How I met your Mother, Friends e o machismo presente nos sitcons

Dandara Aryadne
Revista Subjetiva
Published in
8 min readApr 25, 2017

Sim, você irá ler mais um texto sobre machismo, provavelmente falarei algumas coisas que você não irá gostar, você tentará com unhas e dentes defender sua personagem favorita e, no final, poderá até vir dizer que estou errada, mas se nos encontrarmos no parágrafo final, é sinal que você chegou até ele por SUA conta.

Eis a questão: eu não sei muito sobre o assunto. Eu, sendo mulher, de verdade, nunca tive a visão ou discurso apropriado para falar sobre. Para ser sincera, eu acredito que fui a primeira mulher feminista — e não hétero — da minha casa. Nunca entendi muito bem o porque meu irmão tinha certas liberdades, mesmo eu sendo a mais velha, o porquê que eu TINHA QUE arrumar a casa, enquanto ele podia jogar videogame a tarde toda. Ou até mesmo porque ele podia ficar no portão conversando com os amigos, quando eu perguntei para a minha avó disso tudo, ela me respondeu: “Isso não é coisa de uma garota decente, onde já se viu?” — mas devo assumir que eu plantava minha bunda na calçada, jogava videogame e discutia minhas liberdades. Na minha criação, isso não era ser feminista, lutar pelos seus direitos, isso era rebeldia, “querer chamar atenção”. Tendo em vista isso, assunto de hoje é comparar duas das mais famosas sitcons da televisão.

Por tanto senhoras e senhores, eu só quero deixar claro que: eu não tenho a mínima ideia de como isso vai sair a partir daqui.

Não direi os trejeitos, os ensinamentos ou os motivos, mas fato é fato que, se você nasceu nos anos 90, eu tenho a certeza de que você já assistiu ao menos um episódio de Friends, certo?! Mesmo que não goste, já estava passando na TV e pronto, você parou para ver o porque era tão engraçado e seus amigos só falam disso. Bom, aqui está nossa questão. Começo da sua adolescência, anos 2000, você quer saber o porquê não se encaixa no seu grupo da escola e na TV, como resposta, aparece um homem desiludido pelo amor, uma patricinha que está tentando mostrar que tem algo mais, uma ex-gorda que procura uma conexão no mundo, um homem assustado pelos seus dramas familiares, um carinha engraçado que tenta ter sucesso e uma mulher louca que é a ponta engraçada. No final de tudo, esses personagens se tornam amigos, companheiros, amantes e confidentes, com incríveis lições de vida (algumas delas carrego até hoje). Mas então por que Friends entrou no tópico do machismo? Vamos pensar por uma perspectiva real?

Rachel não era a personagem favorita de ninguém. Ela era mimada, insuportável, mentirosa, manipuladora e fez o Ross sofrer, além de sempre estar com um namorado diferente. Então porque ela precisou se tornar mãe para que ela passasse a ser uma personagem respeitável? Os problemas com a sua família eram levados na base da comédia, e suas dúvidas sobre o mundo como primeiro emprego, salário, amor, casamento e amizades eram motivo de escárnio, como se ela nunca tivesse lidado com o “mundo real”. Mas quando ela finalmente se tornou mãe da filha do “homem certo”, ela colocou sua cabeça no lugar e estava pronta para se tornar um personagem digno de atenção. As vezes até ignoramos que ela começou do zero, no final da década de 90, sem faculdade, construindo uma carreira no cruel mundo da moda, SOZINHA. As vezes esquecemos disso… Tudo o que é discutido é sua relação com o Ross — sim, eles estavam dando um tempo, sim, ele a traiu.

Mônica. Vamos para a Mônica. Com a ela você se identifica, certo? Ou será a Phoebe? Como uma amiga minha disse, quando eu estava pesquisando opiniões sobre esse assunto, a Mônica sempre soube o que ela queria. Família, marido, filhos. Ela era diminuída por isso? Não. Ela era posta de lado por isso? Não. Mas por que sua mania de limpeza, organização e controle era visto como um exagero, ponto de comédia ou defeito? Ela nunca se colocou para baixo em nenhum de seus relacionamentos, ao contrário. No episódio “The One with Barry and Mindy’s Wedding” (S02E24), ela até tenta deixar seus sonhos de lado, mas os reafirma, perde o então amor de sua vida, demora seu processo de luto e segue em frente. Se apaixona de novo, ensina a um homem perdido no amor o que é a felicidade, supera o fato de não poder ter filhos, se casa, adota e constrói a família e a carreira que ela quer. E ainda assim, onde está a Mônica nessa série sem não ser a ex gorda controladora que casou com Chandler?

