“Não adianta nos fecharmos em bolhas ideológicas. É hora de abrir, ouvir, conversar e se armar com conhecimento”

Revista Subjetiva
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6 min readMay 10, 2018

O Vozes da Subjetiva é um projeto que visa valorizar os colunistas da Revista Subjetiva, fazendo com que nossos leitores os conheçam mais a fundo. O roteiro respondido pelo/a autor/a busca explorar suas experiências pessoais, profissionais e suas opiniões sobre determinados assuntos.

Carolina Bataier (Carol Btr) é graduada em Jornalismo, mestranda em Mídia e Tecnologia pela Unesp/Bauru, atuou em jornais impressos, TV e produz conteúdo para a internet. Atualmente está trabalhando no seu primeiro livro, O pôr do sol dos astronautas, que será publicado em breve pela editora Letramento.

Revista Subjetiva: Para começar, conte-nos um pouco da sua trajetória até aqui, listando quais foram às grandes influências de sua vida pessoal e profissional.

Carolina: Bom. Atualmente, eu trabalho como produtora de conteúdo. Sou graduada em jornalismo e aluna regular do curso de Mestrado Profissional em Mídia e Tecnologia da Unesp de Bauru, cidade onde moro. Além disso estudo teatro faz 1 ano e meio.

Comecei a estudar jornalismo em 2006 e naquela época criei um blog. Desde muito nova, sabia que queria escrever. Quando criança, eu escrevia pecinhas de teatro (cenas, na verdade) para brincar com minha prima. Depois, na pré-adolescência, rascunhava livros, contos e mantinha diários. Começou como uma diversão e acabou virando profissão.

Trabalhei em jornal impresso diário, fiz frilas pra TV e portais e atualmente trabalho produzindo conteúdo para internet. Além disso, mantenho o Interior Cultural, que é um blog de arte e cultural focado nos eventos do interior de São Paulo. Integro também a equipe do Conntinuum, podcast de contos. Esses são os dois projetos com os quais ando envolvida atualmente. São coisas que não me trazem retorno financeiro algum, mas me permitem fazer coisas nas quais acredito. E além disso tenho este espaço na Subjetiva, que vem me trazendo bons frutos.

Se você pudesse falar sobre 3 livros que marcaram a sua trajetória na escrita, quais seriam?

Não sei se consigo falar de três. Risos. Um que foi muito importante eu não sei o nome! Deixa eu explicar: quando eu era criança, morava numa cidade muito pequena, de 3 mil habitantes. Minha mãe era professora lá e, quando não tinha com quem nos deixar (eu e meu irmão) ela nos levava para a escola. Ficávamos na biblioteca. Nessa época, eu era recém alfabetizada, tinha entre 6 e 7 anos. Daí, fazia disputas comigo mesma: “hoje vou ler um livro inteiro. Agora, vou ler dois…”. Coisas assim. E um dia li um que contava a história de um leão na selva. Era um livrinho infantil, com ilustrações, mas me encantou de um jeito que eu pensei: um dia quero escrever histórias igual essa pessoa fez. Isso nunca saiu da minha cabeça! Eu sei que era uma autora, mas não lembro o nome dela nem do livro.

Depois, na adolescência, veio Feliz Ano Velho, do Marcelo Rubens Paiva, porque foi o livro que me fez despertar o gosto pela leitura. E gostar de ler tem relação forte com gostar de escrever. Li quando tinha uns 14 anos e ele abriu as portas para um universo. Depois dele, fiz a carteirinha da biblioteca da minha cidade e ia lá toda semana passear entre livros.

Daí, tem outros livros que marcaram minha vida em momentos diferentes, que me apresentaram novos universos e possibilidades. As Meninas, da Lygia Fagundes Telles, Cem ano de solidão, do Gabriel García Marquez, Manuelzão e Miguilim, de Guimarães Rosa… Tem muita coisa que não necessariamente marca minha trajetória na escrita, mas me causa espanto e encantamento. E isso influencia em tudo que a gente faz, né?

