As mulheres e os homens: livro destaca a importância da igualdade de gênero para o público infantil

marina
Revista Subjetiva
Published in
4 min readJul 1, 2018
Foto: arquivo pessoal

Era uma vez uma linda donzela que vivia em um vilarejo muito próspero, cujo rei era muito bondoso e valente…

Pare aí. Quantas vezes já não lemos contos infantis que se iniciam com essa mesma temática? A maioria das histórias destinadas a esse público abordam personagens já estabelecidas no imaginário infantil: uma donzela indefesa, e um cavalheiro varonil disposto a enfrentar os mais árduos obstáculos para salvá-la. Parece algo ingênuo, inócuo. No entanto, tais narrações contribuem para que seja criada uma mentalidade inerente aos indivíduos desde sua infância: as meninas são frágeis, não conseguem resolver seus problemas sozinhas e não possuem outras qualidades que não sejam aquelas que lhes tornem damas perfeitas; e os meninos sempre são valentes e destemidos, prontos para agir a qualquer momento, podendo exercer qualquer função que lhes compete. Essa maneira de pensar e agir, à medida em que as crianças vão crescendo, vai se tornando cada vez mais intrínseca a seus comportamentos e ações cotidianas, refletindo na fase adulta e ratificando estereótipos já notados na sociedade, como a polarização das cores (rosa x azul), brinquedos, atividades, atitudes, profissões, roupas etc — contribuindo, assim, para a perpetuação da desigualdade de gênero na sociedade.

Imagem: “As mulheres e os homens” — ilustrações de Luci Gutiérrez

Sob a perspectiva de que os livros infantis devem ir além dos Contos de Fadas, a editora espanhola Media Vaca encontrou, re-ilustrou e relançou, sem modificar o texto original, uma série de 4 livros escritos nos anos 70, de autoria de Equipo Plantel, publicados pela editora La Gaya Ciencia – também espanhola – na qual o título As mulheres e os homens faz parte.

A obra aborda, de maneira leve e bem humorada a importância em se discutir a igualdade de gênero e a pluralidade de padrões na sociedade contemporânea. Tudo isso, obviamente, com uma linguagem bastante acessível e simples, porém, didática, visando uma maior adesão do público infantil.

Imagem: “As mulheres e os homens” — ilustrações de Luci Gutiérrez

A construção textual se dá de maneira curiosa: embora seja uma narrativa, sua progressão se assemelha à de um poema, compondo cada página com um parágrafo curto, como uma estrofe. Além disso, as ilustrações feitas por Luci Gutiérrez, complementam o conteúdo, dando ao todo um ar pitoresco, vivaz e intrigante.

Imagem: “As mulheres e os homens” – ilustrações de Luci Gutiérrez

Dessa forma, a obra vai se montando, e à cada página, os leitores se deparam com novos questionamentos: ora sobre a autoridade masculina; ora sobre a subordinação feminina; ora sobre o modo de se vestir, agir e falar. E assim, o enredo vai caminhando, até o momento em que se começa a instigar mudanças na percepção de mundo do público a partir do que foi retratado anteriormente, tal como a maiêutica socrática*.

Imagem: “As mulheres e os homens” – ilustrações de Luci Gutiérrez

Ao final do livro, há algumas perguntas a serem respondidas, como: “qual sua opinião sobre a relação entre homens e mulheres?” e “quem deve fazer as tarefas de casa?”; convidando o leitor a compartilhar com seus familiares e amigos aquilo que foi lido. Ademais, na última folha, há, ainda, um breve texto da assistente social e feminista Mirla Cisne, entitulado “Para saber mais: diferentes sim, desiguais nunca!”, contribuindo para uma maior fixação do conteúdo aprendido na narrativa.

Portanto, As mulheres e os homens trata-se de uma obra com uma temática de importante discussão, podendo abranger não somente o público infantil, como também outras faixa etárias, em detrimento de sua abordagem intrigante e didática quanto à questões contemporâneas.

*Maiêutica Socrática: Prática desenvolvida pelo filósofo Sócrates que consistia em fazer com o que o interlocutor alcançasse a verdade sobre algo, mediante perguntas que instigassem o pensamento lógico e racional. Assim, o indivíduo tornava-se capaz de dar à luz, parir suas próprias ideias (parto intelectual); uma vez que Sócrates acreditava que o conhecimento é latente na mente humana e pode ser aflorado a partir de perguntas perspicazes. A etimologia da palavra vem do grego, e significa a “arte de partejar”, bem como era a profissão de sua mãe.

--

--