O tamanho do seu quintal

Juliana Barreto Tavares
Revista Subjetiva
Published in
3 min readOct 1, 2017
São Paulo / Reprodução

São Paulo é um grande feudo, a gente só não sabe. É 2017 e ainda escuto preconceito velados (ou não) sobre um nordeste provinciano e coronelista, enquanto sou obrigada a ver uma megalópole de 20 milhões de habitantes que está organizada em mini clubes de amigos do rei.

Um dia me ensinaram a acreditar nos meus sonhos, a trabalhar duro, dormir pouco, fé na vida, em deus, nos astros. Engoli o choro e segui. Eu acreditei, tomei café até aprender a gostar, pó de guaraná até começar a ter insônia, comi chocolate até aumentar o número da calça.

Sonho e escrevo em letras grandes, sempre. Sonhei e conquistei, muito. Mesmo com o meu pessimismo irremediável, com a minha ansiedade e megalomania, reconheço que já fui longe. Conquistei outros idiomas, países, livros, diplomas, pessoas. Cheguei em lugares que mal sabia onde ficavam e cheguei bem, sem passar vergonha, sem fazer feio. Não houve lugar que não tenha feito amigos, conquistado admiradores (quem sabe até inimigos).
Eu não tenho vocação para letrista de funk (infelizmente tampouco para dançarina) e não quero falar de recalque ou de como causar inveja nas inimigas por aí.

Sou privilegiada em níveis que mal consigo mensurar. Com apoio incondicional da minha família, educação de altíssimo nível com professores que me desafiavam, não tenho doenças crônicas, compro roupa em qualquer loja, estou minimamente nos padrões de beleza e até meu cabelo que me atormentava está na moda agora.Não tenho nenhuma deficiência intelectual, aprendo qualquer coisa com um pouco de dedicação (que tenho muita) e foco (nem tanto). Que existem lacunas não nego, momentos de pausa ou retrocesso em uma caminhada de privilégio. Começa com tons mais quentes de cor de pele e vai até o sotaque que você se desconstrói pra achar O.K, mas não é fofo, nem engraçado (é só uma pessoa falando, supere).

É difícil falar pra mim de barreiras sociais porque entro pela porta da frente em todos os lugares, com um pertencimento ao esnobismo que não sei se tirei de Anna Kariênina ou de Gossip Girl. Mas há sempre barreiras, tangíveis ou não, que vão se acumulando na trajetória de uma pessoa. Já falaram pra eu mudar minha “vibe”, que as pessoas fazem escolhas pela energia que você transmite. Minha vibe é ótima, atraio pessoas maravilhosas nos lugares mais improváveis e sempre fui super acolhida e bem recebida em um lugar que todos dizem ser duro. Acontece que não há meditação ou reza que me faça nascer de novo.

Não tenho a pachorra de me vitimizar, teria que ser muito hipócrita e ingrata pra isso, mas me dói ver que na ode à meritocracia, no lugar que é força, suor e trabalho, locomotiva do Brasil e zZzZ, ainda tenha tanto peso de onde você veio e quem você é.

Já deixei de acreditar em contos de fadas e igualdade social faz um tempo, mas ainda me assusto com aulas de história que parecem se reproduzir em adaptações mal feitas e com outras ostentações. Há mais reis e mais reinos, há menos cabresto visível de ignorância e manipulação descarada. Parafraseando a máxima, para os amigos tudo, para os inimigos o desempenho baseado em resultado.

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