Toda Poesia por Paulo Leminski.

Meu livro favorito

Carolina Infanger
Revista Subjetiva

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Sabe, um dia uma pessoa me deu um livro. Despretensiosamente, estávamos em uma loja de livros pequenininha e quando eu o segurei pela primeira vez meu rosto se iluminou. Ao chegar no caixa ele foi pego de mim e a pessoa ao meu lado disse que pagaria por ele, como um presente.

Foi um presente numa tarde de domingo chuvoso, seguido de um café e profiteroles. Enquanto a companhia devorava um livro teórico de cálculo, eu lia poesia.

Nós tínhamos o hábito de escrever dedicatórias quando nos presenteávamos com livros e dessa vez não foi diferente, na capa havia uma pequena declaração de amor que seguiu com ele algumas vezes.

A dedicatória hoje tem tinta branca por cima, era doloroso demais ler sobre ser o amor da vida de alguém agora separados.

Então, em mais um domingo eu lia o favorito apoiada no metrô vazio, bem ao lado da porta. Infelizmente eu tenho esse péssimo hábito mas ele só existe porque não sou alta o bastante para ficar no corredor e alcançar a barra superior do metrô pra não cair.

Dessa vez meu coração se recuperava da partida, foi quando um estranho se colocou à minha frente. Eu já tinha reparado nele enquanto ele comprava um bilhete na mesma estação que eu, pois bem… agora estava no mesmo vagão.

Estávamos usando roupas pretas, meu humor estava difícil naquele dia. Foi quando algo neon saiu de dentro de uma mochila e… ele tinha o mesmo livro. Talvez uma das piores coisas em mim seja a introversão.

Depois de algum tempo, ele me disse “bom gosto para livros” e desceu na República. Parte de mim dizia que eu deveria ter ido atrás do homem loiro mas se eu fosse, bem… não seria eu. Ele chegou a olhar pra trás, talvez ele também esperasse que eu não fosse eu.

O meu grande amor laranja já tem quatro anos e eu ainda sou totalmente apaixonada por ele, já escrevi um outro texto sobre ele inclusive. Tem marcas por todo canto, uma vez eu estava bêbada e queria limpar meu batom vermelho e, ele estava bem ali na minha bolsa.

Já me arrumei na pressa para uma festa e quando foram me revistar me perguntavam por que eu levava um livro pra uma balada. E eu lá sabia que ele estava ali?

Me desculpe caso você não goste de livros marcados mas acontece que eles possuem uma história, sabe? Nesse tem pétalas de flores secas, algumas partes grifadas, orelhas, batom vermelho, uma dedicatória que eu tentei apagar e até mesmo tentativas de poesia. Ele já viajou por muitos lugares, já o li em bancos de praça e em sarjetas…

Eu o alcanço na prateleira quando sinto que meus sentimentos precisam ser lidos ao invés de escritos ou sentidos. Foi meu companheiro em várias paixonites que vieram nesses anos mas quando eu quero lembrar de amor eu coloco a capa contra a luz e espio por baixo da tinta branca a história de um casal que eu conheci um dia.

E, por muitos anos segui pensando que o amor vinha de outras pessoas mas como é que vinha amor de um livro se era só um objeto? Como eu sentia amor se o autor estava morto e o livro era um laranja cegante que eu sinceramente achava cafona?

Como é que amamos algo que não existe?

E o que é que continua comigo em quatro anos de amor e livro laranja? Eu continuo comigo. Não é um homem loiro e nem um moreno, não é uma dedicatória de amor apagada com errorex (corretivo, branquinho, vai saber?)… Quem ama o livro sou eu, quem amou ganhá-lo fui eu e quem quis correr atrás de uma pessoa desconhecida no metrô também fui eu, era eu comigo lendo ele, a minha história se identificando em letrinhas miúdas, polonaises.

Eu que limpo meu batom em folhas de livro, que o abraço quando sinto que preciso deixar as coisas saírem de mim e eu que o levo pra balada por descuido.

E, dentro daquele livro eu sinto que cada uma das poesias são todas pra mim.

O amor nunca veio de algo externo, o amor sempre esteve ali. Quando eu amei um estranho, quando eu amei um velho amigo, quando eu amei uma boca limpa, quando eu amei.

E, no meio das páginas borradas, eu lia uma coisa só: eu.

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Carolina Infanger
Revista Subjetiva

Escrevo tudo que me transborda, ensinando tudo que um dia eu descobri; Futura Psicóloga | ig: @bluehowlita