Coisas que os LGBT+ estão cansados de ouvir

Luíza Motta
Revista Subjetiva
Published in
8 min readMar 14, 2019
Reprodução

Crescer como um LGBT+ não é tarefa fácil. Exige tremendo equilíbrio emocional. Enfrentamos cotidianamente milhares de questões e questionamentos internos e externos. Diariamente. Por parte dos outros ou por nós mesmos.

Sabemos ainda que ninguém escolhe o gênero ou a sexualidade que terá, nascemos desse jeito, e não existe culpa nisso.

Pois bem, como se já não bastasse nossos próprios questionamentos, temos que lidar também com os questionamentos externos.

Cada LGBT+ tem uma história, uma trajetória. Conheço muitos que sabem que são gays desde a infância, e nunca negaram na vida. Outros que sempre souberam, mas durante a vida tiveram muitas questões e só conseguiram expressar sua sexualidade bem mais tarde.

Conheço também vários gays que só se entenderam desta forma durante sua adolescência. Alguns que apenas durante sua vida adulta se conheceram verdadeiramente.

Assim como meus amigos bissexuais. Alguns já na adolescência eram totalmente abertos à esta realidade de afinidade emocional e sexual. Outros que nem imaginavam que eram, até determinado momento mais adiante. Outros até beeeem mais adiante.

Sei de pessoas que nunca conseguiram assumir sua realidade, sua verdade por mil e uma questões. Sociedade, família, religião, medo… Outros que fogem do assunto, mesmo que o mundo saiba.

Imagina pra quem não está enquadrado nos “simples” gay/lésbica/bi (simples com muitas aspas, por favor, até porque ser quem você simplesmente é não tem nada de simples ao mesmo tempo que é a coisa mais natural do ser)?! Trans, Queer, Não-Binário…

O transexual nem era tópico de discussão até pouco tempo atrás. Graças a *insira aqui no ser superior que você acredita*, estamos avançando e as pessoas estão compreendendo e respeitando muito mais quem se encaixa nesta definição também. Os trans estão conseguindo se entender com mais facilidade, já que hoje existe uma disseminação de informação sobre sexualidade e gênero muito maior.

Conheço também pessoas que estão conseguindo compreender seu corpo e essa identidade que têm mais cedo do que outros que conheço que só foram compreender-se como trans bem mais velhos.

Bem, se eu for falar de cada representatividade da sigla LGBT+ eu fico aqui pra sempre escrevendo… rsrsrsrs… Podem deixar, que eu não esqueci de ninguém, meu coração tem lugar pra todo mundo, tá?

Quanto mais “desconhecido” o termo, imagino que seja mais difícil de se compreender enquanto pessoa, enquanto sua sexualidade, afinal são termos que estão sendo explicados e mostrados aos poucos, ainda com mais dificuldade de compreensão.

Claro que não é tudo lindo, sabemos que o Brasil ainda é um dos países que mais mata LGBT+ no mundo. A trajetória da maioria dos LGBT+ que eu conheço não foi fácil. Brigas, separação da família por falta de aceitação e compreensão, homofobia de todos os lados… Infelizmente essa é a realidade de mais da metade da população LGBT+. Não é fácil ser LGBT+ nesse mundo ainda. Mas fé que um dia chegaremos no momento em que não será errado ser quem somos, será apenas… Comum. Normal. Natural. Porque é. Ninguém é igual a ninguém e temos nossas singularidades e nossa sexualidade e gênero faz parte disso.

Pois bem, dada essa extensa introdução, vim falar hoje sobre COISAS QUE OS LGBT+ ESTÃO CANSADOS DE ESCUTAR. Sim! Porque mesmo estando em um momento de avanço, ainda existem os mesmos comentários, as mesmas falas que repercutem por aí há anos e anos e anos e eu vim aqui tentar desconstruir um pouco… Se você identificar falas que você repete, mesmo que de brincadeira… Pare! Não é legal.

