política

“Acabou a mamata, taoquei?”

Site contabiliza as facilitações endossadas pelo governo federal após Jair Bolsonaro prometer acabar com o “esquema”

Henrique Nascimento
Revista Subjetiva
Published in
4 min readJan 18, 2019

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“Mamata”:

Proveito ilícito, ou obtido por meio de ardis, à margem de um negócio, uma transação; OU

Acesso a cargo de comissão por motivos não técnicos. Apadrinhamento; OU

Enriquecimento incompatível com a renda; OU

Eximir de obrigação legal a todos imposta; OU

Ato ou efeito de deixar o princípio da impessoalidade cabreiro.

As definições constam no site Acabou a mamata, lançado recentemente para registrar as facilitações dada a amigos e apoiadores do presidente Jair Bolsonaro desde que assumiu a Presidência da República, em 1º de janeiro de 2019.

Dias antes do segundo turno das eleições que o levaram ao cargo mais importante do país, o então candidato avisou que a mamata ia acabar ao criticar o jornal Folha de S. Paulo, dizendo que as informações divulgadas pelo veículo são “tendenciosas” e “menos sérias que uma revista de piada”.

As críticas foram motivadas por um suposto “ativismo político” do jornal contra Bolsonaro, que seria financiado por dinheiro público, algo que nunca foi confirmado.

O Acabou a mamata funciona como um banco de dados. É um “site de clipping com o propósito de não permitir que a história se perca nesses estranhos tempos de políticas líquidas”, conforme explicam os próprios criadores na página. Ou seja, é um espaço para preservar notícias e informações, com fontes seguras, das recomendações de Bolsonaro consideradas como “mamatas”, para que eles não se percam nesse vasto mundo da Internet nos próximos quatro anos.

Divertido, o site ainda tem um “contador de mamatas”, como aqueles contadores de acidentes encontrados em obras, que conta há quanto tempo estamos sem mamatas desde que o presidente decretou o seu fim. A contagem tem um recorde de dois dias sem mamatas, mas há cinco não há chances da situação mudar. Na última quinta-feira, 17 de janeiro, o contador foi novamente zerado, face à decisão do Supremo Tribunal Federal de conceder liminar e suspender as investigações sobre o ex-assessor do filho mais velho de Jair Bolsonaro, Flávio Bolsonaro.

Fabrício Queiroz trabalhava como motorista de Flávio na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) e, após divulgação de documento do Conselho de Controle de Atividades Financeiras, o Coaf, órgão do Ministério da Justiça e Segurança Pública, foi revelado que Queiroz havia movimentado 1,2 milhão de reais em treze meses, entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017. Na assessoria de Flávio Bolsonaro, Queiroz recebia cerca de 23 mil reais mensais para ocupar o cargo, o que não justificaria as movimentações.

O documento ainda identificou um depósito de 40 mil reais na conta de Michelle Bolsonaro, esposa do presidente, que foi justificado por Bolsonaro como parte do pagamento de uma dívida do motorista com a família. Queiroz faltou em todos os depoimentos marcados para explicação do caso, tanto no Ministério Público do Rio de Janeiro como no Ministério Público Federal, mas concedeu entrevista ao SBT, em 10 de janeiro, dizendo que o dinheiro provinha de negócios de compra e venda de carros.

Não houve nem tempo para respirar e lá veio mais uma mamata: na manhã de sexta-feira (18), Bolsonaro nomeou Taíse de Almeida Feijó para o cargo de assessora do gabinete do secretário-geral da Presidência, Gustavo Bebianno. Taíse trabalhou para a agência de comunicação AM4 Inteligência Digital, contratada pelo PSL, partido de Bolsonaro, para ajudar a impulsionar a campanha através do envio de mensagens via WhatsApp.

Em 18 dias de governo, já foram 12 mamatas. Além das já citadas, há também a nomeação de Tercio Arnaud Tomaz, responsável pela página de ódio Bolsonaro Opressor 2.0, no Facebook, para o gabinete pessoal do presidente, e a de Alecxandro Carreiro, fã de Bolsonaro e um dos membros mais ativos na campanha de eleição, como presidente da Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos), em 03 de janeiro.

Dias depois, foi a vez da esposa conseguir uma mamatinha para a amiga Priscila Gaspar, que foi indicada para um cargo na Secretaria Nacional da Pessoa com Deficiência, subordinada ao Ministério dos Direitos Humanos. Para não ficar atrás, o vice-presidente, o general da reserva Hamilton Mourão, conseguiu para o filho o cargo de assessor especial de Rubem Novaes, o recém-nomeado presidente do Banco do Brasil, ganhando o triplo do que ganhava antes.

Ainda teve uma multa ambiental do Ibama contra de Bolsonaro cancelada após parecer da Advocacia-Geral da União; a indicação do amigo pessoal e capitão da reserva da Marinha, Carlos Victor Guerra Nagem, para a gerência executiva de Inteligência e Segurança Corporativa da Petrobrás; e o recebimento pelo presidente de uma quantia de R$ 33,7 mil reais a título de auxílio-moradia, mesmo que tenha utilizado como moradia, nos últimos meses, a Granja do Torto e o Palácio da Alvorada, residências oficiais da Presidência em Brasília.

Essas informações estão todas computadas no Acabou a mamata, contando com mais de uma fonte para checagem (caso alguém o acuse de fake news). O site ainda traz uma coluna denominada “Formação”, com algumas indicações de leitura, como A Elite do Atraso, de Jessé Souza, e Como as democracias morrem, de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, além de indicações de podcasts e canais no YouTube.

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Henrique Nascimento
Revista Subjetiva

Falo de cinema, de séries, de memes, da vida e, às vezes, falo um pouco sério.