O que é marca e porque a maioria dos museus fogem desse tema?

Beatriz Marassi
Caronte Design
Published in
4 min readNov 28, 2018
Sugestão de presentes da MoMa Design Store. Foto extraída do site do MoMa.

O conceito de marca vai muito além das representações gráficas tais como logo, símbolos, cores e produtos. Estes e outros elementos são manifestações de uma marca, ou práticas de branding.

Branding: termo amplamente usado nas organizações, refere-se ao conjunto de ações ligadas ao projeto da marca, ou seja todos os pontos de contato onde os públicos, ou steakholders, irão estabelecer relação com a marca. O objetivo do branding é agregar valor de mercado à marca, os chamados ativos intangíveis, portanto, é além de um conceito, uma prática administrativa contemporânea.

Nos anos 80 surge a mania do capital de marca, o brand equity, quando a Philip Morris comprou a Kraft por US$ 12, 6 bilhões — seis vezes mais do que a empresa valia no papel. A diferença de preço, aparentemente, estava no custo da palavra “Kraft”. Mas Wall Street sabia que não era apenas a palavra e sim décadas de investimento em marketing e favorecimento de marca que agregava muito mais valor a uma empresa do que seus ativos e vendas anuais totais.
Fernanda Pereira, 2010.

Foi a partir deste momento que o mundo percebeu a importância do investimento em branding e o quanto ele é capaz de dar valor a um negócio. Logo, o conceito de marca é mais amplo que o conceito de empresa.

As marcas incorporam significados às empresas.

David Aaker, professor de Marketing na Haas School of Business, California, diz que a marca revela a visão de mundo e de negócios, que inspira e orienta pessoas e empresas a criarem produtos, serviços, sistemas, procedimentos, hábitos e costumes que satisfaçam os objetivos, expectativas e necessidades de todos os envolvidos.

A segunda imagem foi extraída do Instagram da Supreme. A primeira foi uma manipulação que eu fiz para exemplificar como a marca é capaz de atribuir significado.

Para Semprini, pesquisador semioticista italiano, uma característica da marca é a sua capacidade em gerar mundos possíveis.

Um mundo possível é uma construção de sentido altamente organizado, no qual confluem elementos narrativos, fragmentos de imaginário, referências socioculturais, elementos arquétipos, e qualquer outro componente que possa contribuir para tornar este mundo significativo para destinatário.
Semprini, 2010.

Semprini afirma que por meio da publicidade foi possível perceber que “a marca era muito mais que um simples adjuvante para um produto ou serviço e que ela estava se tornando uma entidade autônoma de comunicação” e que os consumidores estavam cansados dos discursos que exaltavam vantagens dos produtos e serviços e passaram a esperar que as marcas falassem com mais profundidade e atração.

Porque os museus fogem desse tema?

Manuelina Maria Duarte Cândido, doutora em museologia pela Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, é autora da obra Orientações para Gestão e Planejamento de Museu publicada em 2014. Neste guia ela diz que os museus se distanciam dos temas de branding e marketing, temas que, segundo Manuelina, são “inescapáveis para sua sobrevivência”.

[…] tudo no museu deveria ser pensado em função do que ele pretende representar. Para ele, a marca tem a ver com a visibilidade e o prestígio do museu e impacta todas as decisões, tanto de quem vai investir, patrocinar como de quem vai visitar, em um mundo com tantas opções e tempo cada vez mais limitado. Esses propósitos externos da marca associam-se aos propósitos internos como uma ferramenta gerencial nas tomadas de decisão sobre o que fazer ou não em determinadas situações.
Cândido, 2014.

Para Robert Jones a explicação é que “os conceitos de “museu” e “marca” não se relacionam de forma evidente. As pessoas tendem a associar “museu” com integridade institucional, e “marca” com exploração comercial. Ele declara em 2012:

A marca, em sentido estrito, não é apenas o nome, a logo, o design gráfico e nem mesmo apenas o marketing. É o que uma organização representa, por meio de tudo o que faz. A marca de um museu deveria, portanto, ser trabalhada cuidadosamente em seu programa. Exposições, eventos, mostras da coleção: tudo deveria ser inspirado pela ideia específica que o museu pretende representar.

Instalação “What It’s Like, What It Is #3.” de Adrian Piper no MoMa.
© Adrian Piper Research Archive Foundation Berlin. Photo: Carly Gaebe.

Há excessões.

Algumas instituições se tornaram exemplos de gestão de marca. Conseguem engajar o público com suas ações e são verdadeiros objetos de desejo. Construíram uma identidade marcante através do discurso, do acervo, e outras pelas suas instalações. Na pesquisa de Jones, realizada com os representantes do Communicating The Museum de 2008, foi identificado que os museus mais admiráveis são o Tate, o MoMA, o Museu Victoria & Albert, o Louvre e Guggenheim:

Alguns museus claramente se tornaram “marcas”: passaram a habitar o imaginário do público. Isso é ainda mais evidente nas grandes instituições, com suas construções icônicas, como o Tate e o Guggenheim. Nossa pesquisa confirmou isso. Os representantes do Communicating The Museum de 2008 citaram, sobretudo, cinco marcas de museus que admiravam: Tate (55 menções), MoMA (o Museu de Arte Moderna, Nova York, 19 menções), V&A (o Museu Victoria & Albert, Londres, 17 menções), Louvre (12) e Guggenheim (9). O Tate foi o mais citado em todas as partes do mundo, mesmo pelos representantes dos Estados Unidos.
Robert Jones, 2012.

Livros essenciais:

  1. A Marca Pos-moderna.
    Andréa Semprini, 2006.
  2. No Logo.
    Naomi Klein, 1999.

--

--