O cheiro do (meu) sangue nas suas mãos

ou “Aqueles prestes a morrer o saúdam”

Tiago da Silva
Revista Subjetiva
2 min readSep 24, 2018

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Já posso ver o pai matando o filho

A mãe entregando a filha para Os Campos

Denúncias, delações, buscas, apreensões, execuções

Porões

Homens de verde atirando antes de perguntar

Em mulheres e homens periféricos

Pretos

Crianças e velhos

Pretos

Homossexuais também, ateus, trans, umbandistas

Qualquer um que pense com a própria cabeça

Qualquer um que diga algo além de Sim & Amém

Os corpos despejados por caçambas em valas

Toques de recolher

Perseguição

Genocídio

Eleitos x Impuros

A mão esquerda de Deus se movendo, armada

O blackout total da mídia

Amenidades no jornal, comemorando o salto de (sub)empregos

Os cartazes de Desaparecido voando ao vento

Os novos heróis nacionais sendo criados

Livros de história sendo queimandos

E uma nova história sendo escrita

Com sangue

O meu sangue, da minha gente

Está vindo

Direto pra nós, direto pra mim

A guerra tá vindo e eu tô do meu lado

Mas o meu lado vai ser conhecido como o lado errado

Eles não me conhecem, mas já têm uma ideia muito clara sobre mim

Eu sou um desajustado porque fui criado sem pai, por mãe e vó numa periferia

Eu sou um malandro porque sou negro, eles disseram

Haverá muitos pesos e muitas medidas

E a medida para um desajustado malandro como eu será

Uma medida de chumbo

Seguida de uma medida de terra

“Aqueles prestes a morrer o saúdam”

Eu os saúdo

O meu sangue vai estar nas suas mãos?

Tomara que o cheiro não saia nunca!

Pra vocês lembrarem sempre daquele

Dia 7 de outubro

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Tiago da Silva
Revista Subjetiva

Às vezes me surpreendo com o que escrevo, porque não sabia que pensava assim.