“Espelho, espelho meu. Existe alguém mais bela do que eu?”
Imagem: acervo pessoal da autora
... E foi assim que brotou a semente da rivalidade feminina. Tal como aquele pé de mamona que cresce no jardim, ocupa o espaço das flores e rouba seus nutrientes.
A sociedade moderna nos ensinou a amar os homens e odiar as mulheres, odiar a si. Odiar cada pedacinho de pele, pêlos e traços. Estrias, celulites e rugas. Transformou as marcas da vida em imperfeição.
Assim, seguimos numa maratona em busca da validação masculina, perguntando ao espelho meu quem é a mais bela do que eu e quais procedimentos estéticos preciso fazer para derrubá-la do pódio.
Não estou sugerindo relegar nossos corpos ao plano secundário de prioridades. Autocuidado também é se exercitar e botar em dia a skincare. Minha súplica está mais para a seara dos questionamentos. Precisamos respirar fundo e nos perguntar: por que essa insistência em presumir que, de todos os corpos do mundo, o meu é o único que não merece amor e respeito?
A autenticidade da mulher pode estar além do material, mas o recipiente que a contém é feito de pele, cicatrizes, suor e sorrisos. Os melhores perfumes nos melhores frascos.
Desde cedo aprendi a ser mulher que sente com o corpo; a herança dos tempos tempestivos se espalharam em manchas brancas pelo peito, ventre e costas. Já me cobri de vergonha. Hoje, respeito-as como marcas de sobrevivência. Ser mulher é usar a resiliência como combustível à resistência.
Já fui presa a relações que me fizeram odiar mulheres e me invalidar por homens. À época em que ainda juntava forças para quebrar o ciclo, me lembro de pai contar como os frutos da mamona servem de adubo: "é só triturar, juntar água e misturar na terra, filha". Esperar germinar.
É disso que precisamos: triturar a dor e transformá-la em solo fértil para germinar a compaixão, em forma de palavras. Escrita germinada.
