar, começo de junho. As regras sanitárias e controle rigoroso se mostraram, como esperado, aquilo que se prometeu. A cidade ultrapassou, em tempo, dos quatro mil infectados e uma crescente população de mortos que acompanhavam os mais de 74 mil derivados de outros cantos por igual esquecidos e castigados. Não paramos de contar os que já foram, só convivemos com a infantaria dos mais de 160 mil, eles podem parar de usar máscara, se bem que visto agora não é somente eles que abandonaram o adereço. Vacina neste ponto é irrelevante, sangue coagulado não percorre veias, corações apodrecidos não batem.
Sem luz, água e com calor, medicados preventivamente a base de placebo e desejo fervente, comemorando as pequenas vitórias para ignorar o óbvio.
Os mortos falam e caminham. Estão nos bares e nos restaurantes (que estão sem luz), nos centros do poder e nas sociedades de notáveis (que falta comida), estão levando os vivos consigo, por assassinato ou suicídio, induzindo esse ímpeto, estão nos conduzindo aos seus santuários situados nos shopping centers e nos mercados de rua. Caminhamos entre eles, conversamos com eles e acabamos trocando cervejas (quentes) com eles. Pulsamos todos por esse abraço da morte pela peste, todo um país, uníssono. Delirando em febre.
Um suicídio coletivo, como nunca antes visto cuja carta se estende em demasia. Um país de maricas. O último que sair que apague a luz e pague a conta da empresa espanhola.