“É só uma fase”

Acho que essa é a que a gente mais escuta por aí. Tipo, recorde mundial das frases que a gente não aguenta mais. Amigx, deixa eu te contar uma coisa aqui… Não é não! Cara, eu não sei porquê as pessoas ficam tão focadas nisso. Vamos lá. Geralmente esta frase é dita pelos pais ao descobrirem a sexualidade do seu filho ou filha. É compreensível neste momento pelo estado de negação que muitos pais têm, afinal, os pais projetam uma vida inteira para seus filhos e quando nós quebramos essa utopia, pode ser um tanto quanto doloroso. Mas não é só uma fase. Nós nascemos assim, e às vezes já é perturbador para a própria pessoa perceber essa sua realidade, imagina quando as pessoas negam o que ela é? Machuca, sabe? Machuca muito. Tem gente que torce mesmo para que seja porque ver que os outros não respeitam o que você é, é doloroso, é ruim… Às vezes até podemos negar para nós mesmos nossa sexualidade por conta desses comentários. E, acreditem, nos tornamos pessoas muito infelizes por conta disso.

“Mas você não parece ser gay/lésbica/bi”

Essa se junta com os típicos também “Você é tão feminina pra ser lésbica” ou “Você anda e fala feito homem, não parece ser gay”.

Gente, deixa a amiga aqui explicar… LGBT+ não tem aparência, nem bandeira ou marca na testa pra você saber de longe. Como nos portamos, o jeito que falamos, as roupas que vestimos, se usamos maquiagem ou não, o tamanho do cabelo ou unhas… Nada disso interfere em quem nós vamos amar e nos sentir atraídos. São coisas distintas e que, as características mutáveis e físicas nós optamos, ao contrário da sexualidade. Eu tenho a aparência que tenho porque quero ser desse jeito, uso salto e vestido porque gosto, pinto as unhas e cabelo porque acho bonito.

E essa explicação, colocada no inverso, cabe para os que muitos escutam também: “você é muito masculina, parece até homem, você quer ser homem?” e o “Você é afeminado demais, quer virar mulher?” e até mesmo “certeza que você é bi? Tem cara de lésbica”. Bem, características físicas são opção e cada um se sente confortável de uma forma. Cabelo curto ou longo, usando roupas apertadas ou largas, tênis ou salto. Certo? Estes estereótipos estão super caídos, não tão com nada. Chega, gente.. O que somos por fora é pura e simplesmente conforto e adaptação e questão de gosto.

“Você tá em cima do muro, bi não existe”

Também tem o “Você tá confusa, isso sim.”. Olha, é perfeitamente normal uma pessoa sentir atração por ambos e todos os gêneros. Isso é questão de afinidade, química, tesão mesmo. A pessoa gosta, ué. Não existe nada de confuso nisso. Qualquer pessoa que sinta desejo sexual sabe que vai muito além da aparência (e isso é comprovado). Cheiro, visual, conversa, humor. Tudo isso ajuda a despertar interesse numa outra pessoa. E as pessoas são capazes de serem atraídas por ambos os sexos, sim. Afinidade é tudo na vida, gente, pra qualquer relacionamento feliz.

“Como assim você tá num coletivo LGBT? Você não namora um cara?”

Bom, agora que você sabe que uma pessoa pode ser bissexual, podemos entender que o B do LGBT+ não é de biscoito nem de bebida, né?

“Mas como vocês transam?”

Tem também o “E quem é o homem/mulher da relação?”… Dá até preguiça de falar, de responder. Mas a gente respira e vamos com calma. Olha, o sexo vai muito além da penetração e relação pênis-vagina. Vocês deveriam saber isso, rs… Pois bem, todo ser humano sente prazer de diversas e múltiplas e inúmeras formas. Toques, beijos, carinhos, falas, olhares, e a própria penetração. Cada um sente de um jeito, gosta de uma coisa, enfim… Assim como cada um de nós é único, cada sexo também é único. Pois então… Nosso prazer não depende de pênis nenhum (ou de vagina nenhuma no caso de homens gays). As coisas rolam, o sexo flui, e nós temos muitos jeitos de sentir prazer e termos orgasmos. Inclusive quando você conhece seu próprio corpo, que facilita muito as coisas também. E, amigx, em relacionamentos gays nunca existirão o homem ou a mulher da relação. Ambos são do mesmo gênero, então serão sempre duas mulheres e dois homens. Ninguém “interpreta” papéis numa relação. O casal tem as mesmas coisas (quando cis ou trans que fizeram a transição de gênero) e é isso.

