Fim de festa
A gente abre o corpo-casa para receber visitas. Conversa, canta, beija, come, grita e vai embora. Ou fica. Quem fica limpa a bagunça sozinho. Recolhe o lixo, os copos quebrados, tenta tirar a mancha de vinho do sofá que fica, não importa o quanto você esfregue. Fica pra lembrar que ali já estiveram as mãos desastradas que escorregaram pelos cabelos e os dedos nervosos que batiam na mesa num ritmo que irrita os ouvidos. O silêncio do fim, a casa vazia quase escutando o vazio de dentro.
O que fica além da gente quando tudo vai? Se é que a gente também já não foi embora de si e não se deu conta. Acho que estou fora de mim faz tempo. Parece que falta um pedaço ou faltam todos os pedaços. Parece ressaca do que não foi. E não tem remédio que cure o vazio. Não tem faxina que limpe a bagunça que fica dentro da gente. Um eterno fim de festa, todos foram embora e só sobrou memória e trauma.
Até gosto da minha solidão. Não sou muito de festas, pelo menos não mais. Jogo a poeira pra debaixo do tapete. Já não me sinto em casa no corpo que tenho, na vida que tenho. Isso não me aborrece mais. Tenho aprendido a conviver com meus medos e aceitar meu tempo, meus limites . Apreciar os vazios. Nada é melhor que a paz do silêncio quando a gente se acostuma a conviver com barulho. Sentir com calma sem a urgência de ser tudo, experienciar as coisas mais bobas com a cabeça livre. Ou se permitir não sentir, só dessa vez.
Cada um sabe de sua solidão. A bagunça é sempre de quem fica.