Entre a maldição e a dádiva do Lobisomem em Crônicas da Lua Cheia

Lucas Machado
Revista Subjetiva
Published in
5 min readDec 30, 2017
Arte original de Dennis Gomes.

Informações

Autor: Clecius Alexandre Duran

Título: Crônicas da Lua Cheia: A Maldição do Lobisomem

Número de páginas: 268

Editora: Giostri

Onde comprar: Amazon (Físico)

Resenha

Somos apresentados a Alexandre Scavanelli, um homem maduro que possuí já seus 40 anos, uma longa trajetória no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná e muitos quilômetros rodados com a sua velha amiga de duas rodas, a Cheetara. Ao contrário do que os estereótipos sobre motoqueiros apresentam, o nosso protagonista sempre foi um homem solitário, vaidoso e com um grande vazio no peito resultante das decepções amorosas presentes em seu passado e que o mesmo carregará consigo até os fins dos seus dias.

Em uma noite de lua cheia, a vida de Alexandre mudou totalmente, pois o mesmo foi abençoado (ou amaldiçoado) com a dádiva da mesma lua cheia que banhara seu capacete enquanto o mesmo atravessava a rodovia sob as duas rodas da sua fiel motocicleta, o transformando na figura mitológica do Lobisomem. Agora, o maduro advogado vai em busca de mais conhecimento sobre a sua forma, ao longo de seu caminho ele descobre que possui um “fator de cura” — não igual ao dos quadrinhos –, o seu vigor aumentou absurdamente e, algo não tão agradável, os fantasmas das vítimas de seu lobo o perseguem durante um tempo, podendo contatá-lo durante o seu dia-a-dia.

O nome da sua “decepção amorosa” é Valquíria, uma mulher que mora na pequena cidade de Alto Paraíso em São Paulo, possui uma forte personalidade e um emprego na Receita Federal. O destino une os dois apaixonados envolta de um amor quente e proibido, pois o grande segredo de Alexandre jamais poderá ser revelado, caso contrário a vida de sua amada estaria em jogo bem como a de todos que se aproximarem dele.

“O choque dos corpos faz com que o ar escape dos pulmões da vítima, sufocando o grito nascido do horror.”

O destino nem sempre alinhado aos nossos desejos, une Alexandre a um Moto Clube (MC) que possui uma peculiaridade: toda a diretória é composta por licantropos. Assim, eles não são apenas um grupo de motoqueiros que se reúne para beber e andar pelas estradas — nem sempre conservadas — brasileiras, mas sim uma alcatéia com um alfa, beta e toda uma hierarquia a qual o nosso jovem lobo é incorporado. O seu apelido não poderia descrever melhor a sua personalidade: “Solitário”.

A rotina de Alexandre muda totalmente, tendo que estar com seus companheiros de alcatéia em todas as noites de lua cheia religiosamente, saber quando é o momento de se afastar do centro urbano para saciar a sede de seu lobo e saber quando retardar a sua transformação para quando houver contratempos.

O que também se torna comum no dia-a-dia de nosso protagonista são os conflitos com seu lobo, Solitário, que se vê preso em seu humano e que pretende fazer o que for preciso para quebrar os grilhões com o ser que ele julga “fraco”. Diferente de Solitário, Alexandre não se vê prejudicado pelo lobo, pois isso lhe trouxe benefícios como o retardamento de sua velhice. As mortes causadas pelo seu amigo lupino não aparentam ser um problema para o mesmo que alega ser questão de sobrevivência e não de escolha.

“Somente nas noites de lua cheia ele [o Lobisomem] é livre para viver.”

Os conflitos não se resumem apenas aos nossos dois protagonistas, mas sim também ao seu alfa e o seu beta, que não aceitam o instinto independente de Solitário, tramando planos e estratégias para fazer com que o “filhote” esteja cada vez mais próximo de sua alcatéia e distante do que eles chamam de “gado humano”.

O passado de Alexandre o assombra em todos os dias, assim como seus pares licantropos e os fantasmas das vítimas de Solitário. Todas as decisões que forem tomadas enquanto lobo ou humano irão refletir na sua trajetória, trazendo consequências que mudarão o seu destino e o destino daqueles que lhe forem próximos.

Se entregue ao horror e seja bem-vinda a alcatéia de “Crônica da Lua: A Maldição do Lobisomem”!

“Quando a lua devorar uma sombra. Então, ela encerrará.”

Veredito

A trama de “Crônicas da Lua Cheia: A Maldição do Lobisomem” acompanha a conflituosa trajetória de Alexandre e Solitário, o primeiro não possui objetivos claros em sua jornada, sendo um personagem questionável inúmeras vezes, mas sempre respeitando a sua personalidade individualista e vaidosa, como é escrito no livro, mesmo nos momentos em que o passado lhe assombra e que há uma carga dramática para abalar o coração de Alexandre. Solitário, pelo contrário, deixa bem claro os seus objetivos enquanto lupino, alimentando sua insaciável fome e seu desejo pela total liberdade.

A história possui alguns furos, tendo algumas cenas e personagens que não refletem em nada na “trajetória do (anti)herói” de Alexandre e Solitário.

O livro escrito por Clecius Alexandre Duran possui inúmeras referências a filmes, jogos de vídeo game e obras clássicas da literatura. O autor conseguiu “abraçar” bem o horror e o terror em seu livro, as descrições das investidas de Solitário e de sua trupe nas suas presas são viscerais, trazendo o melhor do terror clássico em seu livro. É impossível não sentir aquele típico embrulho no estomago ao imaginar algumas calorosas cenas descritas pelo autor.

Os personagens, além de Alexandre, Solitário e Valquíria, se mostram como coadjuvantes em seu sentido mais literal na história, não possuindo um papel de destaque que possa lhes colocar em uma posição de protagonista em uma cena, nem mesmo o alfa e o beta desempenham tal papel. O autor evita os conflitos diretos entre os lobos, mesmo que haja uma evidente “rixa” entre Solitário e o seu alfa, Maioral, apenas nos momentos finais do livro podemos ver um eventual conflito entre lobos, que não dura muito e deixa um gosto de “quero mais” no ar.

A edição do livro fica prejudicada pela confusa cronologia adotada pela edição, fazendo com que a trajetória não siga uma linha linear no espaço-tempo, mas sim adote uma cronologia sem um padrão. Acredito que se o livro fosse dividido em “passado” e “presente” o mesmo poderia ser menos confuso para o leitor.

Portanto, se você gosta de um livro que evita o conflito entre bestas colossais, mas abraça a complexidade humana e a licantropia, “Crônicas da Lua Cheia: A Maldição do Lobisomem” é o livro certo para você!

Nota: 3/5

  • Originalidade: 0.5
  • Edição: 0.5
  • Personagens: 0.5
  • Trama: 0.5
  • Ponto extra: 1

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Lucas Machado
Revista Subjetiva

Cientista social, professor de Sociologia e criador da Revista Subjetiva