Fúria de um rei

Rafael Oliveira
Revista Subjetiva
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3 min readMay 28, 2021
Place For My Dark Thoughts — @benbauchau

Opera de um homem só

Como te dizer o que eu quero? O Afeto, o embate, o afago, a dúvida, o contato, as laranjas, a indulgência, as migalhas, a dedicatória, as catarses, os diálogos, os dentes de leopardo dilacerando a minha carne, o zelo de um pai, carinho de um irmão, a história de um amor, o veredito, a fricção, o embalo de sábado à noite, o eclipse…

Não estou falando de amor, é sobre paixão. Mas também não é sobre isso.

A raiva demolindo todas as minhas paredes. Como transmitir-te que, nesse espaço-tempo, obliteraria este supermercado, jogaria esse carinho na sessão de vinhos declamando a poesia das garrafas estilhaçadas. O conteúdo se esparramando, atos descomedidos sem pensar duas vezes. Penso três.

Sim, no caos existe tanta coisa que se desaparece na ordem. Categorizar é perder. O cosmos árido esconde uma frugalidade. A opulência é uma forma de torpor momentâneo, um brilho cegante. Esconder neologismos dentro de perolas, dentro de conchas, dentro do mar, dentro da casca do mundo, dentro da retina.

Como uma criança que vê todos os seus amigos irem embora da escola, enquanto senta solitária esperando seus pais chegaram. Das solidões que se perdem ao amadurecer, dando lugar a uma infinidade de outras decepções dissabores.

Estou esperando a sua chegada, mas sem esperar.

Uma linha estreita separa meninos de homens. É inevitável que para sobreviver a gente perde um pouco de nós. Seu antigo eu se suicidou ou foi (brutalmente) assassinado.

Uma clava fincada no meu abdômen, no coração não, mortes lentas doem mais. Esse ardor, esse mormaço, você não se sente esgotado? Placebos conscientes. Possuo uma memória muscular ativa.

O dia que me levantou do chão sem me tocar.

A minha verborragia é o mais perto de comunicação (e desabafo) que consegui alcançar. Rômulo e Remo foram criados por um lobo.

Cerzindo a trilha. Hercules seria capaz de completar esse trabalho? A brutalidade de um homem seria capaz de abandona-lo por completo para que ele possa respirar a plenos pulmões?

Você fala, fala e não diz nada!

A nossa cisão. Preludio de um grande nada. A antítese de nós. Você nem se acabou por aí depois que disse que não iria retornar ao que era.

Porque o fim depois do fim é o que dói, quando desligam as câmeras e a normalidade se faz presente como as células em metástase, se replicando silenciosamente nos confins da nossa gênese.

Eu gosto de receber na cara mesmo, para doer, curar e sentir que estou vivo. Absorto, constantemente esqueço meus propósitos.

Por vezes, atraco meu bote na insula que fiz de cemitério de tudo que já nasceu, viveu, matou e morreu em mim. As pequenas sinfonias que toquei sozinho, os armistícios que propus, os zênites, as crateras de lágrimas.

O eu encouraçado em arame farpado. Formas de se proteger contra um guerra civil de suas próprias nações, suas cidades.

Faço tudo com fúria, intenção, ódio e amor.

E nada nunca acaba, tudo é reciclagem. E recomeça…

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Rafael Oliveira
Revista Subjetiva

Você está nos meus dedos e nos meus pensamentos, embora só escreva de você para falar de mim. Rafaeloljs@gmail.com