A imagem mostra, da esquerda para a direita, os escritores Tadeu Rodrigues, Analu Andrigueti, Yuri Al'Hanati — com o microfone — e Deborah Dornellas, durante o bate-papo na Casa Paratodxs. Ao fundo, vêem-se diversos quadros.

Especial (off-)FLIP: "Tantas palavras" com Analu Andrigueti, Deborah Dornellas e Yuri Al’Hanati

Um bate-papo sobre diferentes processos de escrita

Ligia Thomaz Vieira Leite
Revista Subjetiva
Published in
5 min readJul 31, 2019

--

É difícil fazer uma introdução imparcial para falar de uma mesa em que eu fui tão conectada a um dos conferencistas.

Antes de ir para a FLIP, não me programei para assistir nenhuma mesa. Só esta. Conheci a Analu Andrigueti no ano passado, pouco antes do lançamento de seu livro "36 poses Rio" e tenho um exemplar autografado na minha estante. Pudera, Analu é cunhada do meu namorado e foi uma das principais influências para que decidíssemos ir pela primeira vez à FLIP neste ano.

Não dava para deixar de falar dessa mesa. E desculpa aí, Ana, a má qualidade desse meu escrito. Nem todos nascemos poetas como você. Mas sigo tentando.

Sobre os processos de publicação

Analu é a primeira perguntada. Conta um pouco sobre seu último livro "36 poses Rio", um livro pequeno livro quadrado com 36 poesias curtas que narram cenas do Rio de Janeiro. Os textos são originados dos registros que mantinha em um caderninho, que carregava consigo a todo tempo quando mudou para o Rio — e que hoje foi substituído pelo celular, brinca.

Conta da simplicidade da parte burocrática, que envolve a inscrição na Biblioteca Nacional e pagamento do ISBN, mas destaca a importância da ajuda de amigos e familiares: na capa, diagramação, revisão e até na seleção dos poemas.

O bate-papo segue com Yuri, que lançava um livro de crônicas e, por já tê-las em boa parte escritas, graças à sua coluna semanal no site A Escotilha, achou que encontraria menos dificuldades. Conta que se surpreendeu. Selecionou para integrar seu livro "Bula para uma vida inadequada", diversas crônicas sobre o "sem-lugar", tendo escrito também algumas inéditas.

Disse que a maior dificuldade que encontrou ao lançar um livro de crônicas foi, não a intimidade com o leitor, já que o cronista cria para si uma persona literária que vive à disposição do autor, mas o desafio de editar o seu próprio livro, com textos que não se comprometem uns com os outros.

Deborah fala em seguida. Fala um pouco sobre o processo de publicação de seu primeiro romance, "Por cima do mar", escrito na forma de narrativa fragmentada, com cenas avulsas que compõem uma história. Conta que a história do livro originou-se de um conto de autoria própria, sobre o qual decidiu se debruçar em um processo que durou 6 anos. Afirma que, por ser uma narrativa fragmentada, a dificuldade do trabalho reside na forma de "costurar" tudo.

Foi levantado, ainda, o fato de contar seu livro a história de uma protagonista negra — e ela, autora, branca — , girando a história muito em torno de seu tom de pele, ao que colocou a questão do lugar de fala como uma de suas principais preocupações no processo de escrita. Explica que buscou embasar seus escritos pela leitura de diversas autoras negras e guiar-se pela ideia que ouviu de Ana Maria Gonçalves em uma palestra, de que seu livro não deveria falar pelas mulheres negras, mas sim somar-se às suas vozes, "falar com".

Sobre processos criativos

A imagem mostra uma mão segurando o verso do livro “36 poses Rio”, de Analu Andrigueti, onde se lê uma de suas poesias: “No alto do Pão de Açúcar, / peguei o bonde da vida e pensei: / dessa vez, vou até o fim.”. De fundo, no livro, uma foto de uma praia no Rio de Janeiro, com um homem e uma criança caminhando em direção ao mar.

Perguntada, Analu conta um pouco sobre o surgimento de suas poesias, que derivam de diversas anotações que faz na rua que são posteriormente passadas para o notebook e "refinadas". Recomenda aos novos autores que participem de oficinas literárias e encontrem pessoas que façam uma leitura crítica de seus textos — paga ou não. Essas trocas, afirma, são muito enriquecedoras para o autor.

Revela que já tem outros livros publicados, um deles, inclusive, também de poesia, também de nome "36 poses", mas este com poemas sobre São Paulo. Os livros têm esse nome, relata, em referência aos filmes de rolo antigos, que nos permitiam tirar 12, 24 ou 36 fotos e a edição de São Paulo tem, inclusive, o formato de um álbum.

"Esses poemas são a minha forma de fotografar"

Analu também conta que está trabalhando em outros projetos, dentre eles um romance inacabado, que reside em sua gaveta há algum tempo e o que pensa ser seu próximo livro: "As Inadequadas".

Sobre a relação entre a crítica e o autor

Yuri também foi convidado a falar um pouco sobre a relação entre a crítica e o autor e afirmou que acredita que ninguém esteja muito preocupado com a crítica literária hoje, já que, com a democratização dos meios de comunicação, todos podem falar uns dos outros. Acredita que, hoje, um escritor esteja mais interessado em ter seu livro divulgado do que discutido; que a discussão já é um segundo momento, quando a obra ou o autor já estão mais estabelecidos no mercado.

Levanta que o maior desafio do crítico é se manter isento e não se limitar a trabalhar só com o que normalmente gosta. Isso se vê mesmo entre os booktubers, nicho que cada vez está se seguimentando mais, já que essa é uma dificuldade para todos, por mais isento que tente ser, destaca.

Sobre a relação entre autor e o espaço narrado

Debora, por fim, é chamada para falar um pouco mais sobre seu romance e os processos de sua escrita. Com um livro que se passa, em parte, em Angola, país em que nunca viveu, a escrita demandou intenso trabalho de pesquisa. Como sempre se fascinou pela cultura brasileira de matriz africana e já tinha pesquisas no tema, e não teve dificuldades em direcionar suas pesquisas para a história de Angola, para dar força à sua escrita.

Os esforços da escritora para garantir a verossimilhança da narrativa parecem ter sido compensados e, neste ano, o livro ganhou o Premio Casa de las Americas, na categoria literatura brasileira.

Você pode comprar o "36 poses Rio", da Analu Andrigueti, clicando aqui, o "Bula para uma vida inadequada", do Yuri Al'Hanati, aqui, e o "Por cima do mar", aqui.

Esse texto faz parte da cobertura da Subjetiva na FLIP: Festa Literária Internacional de Paraty, e você pode ler mais sobre a Festa em:

--

--