método de desapaixonamento (teste)

carolina
Revista Subjetiva
Published in
4 min readAug 1, 2020
windswildkid | ilustração

eu estou me vigiando para não escrever uma linha sequer pra tu, ou sobre tu. não é que tu não mereça, não me entenda mal.

comecei este texto sem saber sobre quem eu estava falando… preciso tomar essa decisão agora e continuá-lo sob a imagem de alguém específico?

ontem foi dia das namoradas aqui no além-mar. tu não quis me encontrar, inventou qualquer desculpa sobre já estar de pijama assistindo série. certíssimo. devo confessar que só te convidei porque estava bêbada e menstruada.

mesmo não sendo a mesma data da nossa, me lembrei do último dia das namoradas, passei contigo. foi uma delícia. não consigo me lembrar outro com qualquer pessoa do mundo que tenha sido tão bom. a única carta, foto e cartão que eu trouxe comigo do brasil foram as que tu me deste naquele dia. me lembro do gosto daquele jantar com entrada, prato principal e sobremesa que comemos ouvindo discos de vinil no poço da panela como me lembro do teu cheiro e do gosto da tua boca. parece tanto que foi ontem quanto parece ter sido em outra vida, de tão longe. a sensação de tempo sempre me deixa perdida quando te penso, te falo ou te sinto. é como se o tempo ter passado não fizesse o menor sentido. eu queria ter guardado toda a minha dor num segundo, prendido ela lá, sofrido tudo que sofri nesses meses, crescido tudo o que cresci, vivido tudo o que vivi, colado todos os cacos que já consegui colar, e aí eu não teria te deixado sem me despedir. deve ter sido doloroso pra tu, eu até posso imaginar, porque sei o quanto foi pra mim. eu passei todo esse tempo sem te escrever. na verdade, devo ter te escrito 10 linhas no máximo.

para mim escrever alguém é me apaixonar, é transbordar a pessoa em palavras (de contrário me afogo). escrever alguém também é não me desapaixonar. paro de escrever e me desapaixono. queria que fosse fácil assim contigo. mas aqui estou eu, sem poder ouvir a palavra carnaval sem me vir uma enxurrada de sentimentos e lágrimas relacionadas a tu.

eu entendo que a gente esteja se protegendo, que e a gente esteja deixando essa relação o mais leve e casual possível, gosto disso. não tenho espaço e nem competência emocional para gerir qualquer tipo de relação diferente nesse momento da minha vida. eu sei e tu sabe, que tu também não. nossas últimas relações foram traumáticas, mas as de quem não foram? ainda estou tentando entender o porquê da gente deixar nossas relações chegarem até o limite, porque nós ficamos insistindo até a última gota de amor e paciência? quando escrevo “nós” estou falando dessa espécie ser humano. é medo de perder?

nos últimos dois anos, desde que te conheci, todos os meus cadernos, diários, pastas “meus documentos” no computador e no google drive tem coisas escritas para você. por muito tempo foi meu único jeito de ter contato contigo, mesmo que fosse com uma tu imaginada, completamente inventada da minha cabeça, que jamais leria aqueles textos — ou só leria meses depois. por isso ando preferindo não te escrever. mas escrevo. te juro e depois me prometo que essas vão ser as últimas linhas endereçadas a você.

eu gosto da nossa relação de amigos que transam. me sinto à vontade em nunca te escrever nada, nenhum verso sequer. espero que funcione essa minha tática de não te escrever. estou tratando como um experimento, não te escrevo e se eu não me apaixonar, criou-se um método de não-apaixonamento. posso patentear e escrever livros de autoajuda com isso: “como não se apaixonar em 10 passos.” e listar coisas como:

1- em nenhuma hipótese escreva poesias para a pessoa. se você for do tipo que desenha, não desenhe para a pessoa, ou a pessoa em si, qualquer coisa que seja, somente não desenhe, nem escreva.

2- fique com outras pessoas, mesmo que você queira só ficar com aquela pessoa, fique com outras também.

acabei de comer uma tangerina enfiando ela inteira na boca. nunca tinha feito isso. eu tenho minhas regras pra comer frutas. como bago por bago, independente do tamanho da tangerina. te vi engolindo uma inteira e resolvi testar essa rebeldia. é uma delícia, bem refrescante, só acaba mais rápido. às vezes essa é a intenção, né? meter pra dentro rápido, mastigar tudo sentindo uma explosão de sabores ao mesmo tempo e engolir duma vez só. é isso que tu faz com as pessoas também?

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