Sobre o curso de comunicação social que você se graduou, o que lhe levou ao jornalismo e quais seriam os grandes desafios da profissão hoje?

Jornalismo foi minha segunda opção. Eu queria mesmo cursar artes cênicas, mas meu pai não me apoiava muito nessa ideia. Eu era muito nova, talvez depois tivesse mudado de ideia de qualquer forma. E gostei muito de estudar comunicação, é um curso que traz uma boa carga cultural. É bom pra gente se situar um pouco!

Eu fazia teatro na adolescência, era envolvida num grupo da minha cidade e depois fiz um curso livre numa escola numa cidade vizinha. Quando chegou o momento de decidir que curso prestar no vestibular, uma professora de redação, conhecendo meu gosto pelas leituras e escritas e minha aproximação com disciplinas como história e geografia, sugeriu: por que você não tenta jornalismo?

Então, acabei indo para o jornalismo, mas sempre mantive um pé nas artes.

Um dos grandes debates caros ao jornalismo hoje em dia é sobre as fake news, recentemente, inclusive, você escreveu em conjunto com o Marcos Vinicius de Almeida (também colaborador da Revista Subjetiva) sobre as falsas notícias no caso da ex-Vereadora do Rio de Janeiro, Marielle Franco, que foi brutalmente assassinada no mês de março deste ano. Para você, quais são as motivações de alguém que cria esse tipo de notícia e quais são as melhores formas para combater as tão temidas fake news?

Eu acredito que, para além das questões ideológicas, existe a desonestidade. Por que você tem possibilidades de rebater honestamente, com embasamento, os argumentos com os quais não concorda. É possível. Mas, vivemos num país que, por razões históricas, grande parte da população tem um afastamento da leitura. Existem outras formas de saber e aprendizado, mas, quando você tem na leitura e no noticiário a principal fonte de informação sobre a realidade, a leitura e a interpretação são peças fundamentais. Então, o sujeito que, sabendo das condições de informação da população brasileira, se utiliza do apelo das redes sociais para lançar mentiras, ele está sendo desonesto . O objetivo claro é a manipulação da opinião pública com objetivos políticos e ideológicos, mas o que leva a isso é a desonestidade.

O combate tem que ser feito, a meu ver, em diversas frentes. Com denúncias nas redes sociais, quando possível. Com punições legais, quando aplicável. E com muita pesquisa e informação. E, claro, muita conversa, muito diálogo. Não adiante nos fecharmos em bolhas ideológicas. É hora de abrir, ouvir, conversar e se armar com conhecimento para não cair nessas armadilhas e saber argumentar quando for necessário.

Além de artigos opinativos e jornalísticos, você também possui uma grande tendência a escrever crônicas, de onde você acredita que vem essa paixão por este gênero literário e quem você diria que foi sua grande inspiração para entrar neste rumo?

O primeiro livro de crônicas que li foi 100 Crônicas, de Mário Prata. Era do meu tio e eu passava tardes na casa da minha avó lendo esse livro. Alguns textos, li repetidas vezes. Achava uma delícia, essas histórias curtinhas e despretensiosas. Fui naturalmente atraída para o gênero. Depois, vieram outros. Até hoje, leio muito. Na internet, é possível encontrar muita coisa boa.

Para finalizar, gostaríamos que você deixasse alguma mensagem para novos escritores e jornalistas que estão adentrando nesse universo.

Acho que, com relação a novos escritores, não tenho muito a falar. Também sou nova nisso, estou aprendendo. Então, a mensagem para eles é também para mim: nunca deixemos de aprender. De ler, ouvir os outros, pesquisar, refletir, buscar coisas novas e observar.

E, para jornalistas, eu acho que eu peço coragem e fôlego. Muito se fala sobre o sofrimento e a precarização da profissão. Mas vejo que é nos momentos de crise que precisamos de pessoas boas, que estejam dispostas a encarar, pensar possibilidade, ousar e desafiar.

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