Como um fracasso acabou sendo uma linda vitória

Alvaro C. Adriano
Revista Subjetiva
Published in
6 min readAug 17, 2017

Setembro de 2015, depois de estar no Brasil há vários anos, terminar a faculdade e estar a trabalhar, buscando uma carreira no país do “samba e futebol”, mas que também no país de outras tantas maravilhas e de um povo sem igual, que não é o que me viu nascer, mas que é o que escolhi para morar, percebi que apesar da forte ligação histórica, cultural e econômica entre o Brasil e o continente Berço da humanidade ainda se sabia pouco ou quase nada sobre África.

Então junto com o meu eterno amigo Victor Francisco decidimos agir e mostrar que apesar de ser o berço da humanidade, a África ainda é vista de uma forma muito equivocada pela maioria das pessoas. Nós queríamos mudar esta visão! Para isso, tentamos criar uma série de documentários os quais seriam filmados em até 15 países africanos, selecionando os 5 países mais bem colocados nas seguintes categorias:

Produto Interno Bruto (PIB Nominal);
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)
Melhores cidades para se morar

A ideia era visitar em cada país, no máximo três cidades, sendo a capital econômica, capital política e a cidade mais turística (mais visitada por estrangeiros) com objetivo de mostrar a África contemporânea, urbana e o que ela tem de melhor para oferecer, em termos de empreendedorismo, educação, cultura, arte, ciência, tecnologia, idiomas, turismo, esporte, lazer, religião e gastronomia do continente africano. Por isso, seria necessário fazer um tour continental filmando, fotografando, entrevistando e documentando o que a África tem de mais interessante.

Quem quiser saber mais sobre o projeto acesse AQUI.

Durante o processo de divulgação do projeto e várias reuniões sobre o assunto, participamos de alguns eventos locais, como festas afro, eventos culturais , em memória do Fela Kuti e tantos outros. Mas um deles me chamou a atenção e me marcou para o resto da vida.

Uma mensagem de uma jovem mulher, que trabalhava como professora de um colégio tradicional e de alto padrão aqui de Curitiba. Ela queria que fizéssemos uma apresentação na escola para falar sobre África e fez uma avalanche de elogios ao projeto. Então marcamos para conversar sobre.

A reunião aconteceu na rua de turismo e comércio, a mais frequentada de Curitiba, a Rua XV de Novembro, no final do dia depois de cumprir as exigências laborais, nos encontramos e estávamos todos exaustos.

Então fomos para uma lugar que podíamos conversar e comer. O lugar escolhido foi o Subway.

— O que vocês vão querer comer ou beber? — Perguntou ela, para mim e para o Victor.

— Nada. — Respondemos, quase que em coro.

Então ela fez o pedido e nós escolhemos a mesa. Pouco tempo depois, estávamos sentados, conversando e assistindo ela, meio tímida comendo o seu lanche com uma elegância, meio que ingênua, mas certamente cativante.

Era notório a sua preocupação com a mastigação dos alimentos, pois enquanto comia, explicava melhor o que ela pretendia de nós.

— Então, como te falei no Facebook, sou professora e o colégio está a buscar novas ideias, e queria fazer alguma coisa sobre África, na semana da consciência negra. Mas está meio em cima da hora.

— Sem problemas, mas o que exatamente estas a pensar? — Perguntou o Victor.

— Bem, não queria que fosse falar exatamente sobre a consciência negra, mas falar mais do continente mesmo, tal como vocês pretendem fazer com o projeto. Trazer esta África que poucos conhecem.

— Entendo. Falar dos aspectos, positivos, mas que enfoque desejarias que estivesse em nossa apresentação? — Perguntei

— São vocês que vão definir isso. Mas a palestra seria para adolescentes, então cultura, esporte e educação não podem faltar. Como vocês são angolanos, poderiam falar também do Kuduro.

A mesa se tomo de risos. Mas pouco tempo depois a conversa tomou rumo desejado por todos. Então chegamos a conclusão que ela apresentaria a ideia dela para a escola. E depois entraria em contato. Mas depois disso a conversa continuou…

Ela queria saber como faria para levantar todo aquele dinheiro necessário para fazer a série de documentários.

