Elevador — Selvageria urbana #1

Alvaro C. Adriano
Revista Subjetiva
Published in
7 min readMay 24, 2017
pixabay

“Toque, toque, toque”, era o som que o salto alto que uma mulher fazia no hall de entrada do prédio. Ao ver que a porta do elevador começava a se fechar ela, grita:

_ Por favor, segure a porta!

Dentro do elevador, estava um homem aflito e desesperado para ir ao toilete, mas ao ouvir o pedido desesperado de sua voz, se comoveu, mesmo sabendo que isso o colocaria em uma situação de xeque mate.

Então, ele abriu a porta e esperou a mulher chegar. Mas antes, ela parou na portaria para pegar as correspondências com o porteiro que puxou uma conversa rápida, mas habitual entre os dois.

_ Boa tarde, Dona Maria! — Disse o porteiro.

_ Boa tarde, João! — Ela respondeu.

_ Suas correspondências?

_ Sim, por favor!

_ Aqui estão e tenha uma boa noite, senhora!

_ Obrigada e bom trabalho para você.

Pegou as correspondências e continuou seu trajeto em direção ao elevador, em que estava o homem aflito.

A cada passo que ela dava, o homem desejava que ela fosse mais rápida, que se possível voasse, mas ela vinha com toda classe e charme, apesar da aparente pressa que trazia, mas isso não era o suficiente para um homem que deseja se aliviar. O tempo tem velocidades diferentes para cada pessoa e para cada momento.

_ Muito obrigada por teres esperado. É muito gentil de sua parte! — Disse Dona Maria.

_ Não tem de quê! — Respondeu o homem e ainda perguntou:

_ Qual é o teu andar?

_ O quinto!

Então ele pressionou o botão para o quinto andar e ficou a olhar para o teclado enquanto o elevador subia. Estava focado em desviar a sua atenção para evitar que o pior acontecesse e não pudesse se segurar até chegar ao banheiro. Mas a voz meiga da Dona Maria, rompeu o silêncio, com uma pergunta:

_ Como te chamas?

_ Paulo. — Respondeu seco, pois não podia se soltar muito, o corpo estava em sinal de alerta vermelho. O que ficou confuso para a Dona Maria, que não sabia identificar se era por constrangimento, que aquele gentil homem, que pacientemente esperou por ela, mas que agora estava seco e nada receptivo.

_ Moro aqui a mais ou menos 10 anos e gosto muito deste lugar, e você? — Disse Dona Maria, querendo conversar. Como uma forma de gratidão à pequena gentileza e uma forma educada de que se criar empatia.

_ Moro aqui a pouco mais de um ano. — Ele respondeu olhando para o chão.

_ Novo no prédio e novo na vida. Seja bem-vindo! Ainda que atrasado. É bom ter vizinhos educados. Mas está mesmo tudo bem? Estás a suar cada vez mais.

Cruzando as pernas e desviando o olhar para o teto do elevador, Paulo respondeu:

_ Sim, estou sim. Isso é normal.

_ Ah! Então você é claustrofóbico?

_ Não!

Em seguida tentou forçar um sorriso, mas sua mente e seu corpo não estavam na mesma sincronia.

O elevador parou, a porta se abriu e Dona Maria saiu, mas antes ele se despediu.

_ Boa noite e bom descanso!

_ Boa noite e bom descanso para você também.

No momento em que ela saía, depois de dar dois ou três passos olhou para trás e viu Paulo focando toda a sua atenção. Ela não falou nada, apenas acelerou o passo e pensou: “Que homem estranhamente confuso”.

No elevador, a viagem continuava, rumo ao alívio que naquela situação representava o paraíso… segundos depois, Paulo também estava fora do meio de transporte mais seguro. Mas sai correndo e vai direto para atender as exigências do corpo!

Dois dias depois, a situação se inverte. Dona Maria, chegou uma pouco antes e foi se dirigindo para o elevador, enquanto conversava com o porteiro, que ao ver Paulo chegar com as mãos ocupadas com sacos cheios de compras, João, o porteiro se apressou para ir abrir a porta para ele.

_ Boa tarde senhor! Posso ajudar?

_ Boa tarde. Obrigado mas não precisa. — Respondeu Paulo

Que continuou andando em direção ao elevador. Mas Dona Maria, abriu a porta do elevador e entrou e a fechou para que o elevador fosse embora. Ignorando a presença de Paulo que oposto a ela, não gritou pedindo que segurasse a porta.

Paulo ficou nervoso, mas manteve a postura.

No dia seguinte, cedo da manhã, Paulo sai para trabalhar. Coloca seus fones de ouvido de última geração, sai ouvindo um rock n’roll pesado, que o fez viajar para anos luz de distância da terra, direta para os planetas da imaginação dos universos do prazer.

Cumprimentava as pessoas com sorriso.

