O que aconteceu em Filadélfia?
Um Maluco no Pedaço é uma daquelas séries que mal da tempo de piscar e você se encontra preso a ela. Seja pela dublagem que, cá entre nós, me recuso a escutar a voz verdadeira do Will Smith, seja pela abertura do seriado, com aquelas batidas que precedem o rap cantado pelo Prince de Bel-Air.
E é sobre o rap e a sua abertura que vamos trocar uma ideia, afinal de contas, uma das genialidades dessa série foi usar a abertura como introdução da história.
Não precisamos de um episódio piloto para mostrar o protagonista e todas as suas motivações. Tudo isso é sacado e cantado na abertura da série.
Com isso, só temos uma pergunta a fazer.
O que aconteceu em Filadélfia?
A gente começa com Will Smith em seu trono, auto-proclamado príncipe e disposto a contar como se tornou o tal.
“ Esta é a história sobre como minha vida virou de cabeça para baixo e eu gostaria de um minuto. Então senta aí
que te conto como me tornei o príncipe de uma cidade chamada Bel-Air.”
O cara venceu e quer contar como foi sua caminhada até a vitória. Toda conquista carrega um pouco da jornada do herói. Então porque seria diferente, não é mesmo?
Nascido e criado no oeste da Filadélfia, como todos os moleques, Will tirava uma onda nos grafites (só agora percebi que o F que ele tá tingindo é de Fresh Prince) e naquele basquete de todo santo dia.
Até que uns caras da pesada chegaram no bairro e a violência, que já era grande, aumentou cada vez mais.
Após se envolver numa briga durante uma partida de basquete com esses caras, sua mãe não pensou duas vezes em mandá-lo para bem longe dali. O destino? A casa da sua irmã, a tia Vivian.
Daí o choque de realidade.
Will se muda por conta da onda de violência em seu bairro.
Pesado, né?
Mesmo implorando para ficar em Filadélfia, sua mãe, já com as passagens e malas prontas, o manda para o aeroporto.
Um exemplo de como era o dia a dia em Filadélfia acontece no quinto episódio da primeira temporada.
Will, agora em Bel-Air, recebe a visita de seu amigo de Filadélfia, Tray. Num dos diálogos com a tia Vivian, podemos entender um pouco sobre seu amigo Tray e sobre si mesmo:
Will: Quando eu estava na sétima série, sempre que levava livros para a casa, os caras me atacavam, então o Tray começou a me levar em casa. Se não fosse ele com seus socos e me ajudando a pular cercas, talvez eu não estivesse aqui.
Tia Vivian: Enquanto ele protegia seus livros, onde estavam os livros dele?
Will: O que isso tem a ver?
Tia Vivian: Will, que bom que ele se importava tanto com você. Mas porque ele não se importa consigo mesmo?
Will: Ele não tinha ninguém. Se ele não estivesse lá para me ajudar, talvez eu também não me importasse comigo.
Tia Vivian: E isso teria sido um grande desperdício.
Num misto de estranheza, incredulidade e, porque não, curtição com toda a classe e pompa na cabine ao qual sua passagem foi comprada, ele se pergunta o que era tudo aquilo.
Era a vida do Will virando de cabeça para baixo. Aquilo poderia ser tudo, menos ele.
Assim que desembarca, ele vê um daqueles chofer com uma plaquinha com seu nome e o confunde com um policial. Vacinado e malandro, dá um perdido e busca um táxi. Sim, é por isso que temos um táxi nessa abertura.
Impressionado com aquela mansão (quem não estaria?), esfregava as mãos se preparando para se tornar o príncipe daquele lugar.
Assim que a abertura acaba, o resto é história.
Will, o Prince de Bel-Air
Um dos méritos de Um Maluco no Pedaço foi o trato e a maneira de expôr assuntos tão delicados e importantes a serem debatidos. Violência, racismo, drogas, preconceito, identidade.
Se ainda têm dúvidas, é por isso que a comédia, a arte e seus artistas se fazem tão importantes e necessários nos dias de hoje.
Não à toa, o próprio Will Smith anunciou que fará um remake da série, numa pegada mais dramática, inspirado no curta do Morgan Cooper que, de maneira brilhante, nos trouxe todo seu olhar cirúrgico sobre a série.
Mas, só chegamos até aqui porque se fez essencial entender o que aconteceu em Filadélfia, seu o ponto de partida.
No final das contas, Will não se tornou o Prince de Bel-Air à toa.