“Vamos fazer um menage?”

Então, primeiro de tudo podemos interpretar isso como absurda falta de respeito. Geralmente essa pergunta é feita à mulheres bissexuais. Mas muitas lésbicas já escutaram também. Nada impede do casal querer realmente fazer, mas não é assim que se chega e pergunta, tá?

Primeiro, se você mal conhece a pessoa, nem cogita perguntar uma coisa dessas. Segundo, se o casal quiser fazer, será uma decisão delas. Essa pergunta geralmente quando é ouvida soa com uma repugnância total. É asqueroso.

Não somos objeto sexual de ninguém. Tudo o que for rolar de relação sexual do casal será primeiramente discutido e entrado em acordo com quem faz parte do casal. Logo… Ela não está com quem está para agradar ninguém, muito menos macho, que é quem quase 100% das vezes faz essa pergunta nojenta.

“Que desperdício”

Olha, não é não. Desperdício é jogar quilos de comida fora com gente passando fome. É não reaproveitar e reciclar. Ser gay nunca será desperdício. Tem quem seja, tem quem goste. A culpa não é nossa se você não encontra alguém decente para se relacionar. É chato ouvir isso porque nós somos muito felizes exatamente do jeito que somos. Gostando do que gostamos, fazendo o que fazemos.

“Você é lésbica/gay porque não fez direito com homem/mulher”

Também ouvimos o “é porque ninguém de comeu direito” e o parecido “Mas você nunca fez sexo com homem/mulher, como sabe que não gosta?”. Cara, ninguém merece. Você já comeu merda pra saber se é bom? Já fez sexo gay pra saber se gosta? Então pronto. Nós sabemos e ponto. Não é tópico de discussão. Conheço gente que até foi feliz sexualmente com o gênero oposto, gente que até filho teve, e depois percebeu que não era aquilo que realmente fazia feliz. Acontece. Nós nos conhecemos melhor que qualquer outra pessoa e só nós mesmos podemos dizer com certeza do que gostamos ou deixamos de gostar. O que queremos pra nossa vida ou não.

“Mas você não vai trair?”

Geralmente quem escuta essa pergunta são os bissexuais. Mas vamos combinar?! Sexualidade não tem absolutamente nada a ver com lealdade e fidelidade. Não é porque a pessoa é bi que ela vai trair. Afinal, sabemos que traição nunca foi questão de sexualidade né? Homens hétero, gays e bi traem. Mulheres também. Não julgue a ética da pessoa por conta da sua sexualidade. Pessoas que se relacionam com bissexuais muitas vezes são inseguras quanto à isso. Mas a confiança é a base de todo bom relacionamento, certo? Então desconfiar dela o tempo inteiro só por conta do seu passado não é uma boa coisa para quem está num relacionamento.

Bom… Chego a minha conclusão de que todas as frases e perguntas destacadas aqui são extremamente desrespeitosas e deixo claro que os LGBT+ estão cansadíssimos de escutar por aí… E para você ter certeza o quanto é ridículo, imagine essas perguntas sendo feitas aos hétero?! Fica estranho né? Então, não faça aos gays.

Quero muito agradecer também aos meus amigos que me ajudaram e me enviaram frases e perguntas que eles estavam cansados de ouvir. Não vou citar nomes para não expor ninguém, mas vocês sabem quem são e eu agradeço pela contribuição. E eu espero que vocês e todos que são LGBT+ escutem cada vez menos coisas desse tipo, até o dia que sejamos apenas… Normais. Porque somos. É natural nosso desejo e nosso amor. Aceitem. Ou, pelo menos, respeitem. Estamos em um momento bem conturbado para nós, e estamos juntos nessa.

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Luíza Motta
Revista Subjetiva

Romântica em tempo integral e (quase) psicóloga. ❤