Alice Maria de Medeiros
Revista Subjetiva
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2 min readMar 9, 2022

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O dia da mulher já passou, é verdade. Eu queria ter escrito algo bonito a respeito, mas andei bastante entretida entre o computador do trabalho e o fogão de casa, demasiadamente ocupada em revisar textos e lavar pratos, enlouquecidamente entusiasmada em perder cinco quilos e colocar crianças na tríade tomarbanho-escovardentes-e-dormir. Mas, acima de tudo, refleti sobre o que os homens dizem das mulheres no dia da mulher.

Na minha memória recente, ontem, dia 8 de março, o presidente do Brasil se emoldurava em um palanque circense, ridiculamente cor-de-rosa, para declamar que a mulher está p-r-a-t-i-c-a-m-e-n-t-e inserida na sociedade; um outro político nos reduzia ao gosto das unhas pintadas. Só posso crer que ambos se inspiraram na poesia que inaugurou a semana feminina das homenagens misóginas: “elas são fáceis porque são pobres”, verso dito pelo deputado mais garanhão do Brasil, referindo-se às mulheres ucranianas na fila de imigração.

O dia da mulher já passou, é verdade. Mas a ressaca continua. Continua porque continuamos pobres ou menos ricas. Nós ucranianas e nós brasileiras, somadas as mulheres que nos últimos 150 anos lutaram pelo direito da propriedade, da herança, de pedir emprestado e até ganhar dinheiro vindo do próprio trabalho.

Esse tal do dinheiro nunca vai nos comprar felicidade, mas certamente trará o poder de sermos vistas com o respeito de não parecermos bibelôs em uma fila miserável. Talvez os políticos, quando sentirem o cheirinho do dinheirinho quente exalando das mulheres, conseguirão nos ver e finalmente enxergar o nosso real interesse: sermos manicures, blogueiras, advogadas, escritoras, CEOs e acionistas da Risqué. Tudo isso com uma boa licença maternidade, se quisermos filhos.

Eu até tenho paciência, mas ela anda assintomática aos homens que se apropriam do dia da mulher para falarem de nós. Tratem de inventar um dia para vocês. Quando acontecer, eu praticamente mando flores.

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