Phoebe, por outro lado, com a vasta experiência de vida que ela tem — morou na rua, sua mãe se suicidou quando ela tinha 14 anos, a avó dela não tinha a mínima condições de cria-la, o pai a deixou, sua irmã GÊMEA não lhe dava a mínima, morou dentro de um carro com um homem com lepra, trabalhou em diversos lugares, sabe fazer diversas coisas honestas (e nem tão honestas assim) para conseguir dinheiro e não passar fome — , se virou como o alívio feminino cômico ao lado de Joey, e só se tornou “responsável” e “sã” quando encontrou um marido. Aí sim, ela foi levada a sério como mulher e não só a “engraçada”…

Isso nos traz o plot twist deste artigo: o que tudo isso tem a ver com How I Met Your Mother? Vamos lá, você sabia que tudo isso chegaria nesse ponto. Duas mulheres, diminuímos o número, mas não o problema. Lily e Robin.

Lily = Mônica e Phoebe. Robin = Phoebe e Rachel.

Lily sempre foi e — depois do final desastroso do arco amoroso principal — sempre será namorada/noiva/esposa de Marshall. Isso não é um problema, de forma alguma. Mas ela sempre é a mãe. Sim, a mãe de todos nós. Ela sempre está lá, com um lencinho na mão, um bom conselho e lição, com loucura ou não, no final, Lily sempre é a razão, principalmente do Ted, o grande garotão (juro que não era intenção rimar). Sua arte nunca é devidamente valorizada pelo próprio Ted muitas vezes. Mas o maior problema é Robin — e quando eu digo problema, não precisam colocar isso como algum defeito, quero apenas ressaltar a personagem como parte da equação, não me joguem pedras.

Quando comecei a serie, eu realmente encontrei em Robin um ponto positivo, na minha ingênua visão, ela era o completo contrário de Rachel. Personagem forte, livre na sua sexualidade, namorava quem queria, trabalhava no que queria, criada por um pai solteiro, dizia não… Forte, sabem? Mas ai… Putz… Criada por um pai solteiro, então realmente precisam caracterizá-la como um homem? Seu pai queria um menino? Mas qual é, vocês sabem que isso não funciona daquele jeito na vida real, né? Ela só foi levada a sério como uma “mulher amiga” pelo Barney quando ela agiu que nem ele no episódio Zip, Zip, Zip (S01E14) — vestindo terno, onde ele desconsiderou toda a sua sexualidade ou personalidade ao inclui-lá como bro — Robin, o tipo de mulher que o homem pode falar qualquer coisa sem frescuras… Pois é.

Quantas de nós mulheres somos assim para diversos homens diferentes que já passaram em nossa vida? Ela não pode engravidar, ela não quer ter filhos, mesmo se pudesse. E ainda termina com dois enteados a tira colo porque simplesmente o Ted “não podia” ficar sozinho? Qual é! Se era menininha de mais, problema, sentimental. Se era forte demais, ameaçadora, fora de controle… No final, parece que não, mas ela foi a personagem que mudou para poder se encaixar, criando um padrão. Sim, senhores, um padrão! Lily continuou sendo o que ela sempre foi, mas Robin? A solitária mulher dos cachorros que estava a espera do homem que não consegue ficar sozinho por mais de quatro episódios.

Onde os homens dessas duas séries se encaixam em tudo isso? Bem, vou lhes dizer desse meu pobre e inexperiente ponto de vista criado dentro desta minha humilde casa. Ross continua sendo o homem romântico “certinho”, que tem seus problemas, mas sempre “amou” só a Rachel de verdade. Chandler só aprendeu a lidar com relacionamentos quando encontrou uma mulher forte que o colocasse controle. Joey, o “bufão”, continuou um ladies man, sem dó ou piedade — de longe o personagem mais sincero. Marshall, precisou aprender com seus erros de que a cabeça de uma casa não é o homem, e muito menos SÓ a mulher, tudo funciona como um CONJUNTO. Barney só mudou sua maneira de pensar e agir sobre as mulheres quando ELE teve uma filha e, por final, Ted, bom, não importa quanto tempo demore, continue insistindo, continue sendo inconveniente, continue batendo na porta, um dia você ganha a garota, não é? Insistência é tudo (se você não percebeu a ironia dessa última frase, pare de ler o texto)!

Está ai. Você ainda está ai, não é? Se estiver, fique livre para expor suas ideias, contraditórias ou não. Se forem positivas, cheguem mais, negativas, aprendizados. Não estou a falar mal de nenhuma das duas séries. Ao contrário, sou bem fã. The One With The Embryos? Melhor de Friends. Os “cinco tapas”? Melhor drinking game já inventado. Mas você precisa entender que, a ficção, por mais que ela imite a vida real, uma vez criada, não funciona nessa mesma realidade. Personagens idealizados criam padrões. Os padrões fortalecem todos os tipos de pontos negativos que existem nas relações humanas, e isso apenas cria expectativas que nunca irão se tornar realidade. Por isso, é correto reafirmar essas questões que existem em ambas as séries, (não sei se posso chamar mais de machismo, depois disso tudo) pensar bem em como essa nova geração de exemplos ficcionais nos representam e se queremos, por final, carregar essa bandeira.

Minha mãe sempre disse:

“Quando sair, peça desculpas sobre qualquer inconveniente”.

Então…

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Dandara Aryadne
Revista Subjetiva

Crítica de cinema, escritora sem destino, trabalhando com tecnologia e artista frustrada