Explicamos que estávamos vendendo camisetas para isso, então ela sugeriu que vendêssemos na escola no dia do evento.

Minutos depois a reunião terminou. Eu e o Victor a acompanhamos para o ponto de ônibus.

Passaram-se alguns dias e ela voltou a entrar em contato.

— Oi — Disse ela.

— Oi, tudo bem? — Respondi.

— Tudo sim. E o projeto como vai? — Perguntou.

— Está indo, não tão rápido, mas estamos correndo atrás. — Completei.

— Isso é bom… Então… a escola não aprovou a minha proposta.

— Entendo. — Respondi.

— Pois é, a diretoria disse que está meio em cima da hora. Queriam que fosse algo mais simples, sem aprofundar tanto no tema. Nossa… Fiquei muito chateada. — Completou ela.

— Não fica chateada. Isso acontece. O importante é que tentaste. E muito obrigado por isso.

— Verdade, mas ver no próximo ano. — Retrucou ela.

— Vamos sim.

Assim terminou a conversa.

No dia seguinte, fiz o comunicado ao Victor.

— Brother, aquele evento no colégio não vai acontecer.

— Por quê? O que aconteceu?

— A diretoria do colégio não aprovou.

— Tranquilo, vamos fazer outras coisas. — Disse ele e continuou. — Mas já pensaste na possibilidade que ela queria apenas te ver?

— Como assim? — Perguntei.

— No dia da reunião ela não parava de olhar para você e os olhos dela brilhavam, o sorriso se abria, mais ainda quando era você quem falava.

— Cala a boca, que isso não tem nada a ver.

Desliguei o telefone. E segue as minhas rotinas. Mas a pulga ficou atrás da orelha, fazendo jus ao ditado popular que diz: “Há três coisas que nunca voltam atrás: a flecha lançada, a palavra pronunciada e a oportunidade perdida”. Então não seria mais perder oportunidade e lhe mandei uma mensagem a convidando para sair.

Nosso encontro seria na primeira quarta-feira de novembro, e na semana seguinte, no dia 08 seria o aniversário dela. Que coincidentemente, 8 dias depois seria o meu aniversário. Os dois nascidos em novembro, em anos diferente e em terras separada milhares de Km pelo Oceano Atlântico, ela aqui no Brasil e eu em Angola.

O encontro foi no Shopping Estação para variar. Compramos nossos lanches, nos sentamos na praça de alimentação e começamos a conversar.

No princípio, ela estava tímida e quieta. Alguns minutos depois ela se soltou e começou a contar a sua história.

A cada palavra que ela falava, sentia a força da rainha Njinga e a resiliência da Dandara, com uma toque de sensualidade em uma jovem mulher.

Isso começou a me cativar de tal forma que me fez ficar quieto ouvindo e a admirando que ia se abrindo como uma flor ou uma caixa de surpresas.

Nossa conversa demorou cerca de duas horas, perdemos a noção do tempo, mesmo estando em um lugar barulhento. Era como se tivéssemos nos isolado do mundo. Mas como “coisas boas duram pouco” era hora de nos despedirmos e foi acompanhá-la até o ponto de ônibus que ficava logo na saída do Shopping. E sobre a luz do luar, ao som da orquestra sinfônica urbana, composta de carros, motos, vozes e vários outros sons da cidade, espontaneamente aconteceu o nosso primeiro beijo.

Parece clichê, mas também estava chuviscando. Ela insistiu que eu levasse seu guarda-chuvas, pois eu voltaria pra casa a pé e ela de ônibus. Assim, ficou a promessa de mais um encontro para devolver o guarda-chuvas.

Claro que isso era apenas uma linda desculpa para reviver um lindo momento daqueles que a mente eterniza…

Tudo aconteceu numa tranquilidade incrível e tão marcante, que de tempos em tempos revivo este momento que só aconteceu devido um “fracasso”.

E sempre digo para ela:

— Me fizeste entender que a vida é um clique do tipo: Eu, você, dois filhos e um cachorro, juntos transbordando de vida, ops, de felicidade.

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Alvaro C. Adriano
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Sonhador, Escritor Sem Obra, Atleta Da Vida, Artista em construção!