Mano

Rafael Moreno
Revista Subjetiva
Published in
3 min readJun 2, 2020

Mano era um cara da hora. Ponta firme. Boa praça. Não tinha como não gostar do Mano. Quinze minutos de conversa e você já tá pensando em envolver o Mano em seus rolês.

Vocês trocam ideia e as ideias batem. Mesmo que não bata, o debate que rola te faz sair melhor do que entrou. Ou mudou de ideia, ou fez ele mudar ou os dois chegaram num consenso. Não importa. O fato é que não tem como não gostar do Mano.

Outra coisa. Não tem como não reconhecer o Mano. Visual chavoso, óculos espelhado, aquela bermuda até a metade da canela, sua camiseta duas vezes maior que o corpo. E a bombeta. Se tem uma coisa que você não verá é o Mano sem a sua bombeta. Tem várias marcas. NY. Bulls. Celtics. Lakers. Nunca jogou basquete na vida, duvido muito que tenha assistido a alguma partida, mas aquela é a sua marca registrada.

Você aprende rápido onde pode encontrar o Mano. De segunda a sábado, faz um peão de motorista numa transportadora. Nas noites de sábado, tá sempre colando num rap ou funk lá da vila. Aos domingos, é aquele futebol sagrado na várzea. Quando não, tá ensinando algum moleque a desbicar uma pipa. Não é pra usar cerol, mas também não vou deixar que as molecadinhas tenham seus pipas mandados.

Agora te falo, se um dia você ver o Mano cabisbaixo, vou achar que você tá mentindo. Por aqui chamam ele de “seu Sorriso” ou quando sacaneiam, “vossa Risada”. O cara tá mais entusiasmado do que nunca. Cantinho novo com a mulher e uma menina a caminho. Menina mano! Dá pra acreditar? Ele falava todo empolgado, já separando o enxoval de quem ainda estava por vir.

Dias desses você encontra ele nas feiras de quarta, quinta e sábado. Não tem erro. Duas barracas a frente, logo depois do bar do Zé, ele te jura que faz o melhor pastel do mundo por cinco reais. Agora que a filha vem, a gente tem que dar um talento a mais nas contas.

Certo dia, alguma coisa deu errado.

Sei lá por que, mas ele havia sumido hoje. Zarpado. Mas a gente tá ligado que o Mano não era desses, nem de longe. O cara tava escrevendo uns funks. O Kondzilla vai querer me produzir, mané. E fica lá no caderninho rabiscando.

A gente soube que tava tendo geral lá na entrada da vila e pegou todo mundo de surpresa. Quer dizer, a gente se fala, manda uns salve pelo whats, só pra se precaver, tá ligado? É perigoso e outra, você sabe, sempre sobra pra gente.

Daí ele vem com aquele sorriso no rosto, pedindo desculpas e aliviando a gente. Ficou um pouco mais tarde pra ganhar aquele faz me rir extra e disse que a bateria do seu celular acabou e seu carregador tava em casa.

Caraio Mano, que susto.

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