Foto: Gabi Maistrovicz*

“Lute como uma garota”.

É textão porque a gente têm coisa demais pra falar sobre isso.

Published in
5 min readMar 9, 2018

--

Essa frase está estampada em camisetas, em adesivos no MacBook, em legendas de fotos no Instagram, em comerciais, em posts do Facebook e por aí vai. Já até ficou batida.

Bom, ganhei uma flor nesse dia 8 de março, com chocolates que o meu pai deu para as três mulheres da casa. Diferente de muitas, que acham hipocrisia e não acham certo esse tipo de mimo nessa data, eu gostei de receber isso. O meu pai faz coisas como essa desde que eu e minha irmã éramos projetinhos de mulheres, antes dos 10 anos de idade. Ele sempre faz questão de dizer que somos “as mulheres da vida dele”, e que nos valoriza porque “nós somos fodas”, então ele sabe que realmente, lutar como uma garota é bem difícil. Vindo dele, nada de hipocrisia.

Porém, mesmo o meu pai, que tem consciência disso, não me deixa fazer certas coisas porque eu sou mulher (ou vou só com mulheres).

Subir um morro só com as amigas? Não.
Fazer trilha só com as amigas? Não.
Ir com as amigas para uma praça que é o “point” de todos os rolês noturnos? Não.
Sair sozinha de carro, para algum lugar, de noite? Preferencialmente, não.

Ele procura argumentos inexistentes para justificar o motivo do “não”, sem mencionar o fato de eu ser mulher, mas na verdade ele sabe, eu sei, e todo mundo sabe: IR SÓ EM MULHER É PERIGOSO.

Se o namorado for junto, aí pode. Se for um grupinho de amigos, pode.
As vezes eu me revolto, acho que ele está sendo machista e tento mudar as regras do jogo, mas não adianta porque depois eu percebo que na verdade, se ele deixasse, eu veria que eu teria medo de fazer isso tudo sem um homem junto.

A realidade é triste. Se a gente abre a boca pra falar sobre isso em qualquer dia que não seja o 8 de março, nós somos “feministas mimizentas vindo com frescura de novo”. Mas nós realmente precisamos falar sobre isso, de novo, de novo e de novo, até que em algum momento a coisa mude.

Isso é difícil, mas eu acredito que não seja impossível, afinal é por conta desse “mimimi” todo que a publicidade tem tomado outro rumo, por exemplo. A Skol que o diga!

É normal você ir pra balada, dizer NÃO e o cara continuar em cima de você. A menos que você diga que tem namorado e mostre uma aliança, assim talvez ele pare de duvidar da existência de um homem na sua vida, que é claro, seria a ÚNICA justificativa plausível para você não querer ficar com um cara como ele.

Na verdade, ainda tem piores. Existem os caras que mesmo assim, dizem que é estranho que o seu namorado não esteja junto com você, e que então não teria problema nenhum em dar “apenas um beijo”.

É normal você ter “amigos” homens, que quando você não aceita ficar com eles, saem dizendo que você está estragando a amizade.

É normal você estar andando na rua, independente da roupa, levar incontáveis buzinadas mesmo em trajetos curtos, assovios e cantadas nojentas, e ainda ouvir: “só ignore, não responda porque pode dar merda”. O pior de tudo: a gente concorda, porque realmente pode ser perigoso.

É normal você ser assediada no meio profissional. SIM, NO MEIO PROFISSIONAL! Eu, com menos de 2 anos de mercado de trabalho em publicidade, já passei por isso. Um nome influente da área no Brasil, conhecidíssimo por ter um cargo fodão em agências grandes de Curitiba e São Paulo, já falou uns absurdos pra mim, de madrugada, pelo Facebook. No início, me deu esperanças como se eu estivesse prestes a conseguir uma vaga de uma agência desejada em outra cidade, depois eu vi que nada mais era do que uma forma “sutil” de assédio. O que eu fiz? O que me aconselharam: nada. Afinal, é uma pessoa influente, renomada, que poderia facilmente me queimar logo no início da minha carreira.

É normal falarem que sua roupa está curta demais, e perguntarem se os seus pais ou seu namorado vão realmente te deixar sair desse jeito.

É normal ter gente passando a mão na sua bunda, te “encoxando”, olhando fixamente para o seu decote, puxando a sua mão ou o seu cabelo, quase entortando o pescoço pra secar a sua bunda quando você passa, te agarrando a força.

Infelizmente, é tudo muito normal, mas não é certo, nem aceitável.

As vezes, eu me sinto covarde. Covarde por não fazer nada nessas situações, por abaixar a cabeça, por ter medo, por não mandar esses homens a merda.

As vezes, em ataques repentinos de coragem/raiva, eu retruco.
Mas nisso, já me chamaram de piranha quando eu disse não.
Já gritaram comigo porque eu estava de shorts (em pleno verão) e esse tipo de comportamento era inaceitável.
me encurralaram na parede e disseram: “não gostei do seu batom, vou tirar”. Já deram de dedo em mim quando eu disse pra sair de perto.
Já falaram que a minha cólica é cu doce, que era melhor eu calar a boca, que eu era louca e por aí vai.

Ou seja, LUTAR COMO UMA GAROTA, realmente é foda, mas nós não podemos deixar nunca isso ficar um assunto batido. Você tem que lutar mesmo se sentindo vulnerável. Mesmo que todos aconselhem que não. Mesmo que digam que é mimimi. Mesmo enquanto te julguem. Mesmo enquanto ignoram o que você diz e só olham para os seus peitos. Mesmo que com cuidado.

Então, garotas, vamos lutar como garotas. Resistentes e acostumadas a lutar, mesmo que aos pouquinhos.

*ERRATA: Anteriormente, os créditos colocados pela autora foram para o site “peita.me”, porém a foto é da fotógrafa Gabi Maistrovicz, pedimos desculpas a mesma e já fizemos a devida alteração.

Este texto faz parte do nosso Especial: 8 de março.

Gostou? Clique nos aplausos — eles vão de 1 a 50 — e deixe o seu comentário!❤

Nos siga no Facebook, Instagram e Twitter.

Saiba como publicar seus textos conosco clicando aqui.

Leia a nossa revista digital clicando aqui.❤

Participe do nosso grupo oficial, compartilhe seus textos e adicione os amigos!

--

--

Vitória Castilho Cohene
Revista Subjetiva

Tinha tantas certezas, mas agora só tem a de que escrever alivia.