Meio atrasada, saía Dona Maria, dentro do seu carro, dirigindo, terminando a maquiagem e ainda digitando ao telefone, mas ela não viu que o seu vizinho caminhava lentamente pela saída da garagem. Justamente quando ela acelerou que deu conta do vizinho Paulo, então pisou no travão “freio”, o que fez o celular cair e se borrar com o batom, em seguida buzinou, mas Paulo nem deu conta do acontecido, pois a música estava ensurdecedoramente alta.

Continuava a passos de camalhão o seu trajeto. Então Dona Maria baixou o vidro e disse:

_ Seu retardo! Sai da frente e ande no lugar de pedestre!

Paulo continuava sem dar atenção a ela. Então, ela enfurecida, para o carro e sai para falar com ele, fazendo isso aos gritos e o empurrando.

_ Seu idiota, quer morrer se atire do prédio e não fica parado na saída da garagem para ser atropelado e estragar a vida das pessoas. Se a tua vida está uma merda, a culpa é tua!

Sem entender, Paulo responde:

_ Deixe de ser histérica e se explique melhor.

_ Quase te matei, seu imbecil!

_ Isso aqui não é pista de corrida, tenha mais calma.

_ Cala-te, perdedor, corno do caralho! — Disse Dona Maria.

_Vai dirigir fogão, se o carro está a te complicar.

Minutos depois, cada um foi para o seu destino, mas ainda resmungando e profanando ofensas ao outro.

No dia seguinte, Dona Maria foi para o estacionamento pegar o carro, como sempre faz, mas quando acelerou ouviu um barulho dos pneus estourando logo nos primeiros metros que andou, saiu do carro para ver e tinha vários pregos nas quatros rodas.

Logo veio a sua mente o vizinho da briga do dia anterior. Se sentiu possuída e começou a planejar a sua vingança.

_ Ele me paga! — Gritava várias vezes.

Em seguida, tirou fotos e chamou a polícia, que não demorou para chegar. Pouco tempo depois, o síndico e outro moradores se aglomeraram para entender a o que estava acontecendo.

A cada olhar curioso ela relatava os fatos.

_ Isso que dá morar ao lado de pessoas mal educadas, miseráveis e invejosas. O Paulo furou todos os pneus apenas para ele se divertir, com uma covarde e injusta vingança.

Coincidentemente, Paulo estava atrasado e sai para ir ao trabalho, mas enquanto ele saia do prédio João, o porteiro, gritou:

_ O Senhor Paulo está aqui!!

Então Paulo pára, olha para ele e pergunta:

_ Por que está a gritar que estou aqui?

_ Pare de agir como se não soubesses, senhor!

_ Saber do que?

_ Do estrago que fizeste com o carro da Dona Maria.

_ Está louco? Mais respeito seu porteiro de meia tigela.

_ Bem, não fui eu quem falou, apenas estou a transmitir o recado. A culpa nunca é do mensageiro.

_ Então que falou?

_ A própria Dona Maria.

Mas antes que Paulo respondesse, os agentes da polícia vieram o interrogar sobre o acontecido.

_ Bom dia! O senhor é o Paulo? — Disse um dos agentes policiais.

_ Sim, senhor!

_ Fomos chamados aqui para atender um chamado, em que foram criminalmente furados os pneus do carro da senhora Maria. Ela alega que foi o senhor. Esta informação confere?

_ Não, senhor, ela é louca, ontem quase me atropelou e na sequência ainda me agrediu. — Respondeu Paulo.

Dona Maria não se conteve ao ouvir estas palavras de Paulo.

_ Seu tarado, retardado mental, foi você que saiu do prédio pela garagem…

Mas ela não conseguiu concluir a frase e foi surpreendida com uma tentativa de tapa, dada pelo Paulo.

Um agente pegou Dona Maria antes que a mão de Paulo acertasse-a e outro imobilizou o Paulo e disse as clássicas palavras:

_ Estás preso por tentar agredir uma mulher.

_ Mas ela que provoca, essa louca.

Mas Dona Maria, continuava a gritar, a chamar nomes no Paulo. Então o agente da ordem disse para ela.

_ Acalme-se por favor!

_ Cala-te, não me diga para se acalmar. Seus incompetentes, sugadores de imposto.

Em seguida o agente também anuncia a prisão dela por desacato.

Minutos depois, estavam os dois sentados e algemados a metros de distância. A espera do reforço que os homens da lei solicitaram para levar os dois para maiores averiguações.

Tudo acontecia, sob o olhar do João, o porteiro que esbanjava um pequeno sorriso, quase que imperceptível. Aquela singela comemoração era uma forma de festejar o seu plano de vingança da dor de cotovelo que nutria por Paulo, pelo simples fato das mulheres do prédio gostarem dele e por por secretamente amar Dona Maria, mas nunca ter coragem de dizer isso a ela, achando que ela nunca daria bola para ele.

Mas enfim, está de alguma forma feliz, pois a vingança é um prato que se come frio e solitário.

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Alvaro C. Adriano
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Sonhador, Escritor Sem Obra, Atleta Da Vida, Artista em construção!